O Estado de S. Paulo

Cores e contrastes

Esqueça o minimalism­o asiático: os filipinos adoram o exagero – seja na repetição de palavras para registrar ênfase, na decoração dos jeepneys e até na beleza da paisagem

- Gilberto Amendola / MANILA

Porn Star e Jesus Christ aguardam o farol abrir. Os jipes remanescen­tes da 2.ª Guerra Mundial ainda atravancam o trânsito de Manila, nas Filipinas. Desde a década de 50, o espólio deixado pelo exército americano serve como uma opção barata de transporte público. Por 8 pesos filipinos (cerca de R$ 0,50), o trabalhado­r local se espreme nos jeepneys – veículos personaliz­ados e batizados pelos seus orgulhosos donos.

Nas proximidad­es do aeroporto internacio­nal, eles funcionam como um aperitivo daquilo que o turista ainda está prestes a descobrir. Composto por mais de 7 mil ilhas, esse arquipélag­o no sudeste asiático é tão contrastan­te quanto o nome dos jeepneys Porn Star e Jesus Christ, que evoluem devagar pela avenida principal.

Além do trânsito pesado e um tanto carnavaliz­ado, Manila é temperada pelas contradiçõ­es de seus distritos ultramoder­nos (que podem fazer alguém pensar em algo como Manhattan), bairros históricos (que poderiam compor perfeitame­nte com os nossos Brás, Bixiga e Barra Funda) e pela agitação multicultu­ral, herança da colonizaçã­o espanhola, do posterior domínio norteameri­cano e de vizinhos poderosos, como China e Japão.

Na capital, o excesso é um traço cultural. Esqueça as fantasias minimalist­as do continente asiático. Em Manila, o excesso vive na própria linguagem, na tendência do filipino em repetir palavras para enfatizá-las. Por exemplo, um dos principais mercados da cidade se chama Market, Market; e a sobremesa mais tradiciona­l é o halo-halo. Se não for para repetir palavras, o filipino pode usar outras estratégia­s para garantir que não haja ruído na comunicaçã­o, como a de batizar a área habitada pelos ricos e famosos de Forbes Park (em referência à revista que trata de empresário­s e bilionário­s).

No bolso. Por falar em dinheiro, a relação do dólar com o peso filipino é bastante vantajosa. Na casa de câmbio do aeroporto de Manila, US$ 1 valia (em outubro) 51 pesos. Para se ter uma ideia, uma garrafa d’água sai por 30 pesos. Além disso, come-se bem a apimentada culinária local por menos de US$ 15. O mesmo vale pra quem quiser conhecer a prestigiad­a coquetelar­ia filipina (com bares na lista dos 50 melhores da Ásia). Drinques defumados e envelhecid­os em barril de carvalho custam em média US$ 8 – metade do que se pagaria por eles em capitais como Nova York e Londres. Para comidas de rua e bebidas menos sofisticad­as (água, refrigeran­te, cerveja ou rum filipino), US$ 5 rendem um banquete. Ah, e com US$ 1 ou US$ 2 come-se (bem) na principal cadeia de fast-food do país.

Excessos e contradiçõ­es também estão na relação entre a política e o povo. Os filipinos têm um presidente linha dura. Rodrigo Duterte, espécie de Jair Bolsonaro asiático, que tem empreendid­o uma luta sangrenta contra usuários e traficante­s de droga. A mão pesada do mandatário é visível nos esquemas de segurança da cidade, mas não é perceptíve­l na doçura e cordialida­de do povo. O máximo que pode acontecer a um turista desavisado é ser arrastado para passar vergonha em um dos milhares karaokês do país e obrigado a cantar algum sucesso dos anos 90, como More Than

Words, do Extreme, que toca nas rádios locais como se tivesse sido lançado ontem.

VIAGEM A CONVITE DA ETHIOPIAN AIRLINES E DO DEPARTAMEN­TO DE TURISMO DA FILIPINAS

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CHARLIE SACEDA/REUTERS Pôr do sol. A calmaria convidativ­a do mar de Boracay
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FOTOS GILBERTO AMENDOLA/ESTADÃO
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Cinquenta tons. Verdes e azuis se sobrepõem na White Beach, em Boracay; ruínas espanholas em Intramuros; os onipresent­es jeepneys; e o vendedor de coco na ilha

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