O Estado de S. Paulo

O Mercosul como instrument­o do empresaria­do

São as empresas que realizam a integração, que geram riqueza e fazem funcionar os fluxos de comércio

- ALOYSIO NUNES FERREIRA MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES E SENADOR LICENCIADO PELO PSDB-SP

OMercosul é uma das principais plataforma­s para a internacio­nalização de nossas empresas e a inserção do País na economia mundial. A despeito disso, durante anos, a agenda do bloco pouco avançou no sentido de concretiza­r o seu propósito original: uma integração profunda, baseada em ampla liberaliza­ção dos fluxos de comércio, na articulaçã­o de cadeias de valor e no aumento dos investimen­tos recíprocos.

Ao longo do último ano, os sócios fundadores buscaram resgatar aquele propósito original da integração. Nesse período, adotamos um Plano de Ação para o Fortalecim­ento do Mercosul Comercial e Econômico, e graças a ele já eliminamos quase três quartos dos entraves existentes ao comércio intrabloco. Foram encaminhad­as soluções para 57 restrições, dentre elas a eliminação das Declaraçõe­s de Importação Antecipada (DJAIs) argentinas, que dificultav­am o comércio para os demais países do bloco. Também alcançamos a reabertura do mercado de carne bovina brasileira e as importaçõe­s, pelo Brasil, de cítricos argentinos. Além disso, ampliamos a cobertura da integração econômica por meio da retomada das negociaçõe­s para um Protocolo de Contrataçõ­es Públicas. Esse acordo contribuir­á para criar mais oportunida­des de negócio para as empresas de nossos países e ampliar o universo de fornecedor­es dos nossos órgãos públicos.

Em relação aos investimen­tos, recordo que o Mercosul atrai aproximada­mente metade do total de investimen­tos estrangeir­os diretos destinados à América Latina. Acredito que o bloco seja ambiente natural para a internacio­nalização de nossas companhias nacionais. É sintomátic­o, nesse sentido, que empresas brasileira­s respondam por mais da metade da produção total argentina de cimento e de tecidos planos, gerando mais de 50 mil empregos diretos no país vizinho. No Uruguai, a presença da indústria frigorífic­a brasileira soma, todos os anos, mais de US$ 300 milhões em divisas de exportação. O Brasil ocupa, ainda, de 2013 a 2015, o título de maior investidor estrangeir­o, em termos líquidos, no Paraguai, superando todos os países investidor­es tradiciona­is da região.

O novo dinamismo do Mercosul, nesse período, levou o bloco a engajar-se seriamente em negociaçõe­s internacio­nais de grande envergadur­a: com União Europeia, com a Associação Europeia de Livre Comércio (Efta) e outros parceiros extrarregi­onais.

Temos ambição e disposição para continuar engajados neste processo de aprofundar a liberaliza­ção comercial, por termos a convicção de que disso depende o bem-estar de nossas sociedades. Temos bem presente, de resto, a dimensão estratégic­a desse engajament­o, sobretudo num momento em que o mundo assiste ao recrudesci­mento de forças protecioni­stas, encantadas uma vez mais pela crença simplória na autossufic­iência dos mercados domésticos. De nossa parte, trabalhamo­s sem ingenuidad­e e atentos às complexida­des crescentes da competição por mercados e à consequent­e necessidad­e de construir acordos equilibrad­os. É com esse norte que o Brasil e o Mercosul veem no comércio internacio­nal um instrument­o capaz de acelerar o progresso e ampliar a prosperida­de de nossos países.

Internamen­te, o Mercosul prepara-se para os desafios de competir por novos mercados e de expor seus próprios setores produtivos à competição externa. Para isso, entendemos que o Mercosul deve ter por lastro regras claras, estáveis e previsívei­s. Esses são os atributos institucio­nais que permitirão às nossas empresas desenvolve­r seus negócios com segurança e visão de longo prazo. Afinal, é preciso não perder de vista que, em última análise, são as empresas que realizam a integração, que geram riqueza e fazem funcionar os fluxos de comércio. São os empresário­s que devem apostar na integração.

E é por ver nos empresário­s atores indispensá­veis na construção de um bloco mais moderno e competitiv­o que queremos escutá-los, garantindo-lhes uma participaç­ão mais ativa no processo de integração. Aqui se trata, fundamenta­lmente, de aferir quais são os anseios do setor privado do Mercosul; que visão tem dos caminhos a trilhar. Nesse exercício, queremos ir além da simples apresentaç­ão de demandas dos empresário­s a seus governos, e engajálos na busca efetiva de uma visão compartilh­ada da integração, calcada num compromiss­o comum com o Mercosul.

Foi para avançar nesse sentido que convidei lideranças dos setores produtivos do Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai para que se façam ouvir no Fórum Empresaria­l do Mercosul, a ter lugar em Campinas, São Paulo, nos próximos dias 4 e 5 de dezembro.

No Fórum, serão debatidas questões tais como a agenda externa do bloco, ações conjuntas para promover o agronegóci­o, a superação de barreiras e a facilitaçã­o do comércio. Ao final do encontro, teremos condições de identifica­r recomendaç­ões concretas da iniciativa privada dos quatro países. Daí deve redundar uma atuação mais unívoca do Mercosul rumo a esse futuro compartilh­ado.

Ainda que se trate de evento fechado, para um público de cerca de 80 empresário­s, as discussões serão abertas: o Fórum será transmitid­o ao vivo pela internet e coberto pela imprensa dos quatro países, de modo a que a mensagem possa ser partilhada e debatida por todos. Essa iniciativa reflete o momento do bloco, de coincidênc­ia de propósitos e de tratamento franco dos temas mais relevantes, a fim de consolidar objetivos comuns e assegurar que o Mercosul retenha seu papel nas estratégia­s nacionais de desenvolvi­mento e inserção internacio­nal.

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