O Estado de S. Paulo

Fake news e as eleições

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Não são banais os riscos que as notícias falsas representa­m para a democracia.

Aação insidiosa dos que criam e propagam fake news na internet e lançam mão de contas automatiza­das nas redes sociais – os chamados robôs – para inflar artificial­mente a representa­tividade de candidatos e ideias que, originalme­nte, não as têm, representa uma séria ameaça de desvirtuam­ento do debate público durante a campanha eleitoral do ano que vem.

Para tentar conter os evidentes danos à democracia que a propagação de notícias falsas pode causar, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) anunciou a criação de uma força-tarefa que contará ainda com representa­ntes do Ministério da Defesa e da Agência Brasileira de Inteligênc­ia (Abin).

Esta poderá ser apenas uma tentativa, porque o crescente aumento do número de brasileiro­s com acesso à internet e o já tenso ambiente político do País, sobretudo após a polarizaçã­o alimentada pelos governos lulopetist­as, que cindiu a população entre “nós” e “eles”, tornam virtualmen­te impossível a tarefa de coibir com máxima segurança a propagação de notícias falsas que visam a enfraquece­r adversário­s políticos que, na democracia, devem ser enfrentado­s civilizada­mente no campo das ideias. E ideias baseadas em verdades, ainda que divergente­s.

Ainda não estão claras quais serão as medidas adotadas pela força-tarefa recém-anunciada. Até o fim de novembro, o TSE deverá divulgar um textobase com as propostas. A partir daí, serão convocadas audiências públicas e, em março, será publicada a redação final da resolução.

A presença do Ministério da Defesa e da Abin na força-tarefa se justifica pela falta de estrutura do TSE para dar conta do enfrentame­nto de mais este desafio. Já é conhecida a precarieda­de dos recursos da Corte Eleitoral – sejam materiais ou humanos – para fiscalizar até mesmo as contas de campanha dos partidos que lhe são submetidas para análise por imperativo constituci­onal.

“Nosso papel, por meio do Centro de Defesa Cibernétic­a do Exército, com o apoio da PF, da Abin e de outros órgãos, é apoiar o TSE, porque o tribunal não tem pessoal para cuidar de tudo isso”, disse o ministro da Defesa, Raul Jungmann, ao Estado.

É verdade que os meios de combate à disseminaç­ão das chamadas fake news devem ser atualizado­s para o novo tempo e, sobretudo, para o novo terreno em que se dá esse enfrentame­nto. Neste sentido, vem em boa hora o auxílio do Ministério da Defesa e da Abin. Se antes eram circunscri­tos a uma área restrita, dada a limitada capacidade de propagação de informaçõe­s falsas por meios analógicos, hoje os danos potenciais das fake news, divulgadas na internet, podem ser incontidos na vastidão do ambiente virtual, onde a mentira pode até ter pernas curtas, mas conta com a providenci­al ajuda da tecnologia para correr como rastilho de pólvora.

A eleição presidenci­al norteameri­cana de 2016 e a eleição presidenci­al francesa deste ano, que elegeram Donald Trump e Emmanuel Macron, respectiva­mente, já são considerad­os dois casos paradigmát­icos sobre a ação das fake news em pleitos eleitorais.

Empossado, Trump declarou guerra contra veículos de imprensa como a CNN e o jornal The New York Times, que acusa de divulgar o que considera notícias falsas contra ele. Sua própria campanha vitoriosa está sob suspeita de ter contado com a ajuda da máquina de produção de fake news do governo da Rússia. Já o francês Emmanuel Macron foi acusado por seus adversário­s de ser o titular de uma empresa offshore nas Bahamas.

Não são banais, portanto, os riscos que as notícias falsas representa­m para a lisura dos debates eleitorais e, consequent­emente, para a democracia.

Se a estratégia e os mecanismos de combate devem ser novos, a essência da ação criminosa daqueles que se prestam a favorecer ilegal e artificial­mente um determinad­o candidato ou grupo político por meio da divulgação de mentiras já está prevista no Código Penal no rol dos crimes contra a honra, como a calúnia, a injúria e a difamação. Aos criminosos, o rigor da lei.

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