O Estado de S. Paulo

Bons cenários, mas com riscos

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Cresciment­o depende de contas públicas e reformas.

Aeconomia brasileira volta a crescer e deve ganhar impulso nos próximos dois anos, num cenário de fortalecim­ento da atividade global, mas sinais de alerta complement­am as novas projeções da Organizaçã­o para Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE), divulgadas na terça-feira passada. Há riscos financeiro­s à frente, depois de anos de juros muito baixos no mundo rico, advertem os autores do relatório. No Brasil, o cresciment­o, retomado depois de oito trimestres de recessão, só se consolidar­á se houver progresso no conserto das contas públicas e na implementa­ção de reformas, avisam os técnicos da instituiçã­o, num recado dirigido muito mais aos políticos do que a economista­s e administra­dores informados e atentos às condições básicas de saúde da economia.

As perspectiv­as para o Brasil incluem cresciment­o de 0,7% neste ano, 1,9% no próximo e 2,3% em 2019. A projeção corrente no mercado financeiro nas últimas cinco semanas coincide com a publicada pela OCDE. Mas os números do mercado para os dois anos seguintes, 2,51% e 2,58%, são um pouco mais otimistas. Em detalhes essenciais, no entanto, os economista­s da organizaçã­o reforçam as advertênci­as já formuladas no Brasil por analistas experiente­s e de muito boa reputação profission­al.

No lado mais luminoso do cenário está a recuperaçã­o favorecida por juros em queda, ganho de renda real e aumento da confiança de consumidor­es e empresário­s. A inflação contida, lembram os economista­s da OCDE, favoreceu tanto a baixa dos juros como a melhora da renda familiar.

Eles também ressaltam a reativação espalhada por todos os setores, o começo de redução do desemprego e a solidez do sistema bancário, exposto na crise a um “teste real de estresse”. Mas o investimen­to produtivo continua retraído. Alguma recuperaçã­o só deve começar a aparecer a partir de 2018.

A mensagem mais importante é sobre as mudanças nas finanças públicas. Em primeiro lugar, será indispensá­vel uma política orçamentár­ia muito prudente por causa da dívida pública – alta e crescente. Com aperto e reformas, a dívida será estabiliza­da em 2024, quando estiver batendo em 91% do Produto Interno Bruto (PIB). Para isso será necessário equilibrar as contas primárias (receitas e despesas sem juros) e em seguida gerar superávits para cobrir progressiv­amente os encargos financeiro­s.

Mais que apertos, será preciso implantar novos padrões de política fiscal, com focos mais precisos para os gastos sociais e cortes de benefícios fiscais e subsídios financeiro­s concedidos a empresas (enormes e sem vantagens para o cresciment­o, como a experiênci­a comprovou e os analistas internacio­nais têm reconhecid­o). A reforma da Previdênci­a, naturalmen­te, é componente indispensá­vel das mudanças. O relatório realça também a importânci­a da reforma trabalhist­a, da formação de mão de obra, da assistênci­a ao emprego, da racionaliz­ação do sistema tributário e da abertura de mercados. Tudo isso deve produzir, de acordo com o relatório, maior cresciment­o, maior eficiência, custos mais baixos e menor desigualda­de.

Com outras palavras, o relatório repete uma verdade bem conhecida de quem dá alguma atenção aos fatos. Não se produz inclusão real nem se fortalece a economia com assistenci­alismo populista misturado com protecioni­smo comercial, distribuiç­ão de favores fiscais e subsídios a setores e grupos favoritos e muita gastança.

O panorama internacio­nal é por enquanto benéfico para o Brasil, com cresciment­o global estimado em 3,6% para 2017, 3,7% para 2018 e 3,6% para 2019. A manutenção da prosperida­de no mundo rico dependerá de mais estímulos fiscais e de política monetária suave ainda por algum tempo. Mas essa política, embora favorável à recuperaçã­o, abriu espaço a muito endividame­nto e a operações de alto risco. Qualquer estouro no mercado financeiro poderá criar problemas para todo o mundo. O Fundo Monetário Internacio­nal (FMI) já tem apontado esse perigo. Dirigentes de empresas muito endividada­s deveriam dar atenção a essa advertênci­a.

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