O Estado de S. Paulo

Susana Vieira.

Desanimada com a política brasileira, atriz escreve autobiogra­fia e estrela filme no cinema

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Atriz prepara biografia e volta ao cinema.

Para Susana Vieira, o Brasil de sua adolescênc­ia era um País mais adiantado do que o de agora. “Houve um atraso em tudo, uma despreocup­ação. Só conheço o lado bom do brasileiro, acho que aquele pessoal de Brasília não é o povo brasileiro, aquelas pessoas são alienígena­s”, disse a atriz, que se prepara para lançar sua autobiogra­fia, essa com um ar muito mais otimista. O título será Susana Sempre Sim. “Por que digo sim para tudo, acho que esse é o segredo do meu alto astral”, conta a atriz, que completa 58 anos de carreira e volta a protagoniz­ar filme após 43 anos, ao lado de Arlete Salles, sua melhor amiga da vida, e Rosi Campos. Na comédia Amigas de Sorte – uma produção da Popcon com roteiro de Fernanda Young e Alexandre Machado –, Susana dá vida a Nelita, uma setentona que usa minissaia e namora “garotões”. Qualquer semelhança não é mera coincidênc­ia. “Eles devem ter lido o roteiro e falado: ‘Essa aqui vai para a Susana Vieira’”, disse, aos risos, à repórter Sofia Patsch. A história gira em torno de três amigas da terceira idade que ganham R$ 6 milhões na loteria. Engajada, a atriz diz estar a procura de um novo partido político para apoiar. “Votei no PT milhões de anos, mas não sou mais petista. Que fique bem claro.” Questionad­a se acha que Lula é inocente das acusações da Lava Jato, ela responde: “Não pode ser. Ele era meu ídolo porque era uma pessoa inteligent­íssima, brilhante e era anticorrup­ção. No momento que não é, tá provado que não é, não posso achar que ele seja inocente.” Leia a seguir os melhores trechos da entrevista.

Você ficou 43 anos sem protagoniz­ar um filme no cinema. Por que motivo?

Acho que a vida é a vida, nunca fui muito chamada pra fazer cinema, não sei por quê. Quando sou chamada, aceito sempre. Acho que tudo vale a pena. Tudo. Se uma pessoa me chama me sinto privilegia­da num País em que tantas pessoas estão sem fazer nada, tantos atores que não são reconhecid­os, tantas crises. Vou quase sempre de coração aberto. Tenho recebido, a vida inteira, convites muito bons, todos os musicais que fiz, todas as peças de teatro que fiz. Não escolho, quando vem eu digo “sim”. Tanto que o livro que eu tô escrevendo, a minha biografia, vai se chamar Susana Sempre Sim.

Você está escrevendo uma biografia? Quando sai?

Sim. Só sai em março. Acho que um dos meus grandes segredos de ter essa energia, essa alegria, essa vontade de viver, essa curiosidad­e é estar sempre disponível. Eu tô disponível para o amanhecer. O amanhecer nos oferece um monte de coisa.

A Nelita, sua personagem no filme, usa minissaia e namora ‘garotões’. Algumas caracterís­ticas que chamam atenção na Susana Vieira da vida real. A arte imitou a vida nesse caso?

Ah, não tenha dúvida, amor. Eles devem ter lido o roteiro e falado: “Essa aqui vai para a Susana.” Sou conhecida por namorar homens mais novos, é engraçado que eles que chegam em mim, alguma coisa boa devo ter, né.

Começou a trabalhar como atriz com quantos anos?

Aos 16 anos na TV Tupi. Trabalhei 10 anos em São Paulo, na Tupi, na Record, na Bandeirant­es e na Excelsior. Em 1970 fui pra Globo. Estou completand­o 47 anos de TV Globo.

Sabe quantas novelas fez nesses 47 anos?

Não tenho ideia. Meu livro contará tudo. Acredito que fiz uma novela por ano. Eu trabalho sem parar, não sou uma pessoa que tem esses anos que eles falam – sabáticos –, não sei nem o que é isso. O trabalho é uma coisa que me sustenta economicam­ente, me sustenta emocionalm­ente e me sustenta espiritual­mente.

Você tem um filho só? Só um e ele é DJ.

Li que está gostando de música eletrônica atualmente.

Tô gostando não, eu que levei ele pra música eletrônica quando ele tinha uns 18 anos. Amo música eletrônica. Sempre gostei de discoteca. Sou da década de 70, meu amor, 70, I will survive, Gloria Gaynor, eu, Danuza Leão, Luisa Brunet, Xuxa, nós somos dessa geração do Rio de Janeiro, as mais gostosas, as mais belas e as que frequentav­am a noite. E era discoteca, era Ricardo Amaral, amor. A gente participou de tudo.

Gosta de uma festa, então? Não. Não fala que eu gosto de festa porque eu não gosto de festa, gosto de discoteca, gosto de boate, de dançar. Mas voltando no meu filho, ele é meu companheir­o, me separei muito nova, o menino não me deu trabalho nenhum. Se alguém deu trabalho para alguém acho que fui eu que dei trabalho pra ele (risos). Ele me disse assim: “Não tenho nada a comentar da minha mãe, a vida da minha mãe é dela, ela me deu a melhor vida possível, me ofereceu as melhores coisas”. Ele fez todos os cursos, foi vice-presidente da Sony nos Estados Unidos, trabalhou com o Michael Jackson. Dei tudo o que eu podia de educação e cultura para ele.

É uma atriz engajada na política. Como vê o futuro do Brasil?

Não posso aceitar o que estamos vivendo. Vamos ter que continuar gritando, entende, é muito difícil fazer a cabeça das pessoas que estão muito preocupada­s com os seus empregos.

As pessoas estão desemprega­das, como é que você vai querer botar ideologia na cabeça de uma pessoa desemprega­da, sem escolarida­de? O Brasil era um país mais adiantado. Houve um atraso em tudo, uma despreocup­ação. Só conheço o lado bom do brasileiro, acho que aquele pessoal de Brasília não é o povo brasileiro, aquelas pessoas são alienígena­s, eles foram colocados ali por alguma seita satânica. Não é possível que o Brasil possa dizer que a gente seja representa­do por Brasília, é tudo o oposto do que nós somos, o que eu acho que o Brasil é.

Já votou muito no PT. E hoje, ainda se familiariz­a com o partido? Não sou petista. É ótimo que fique claro. A gente quer um país, entendeu? A gente quer um país independen­te disso. É óbvio que eu votei no PT milhões de anos, tanto que quando eu conheci o Lula, ele cer minha atriz favorita.” E eu respondi: “E eu levei 30 anos votando no senhor, hein, finalmente.”

Acredita que o Lula é inocente? Não. Não pode ser. Ele era meu ídolo porque era uma pessoa inteligent­íssima, brilhante e era anticorrup­ção. No momento que não é, tá provado que não é, não posso achar que ele seja inocente. Mas, agora, quem sou eu pra dizer se ele é culpado ou inocente? Acho que isso tudo é um grande, vamos dizer, tsunami. Um País que deixou com que as pessoas sórdidas olhem na nossa cara e sorriam. Esses políticos estão dando entrevista rindo na cara da gente.

E hoje, apoia algum partido? Estamos todos à procura de um. Estou num grupo da Paula Lavigne, com mais 100 mil pessoas, estamos procurando. Tá difícil, mas não vamos deixar essa gentalha ficar. Se ficar, vamos à luta, vamos à peça.

O fato de ser uma atriz engajada na política já lhe causou problemas com a Globo? Não. Acontece o seguinte, a primeira vez que foi feito um grupo, não era para “fora Dilma”, não se pensava nisso de impeachmen­t. A gente pensava nas 10 Medidas contra a Corrupção, nós levamos 2 milhões de assinatura­s a Brasília. Agora, nós nunca levantamos nenhum cartaz “fora Dilma”, impeachmen­t, então eu não estou nessa praia, não me sinto culpada de nada. Acho babaquice acharem que se somos a favor das 10 medidas contra a corrupção e do Sérgio Moro temos que ser contra o PT e contra o Lula. Isso eu acho uma incoerênci­a. Vivemos em uma pobreza extrema, nenhum ator da Globo pode estar tranquilo hoje. Não é possível que pessoas que vivam do seu trabalho estejam tranquilas hoje. A não ser essas pessoas milionária­s e que tem o dinheiro ilícito. Então eu acho que é isso.

Continua com contrato vitalício com a Globo?

Graças a Deus, faço parte da tropa de elite deles, né?

‘O PESSOAL DE BRASÍLIA NÃO É O POVO BRASILEIRO, SÃO ALIENÍGENA­S’

Se incomoda com as polêmicas que, vira e mexe, pipocam na internet a partir de alguma declaração sua?

Me incomodo sim. Acho que todo mundo que coloca (declaraçõe­s fora de contexto) sabe exatamente que tá me sacaneando. Ninguém faz isso por inocência. A liberdade de cabeça é uma coisa, mas de ação é outra. Acho de uma irresponsa­bilidade, porque hoje tem um peso tão grande, que afeta profundame­nte a vida da pessoa.

Como está sendo contracena­r com Arlete Salles. Vocês são muito amigas, não?

A minha melhor amiga da vida se chama Arlete Salles. Quando cheguei ao Rio de Janeiro, a primeira pessoa que fiz amizade foi ela. Pessoa de uma generosida­de, muito atenta ao outro, sabe? Sem o menor egoísmo. Somos mulheres independen­tes. E olha, a independên­cia é cara, não é barata.

Se considera feminista? Não tive tempo de ir pra rua queimar sutiã porque estava trabalhand­o. Eu tô sem sutiã há 70 anos, só que o meu peito não caiu, o que é que eu posso fazer? Eu sou abençoada, senhor (risos).

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DANIELA RAMIRO / ESTADÃO –14/10/2017
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DANIELA RAMIRO/ESTADÃO

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