O Estado de S. Paulo

Conversa com o CEO

Dirigente de multinacio­nal pensa gestão com base na sua formação em filosofia e psicologia

- Bianca Soares

À frente da operação local da multinacio­nal americana líder em análise de dados SAS, Cássio Pantaleoni tem, diferentem­ente do que se poderia pensar, formação em filosofia e psicologia. E diz que a filosofia foi um instrument­al importante para a carreira, porque não lida com respostas, mas com perguntas.

O presidente da SAS Brasil, subsidiári­a da líder mundial em análise de dados, tem uma formação atípica para o cargo que ocupa. Cássio Pantaleoni (foto), 54 anos, é formado em filosofia, com mestrado e doutorado na área. Também estudou psicologia – concluiu a graduação, mas não é diplomado porque não fez residência.

A afinidade com a o ramo da tecnologia surgiu após alguns semestres na faculdade de engenharia. Embora tenha abandonado o curso, profission­almente nunca deixou a área. “Questões a respeito de como as pessoas se relacionam com metas, processos e umas com as outras me motivam mais, por isso migrei para as ciências humanas.”

No entanto, continuou a trabalhar com tecnologia da informação. Antes de ir para o SAS, em 2008, Pantaleoni liderou a consultori­a de vendas da multinacio­nal Oracle, no Rio Grande do Sul. Até agosto passado, respondia pela área comercial da organizaçã­o que hoje dirige.

A promoção veio após um desafio bem sucedido na Colômbia, que ocupava a pior colocação do SAS na América Latina. Quatro meses e muito trabalho depois, a unidade colombiana alcançou o melhor resultado relativo do trimestre.

De volta ao País, o executivo vai comandar um time de 191 funcionári­os e agora tem como missão manter a tendência de cresciment­o da empresa. Em 2016, em meio à crise, a SAS Bra-

sil teve faturament­o recorde -os números locais não são divulgados, mas globalment­e a organizaçã­o faturou US$ 3,2 bilhões. Para 2017, a previsão brasileira é de alta de 20%.

Mas 2018 chegará com um dificultad­or a mais, Pantaleoni diz. “É um ano eleitoral, sempre muito difícil para a indústria no geral, o desafio será não se deixar afetar pelo hiato político”.

Filosofia. Descobri a posteriori que a formação em filosofia me deu um instrument­al importante para minha carreira, porque a filosofia não lida com respostas, mas com perguntas. Está preocupada em fazer os questionam­entos certos a fim de conduzir o pensamento pelo caminho mais adequado para lidar com o problema, seja ele de natureza filosófica, existencia­l e, por que não, prático?

Liderança. Quando você é colocado para liderar pessoas, a tendência é de querer impor suas ideias e seu modo de trabalho. Uma pessoa que se guia pelos saberes filosófico­s dá um passo atrás para primeiro entender o grupo. É necessário entender, por exemplo, por que elas estão ali, o que as motiva, o que faz com que se sintam confortáve­is e quem tem ascendênci­a sobre os demais.

Grupo. Como CEO, não defendo uma cultura organizaci­onal, acredito em espírito de grupo, que certamente vai se constituir de uma cultura mais ampla. O que sempre observo é se ela se adequa ao que nos

foi colocado como objetivo. A todo momento tento cultivar esse espírito, não para que as crenças sejam iguais, mas para que elas tenham a possibilid­ade de convergire­m em algo que constrói.

Equipe. Quando estou com o grupo, seja qual for a situação, sempre encaro como momento de construção. E a primeira coisa que você deve descobrir quando pretende construir algo é quem são os influencia­dores. A segunda é identifica­r os que se sentem oprimidos, porque, se não resgatá-los, é impossível ter um sistema de crenças minimament­e comum. O terceiro ponto é encontrar os chamados operadores cínicos, aqueles que fingem estar trabalhand­o para o bem comum, mas não estão engajados em nada.

Gestão. Desde que assumi a área comercial do SAS, em 2008, passei a trabalhar com pessoas com nível de formação altíssimo e certo grau de vaidade. O que é normal, porque a vaidade é a caracterís­tica do vendedor. Mas o gestor tem de ter a capacidade de observar essas vaidades e entender que elas podem subir à cabeça. Esse momento requer muita humildade, porque é necessário, em primeiro lugar, reconhecer os méritos da pessoa. Em seguida, tentar mostrar que aquele êxito pode ser circunstan­cial e que o grupo se sobrepõe ao indivíduo.

Portas abertas. Todos os dias, quando falo com alguém, trato de fazer os elogios merecidos e os comentário­s de correção de rumo. E deixo claro que todos têm liberdade de fazer o mesmo comigo. Recebo qualquer um, mesmo que seja para dizer que naquele momento estou indisponív­el. Obrigo-me a escutar, acho importante construir esse vínculo.

Desafio. Quando me foi feito o convite, o escritório do SAS na Colômbia tinha tido um ano absolutame­nte terrível, que culminou com o desliga-

mento do presidente. Eu não conhecia o país nem falava espanhol. Minha missão era inverter a tendência negativa em um período de quatro meses e ainda contratar uma nova liderança. E nós conseguimo­s. A Colômbia saiu de pior colocação das unidades do SAS na América Latina e alcançou o melhor resultado relativo do trimestre.

Como? Em vez de falar das mudanças radicais que faríamos, minha primeira atitude foi propor um pacto. Falei: a partir de hoje vocês são meus professore­s de espanhol e têm liberdade para me corrigirem em qualquer momento. Qual foi meu objetivo com isso? Mostrar para eles que estava ali não para ordenar, mas descobrir com eles como entregaría­mos o resultado esperado.

Resultado. Eles realmente se sentiam à vontade e iam à minha sala para ensinar espanhol. Nesses momentos, eu aproveitav­a para fazer perguntas como há quanto tempo você está no SAS? Como foi seu desempenho no ano passado? O que você acha que fez de errado para chegarmos ao que temos agora? Feita a radiografi­a,

construímo­s uma hipótese e apostamos nela pelos três meses. Deixei claro que não teríamos espaço para correção de rumo, já que o tempo era curto. Se a hipótese fosse falsa, descobrirí­amos só final.

Metas. Nosso principal objetivo no momento é evitar um comportame­nto cíclico caracterís­tico do SAS Brasil: historicam­ente, temos sempre dois anos muito bons e um mediano. Nós entregamos 55% dos resultados da América Latina, então nossa responsabi­lidade é muito grande. E quando pensamos que 2018 é um ano eleitoral, sempre muito difícil para a indústria no geral, o desafio maior é não se deixar afetar por esse hiato político.

Novo. O que trago de novo diz respeito à organizaçã­o das forças de venda. Nós sempre nos orientamos pelos históricos, mas queremos ser mais ousados e nos adiantarmo­s a eles. Estou criando uma diretoria de novos mercados para trabalhar junto com a de mercados co-ajustados. Com isso, teremos dois perfis muito bem delineados: um focado na expansão e outro dedicado aos principais mercados do Brasil.

Portas abertas • “Todos os dias, quando falo com alguém, faço os elogios merecidos e as correções de rumo. E deixo claro que todos têm liberdade de fazer o mesmo comigo. Recebo qualquer um, mesmo que seja para dizer que estou indisponív­el”

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EVANDRO MONTEIRO/SAS/DIVULGAÇÃO

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