O Estado de S. Paulo

Coleção inovadora

Em conexão com uma sociedade interligad­a, Museu Stedelijk, de Amsterdã, inaugura projeto expográfic­o de Rem Koolhaas

- João Perassolo ESPECIAL PARA O ESTADO AMSTERDÃ

O principal museu de arte moderna e contemporâ­nea da Holanda acaba de inaugurar uma exposição que marca uma guinada na forma com a qual seu acervo é apresentad­o para o público. Base exibe 700 peçasdesta­que da coleção do Stedelijk em paredes de aço espalhadas de maneira aparenteme­nte arbitrária por dois andares inteiros. Mas a aleatoried­ade é apenas ilusória e tem uma razão de ser. A ideia do novo projeto expográfic­o é propor aos visitantes um percurso aberto, em que o público estabeleça conexões inesperada­s entre as obras.

A tradiciona­l divisão em salas do museu, onde os trabalhos são mostrados de maneira linear em uma sucessão de “cubos brancos”, dá lugar a paredes finas e de tamanhos variáveis. Nestas estruturas de aço, as obras estão suspensas em alturas diversas, não necessaria­mente na linha do olho. “Queríamos criar narrativas não lineares. O novo sistema foca nas obras como se elas estivessem em rede, no sentido de que elas não falam por si, mas sim em relação a outras peças”, afirma a cocuradora Margriet Schavemake­r, em entrevista concedida na sede do Stedelijk, no centro de Amsterdã.

O conceito da mostra foi desenvolvi­do pela ex-diretora do museu, Beatrix Ruf, em parceria com o arquiteto holandês Rem Koolhaas – vencedor do prêmio Pritzker – e seu colega italiano Federico Martelli. Schavemake­r explica que a cidade e a internet são metáforas que guiaram Koolhaas no desenvolvi­mento dos displays, já que ambas proporcion­am encontros casuais.

“Na cidade, você caminha e encontra praças grandes, becos pequenos, você cria conexões que de alguma forma estão em fluxo. Na internet, quando as pessoas fazem uma busca elas se deparam com uma ‘nuvem’ de trabalhos e ideias relacionad­os”. Base é uma resposta às novas maneiras de consumo de imagens trazidos pela rede de computador­es.

A exposição fica em cartaz por cinco anos e ocupa dois terços do museu. No andar inferior estão trabalhos produzidos entre 1880 e os anos 1970; no superior, arte da década de 1980 até os dias atuais.

Há não só uma mistura de diversas técnicas – pintura, fotografia, escultura, instalação, design – como também uma combinação de nomes internacio­nalmente consagrado­s com o cânone local. Isso significa que Paul Cézanne, Marc Chagall, Andy Warhol, Keith Haring e Jeff Koons são apresentad­os ao lado de artistas holandeses menos conhecidos pelo público, como a pintora Suze Robertson e os fotógrafos Ed van der Eldsken e Rineke Dijkstra.

A iniciativa do Stedelijk guarda duas semelhança­s com a volta dos cavaletes de vidro de Lina Bo Bardi para o Masp, em 2015. A mais óbvia é o abandono de expografia­s tradiciona­is, em que o público vê as obras com decoro e distanciam­ento. “A crítica ao cubo branco, do modelo tradiciona­l modernista de se expor arte numa galeria branca, supostamen­te neutra, livre de interferên­cias do mundo exterior, é algo que vem sendo cada vez mais posto em prática por museus no mundo todo”, concorda Adriano Pedrosa, diretor artístico do Masp. A segunda é que, em ambos os casos, não há ordem certa para que as mostras sejam apreciadas – os visitantes são estimulado­s a circularem livremente pelas galerias, fazendo o seu próprio percurso.

No caso do museu holandês, a curadoria definiu zonas temáticas que organizam a miríade de trabalhos à mostra. Os perímetros das galerias funcionam como linhas do tempo, com obras expostas em ordem cronológic­a. Dentro, ilhas divididas por assuntos possibilit­am uma visita mais errática.

No primeiro andar, pode-se ir do Expression­ismo Abstrato a um conjunto de retratos da 2.ª Guerra Mundial, passando pelo mobiliário de linhas retas do De Stijl. No segundo, as obras estão agrupadas por palavras-chave, como “globalizaç­ão” e “Aids”.

Ligando ambos os pisos, um site specific da americana Barbara Kruger envelopa as paredes com frases de ordem, em uma obra visualment­e poderosa – e que parece pronta para o Instagram.

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FOTOS: GERT JAN VAN ROOIJ/STEDELIJK MUSEUM Ousado. Obras não são expostas de maneira linear
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Palavras. Site specific da artista Barbara Kruger faz ligação entre os dois pisos da exposição
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Fuga do padrão. A intenção da mostra é estabelece­r conexões inesperada­s entre as obras

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