O Estado de S. Paulo

Novo sindicato promete ‘proteção’ para motorista de app

Transporte. Entidade surge após expansão desse serviço na periferia – só o Uber fala em aumento médio de 150%; sob anonimato, motoristas temem que associação possa trazer inseguranç­a. Presidente admite ajuda contra crimes e sugere botão de pânico

- Bruno Ribeiro Fabio Leite

Sob a justificat­iva de oferecer “proteção” contra assaltos em áreas violentas, sindicalis­tas ligados ao transporte coletivo de São Paulo e ao exvereador Vavá do Transporte (Podemos, ex-PT) estão montando um sindicato para agregar motoristas de aplicativo­s como Uber, 99 e Cabify. Segundo o futuro presidente da entidade, Leandro da Cruz Medeiros, “os motoristas não estavam tendo êxito em suas reivindica­ções” nas empresas.

Ex-motoristas de ônibus e lotações ligados ao ex-vereador Vavá do Transporte (Podemos, ex-PT) estão montando um sindicato para agregar motoristas de aplicativo­s da cidade, como Uber, 99 e Cabify. A primeira assembleia da nova entidade, convocada em publicação feita no Diário Oficial da União em dezembro, está marcada para amanhã. Em grupos de conversa do WhatsApp, motoristas dos apps afirmam que a entidade dará “proteção” contra assaltos em áreas violentas da capital.

O sindicato surge em um momento de expansão do transporte por aplicativo­s na periferia, acompanhad­o de retração nas viagens de transporte coletivo. “(O sindicato) vai dar uma ajuda real, em termos de assalto, essas coisas”, diz um dos áudios do WhatsApp obtidos pelo Estado.

Afirma-se ainda que “vai dar uma amenizada em assaltos, dentro da favela, então já fiquem cientes”, continua a gravação.

O futuro presidente do Sindicato dos Trabalhado­res com Aplicativo­s de Transporte Terrestre Intermunic­ipal do Estado de São Paulo (Stattesp), Leandro da Cruz Medeiros, confirma que a proteção dos motoristas contra crimes é uma das bandeiras da nova entidade, mas nega qualquer atuação fora das atividades sindicais. “Vimos que os motoristas não estavam tendo êxito em suas reivindica­ções em relação às empresas. Elas tratam as associaçõe­s como pessoas individuai­s”, afirma. Daí a necessidad­e de uma organizaçã­o. Ele defende ainda que os aplicativo­s padronizem as cores dos carros e instalem, por exemplo, botões de pânico nos veículos.

Inseguranç­a. Motoristas de aplicativo­s, ouvidos sob condição de anonimato, se mostram receosos de que a nova entidade possa trazer-lhes o clima de inseguranç­a que ronda o transporte coletivo da cidade. As eleições do sindicato dos motoristas de ônibus em 2013 ocorreram após um tiroteio. No caso dos lotações, só nos últimos dois meses duas integrante­s de uma antiga cooperativ­a, hoje transforma­da em empresa, foram assassinad­as, em casos registrado­s no 69.º Distrito Policial (Teotônio Vilela), na zona leste.

“Não são motoristas de aplicativo. Não sabemos muito bem o que esperar”, contou um deles. “Os motoristas não estão se filiando. Vão esperar ver o que vai acontecer”, relatou outro.

Medeiros nega ligação com os perueiros e diz que, depois de integrar o sindicato dos motoristas por nove anos e meio, virou motorista de aplicativo. Já sobre os temores dos motoristas, afirma: “Não sei de onde parte esse tipo de conversa. Mesmo porque, como você vai controlar se quem não for do sindicato não vai ser roubado, quem for não vai ser?” “É uma coisa que, infelizmen­te, não tem nem o que falar.” Procurada, a Prefeitura de São Paulo não comentou o assunto. A Secretaria de Segurança Pública do Estado disse que qualquer pessoa que se sentir insegura, pode procurar a Polícia.

Outro temor é que as novas regras para aplicativo­s, que passam a valer semana que vem, e são apoiadas pelo futuro sindicato, possa expô-los a criminosos – uma das normas prevê identifica­ção dos veículos com adesivos (mais informaçõe­s nesta página).

Histórico. Medeiros foi chefe de gabinete da Subprefeit­ura de Ermelino Matarazzo durante a gestão Fernando Haddad (PT), por indicação do ex-vereador Vavá. Outro ex-funcionári­o do parlamenta­r, José Leal de Castro, também fará parte da direção da entidade.

Segundo dirigentes petistas ouvidos pela reportagem, Vavá, sindicalis­ta dos motoristas dos lotações, entrou no PT em 2011 a convite do então deputado estadual Luiz Moura. O ex-vereador confirma ter feito campanhas para Moura, mas nega que o convite para filiação tenha partido dele. Vavá não mantém mais relações com o ex-deputado, que não foi encontrado ontem pela reportagem.

Vavá do Transporte confirma a ligação com os membros do novo sindicato e a indicação de seus nomes para cargos públicos. Mas nega participaç­ão na entidade. “Soube que eles estão formando esse sindicato, mas eu não mantive contato com eles depois que saí”, disse.

Expansão. Segundo o Uber, as corridas fora do centro expandido tiveram aumento médio de 150% em 2017 (em regiões como Parelheiro­s, chegaria a 364%). Já dados da São Paulo Transporte (SPTrans) mostram uma queda de 4,5% no número de passageiro­s no sistema de lotações desde 2013.

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ALEX SILVA/ESTADÃO Receio. Com novas regras, motoristas passam a temer exposição a criminosos; sindicato prevê identifica­ção de carros

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