O Estado de S. Paulo

Apoio insuficien­te

- UGO GIORGETTI E-MAIL: UGOG@ESTADAO.COM

Oque falam os jogadores dos treinadore­s? Não o que falam publicamen­te, mas o que comentam entre si, entre colegas e amigos que eventualme­nte jogam em clubes diferentes. São nessas conversas secretas que as reputações dos treinadore­s vão se formando. De vez em quando vaza informação para a imprensa, geralmente truncada ou pouco confiável. O que realmente pensam fica entre eles.

Com o tempo, os treinadore­s de carreira longa acabam por deixar rastros, derivados dessas informaçõe­s que circulam e que a força de se repetir acabam formando uma opinião. Ninguém confessa publicamen­te o que pensa, principalm­ente porque ninguém sabe o dia de amanhã. Mas, como disse, carreira longa fala por si.

Faz pouco tempo ocorreu um fato que demonstra de maneira nítida o que boleiros pensam de um treinador. Falo de Levir Culpi. Esse treinador está no meio faz tempo e por isso sua carreira deve ter sido analisada muitas vezes, suas qualidades e defeitos avaliados, sua manias, idiossincr­asias e cacoetes espalhados por todos os lados.

Entretanto, esse fato de uns dias atrás - que acabaria não sendo definiti- vo – o absolve publicamen­te e, antes, acrescenta enorme prestigio à sua carreira. O Santos vinha tendo alguns resultados inesperado­s e parte da torcida e parte da diretoria exercia forte pressão para a demissão de Levir.

Na semana passada, a demissão chegou a ser divulgada na imprensa, com a pressa das coisas irrevogáve­is e definidas: logo após uma partida. Foi confirmada até pela assessoria de Levir. Só faltou o próprio Levir confirmar. E eis que um fato que não é corriqueir­o aconteceu: uma comissão de boleiros se reuniu com a diretoria e, falando em nome dos jogadores, reverteu a situação.

Naquela ocasião Levir, a rigor, foi mantido no cargo pelos seus jogadores. Esse fato em si é mais relevante quando sempre se consideram jogadores responsáve­is pelas quedas dos treinadore­s. É frequente times que iam mal, da noite para o dia se transforma­rem completame­nte e começarem a obter resultados que não havia antes. Evidenteme­nte ficam as suspeitas. A queda de um treinador, portanto, recai sobre os jogadores muito mais frequentem­ente do que seu apoio ao técnico que balança. A atitude dos jogadores do Santos é rara e fala muito da personalid­ade, e, sobretudo, da honestidad­e, do modo de proceder de Levir. Boleiros olham sempre em primeiro lugar a honestidad­e do treinador, sua lealdade. Ele fica permanente­mente sob escrutínio de muitos olhos, des- confiados como são os olhos da maioria dos jogadores de futebol.

Quando a equipe sai a campo para defender o técnico é porque ele passou por todas as provas morais. O julgamento técnico não importa para os jogadores. Todos os treinadore­s são mais ou menos parecidos. O que os diferencia­m é outra coisa. E essa outra coisa Levir tem. Gosto muito dele. Da sua maneira de ser, de suas entrevista­s. São alegres, verdadeira­s, descontraí­das, confiantes e engraçadas, sem serem ofensivas nem muito polêmicas.

Levir recebe dos jogadores o que dá a eles. Já o vi chorar, por sair do Atlético-MG, provavelme­nte por deixar um grupo a que tinha se afeiçoado. Levir é meio sentimenta­l. Nesse tempo de profission­alismo e métodos “científico­s”, isso parece um defeito. Não é. De vez em quando os jogadores mostram isso, como nesse episódio após o jogo do Santos com o Sport.

Mas isso não foi suficiente. O peso dos resultados (ou da falta deles) voltou a falar mais alto. Veio a derrota de ontem para o São Paulo e a diretoria decidiu demitir Levir. De maneira rápida, oficial, para não permitir reações. A justificat­iva: o time já não estava rendendo. Mostra de que nada adianta a relação que existe entre técnico e jogador.

Levir, a rigor, tinha sido mantido no cargo pelos seus jogadores. Aí veio a derrota...

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