Papa condena uso de violência política
Hostilidade. Em uma semana, mais de dez igrejas católicas, uma escola e três helicópteros de madeireiras foram incendiados no país; região visitada pelo pontífice está no centro de uma disputa entre grupos extremistas da etnia mapuche e o governo chileno
No Chile, o papa Francisco condenou o uso da violência para obtenção de ganho político. Igrejas católicas sofreram ataques atribuídos a indígenas.
O papa Francisco condenou ontem a violência de indígenas no Chile. A passagem do pontífice por Temuco, no sul do país, foi marcada por uma série de ataques atribuídos a radicais mapuches, etnia indígena que reivindica direito à terra. Ao menos duas igrejas católicas e uma escola foram incendiadas, assim como três helicópteros usados por empresas madeireiras. Em uma semana, mais de dez templos cristãos foram atacados.
Nenhum grupo assumiu a autoria dos ataques dos últimos dias. Segundo o promotor Enrique Vásquez, porém, investigadores encontraram, na igreja e na escola incendiadas ontem, na cidade de Collipulli, cartazes e panfletos com mensagens que exigiam a libertação de prisioneiros mapuches. Em Curanilahue, onde os helicópteros foram queimados, na noite de terça-feira, folhetos pró-mapuche também foram encontrados.
A notícia do último ataque incendiário, ocorrido em uma igreja de Panguipulli, 515 quilômetros ao sul de Santiago, foi revelada enquanto Francisco rezava a missa no Aeródromo de Maquehue, em Temuco, capital da região de La Araucanía, uma das mais pobres do Chile. Segundo o general Diego Olate, um panfleto também foi encontrado no local, mas o militar não deu mais detalhes.
Repressão. Atentados de indígenas radicais – contra madeireiras, propriedades de descendentes de colonos europeus, maquinários agrícolas e caminhões – são comuns nos arredores de Temuco. A região de La Araucanía está totalmente militarizada, com dezenas de empresas sob vigilância 24 horas.
A repressão é constante contra os indígenas, cujas casas são invadidas por policiais, que quebram móveis e já chegaram a atacar com gás lacrimogêneo o interior de creches que cuidam de crianças mapuches.
Diferentemente dos casos de abuso sexual de religiosos, o tema indígena já estava na pauta da viagem de Francisco ao Chile e ao Peru, onde o papa deve chegar hoje. O pontífice tem interesse especial na questão e espera aproveitar o giro latinoamericano para preparar o terreno para um grande encontro eclesiástico, em 2019, sobre os povos da Amazônia.
Estima-se que cerca de 2 mil comunidades mapuches – com cerca de 700 mil pessoas – vivam no Chile pacificamente, à espera de que o governo lhes devolva pequenas porções de terra. Organizações radicais dos indígenas, porém, exigem a devolução total de seu território ancestral.
Em sua homilia na base área de Temuco, que além estar nas terras disputadas com o governo chileno também serviu de centro de detenção e tortura durante a ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1990), Francisco denunciou o uso da violência para a obtenção de ganhos políticos.
Dirigindo-se às 150 mil pessoas que compareceram à missa campal, dedicada também às vítimas do regime militar, o papa pediu diálogo em relação à causa mapuche.
“Oferecemos esta missa para todos aqueles que sofreram e morreram – e para aqueles que suportam diariamente a carga de muitas dessas injustiças”, afirmou o pontífice.
Após a cerimônia, o papa almoçou com oito mapuches, um
descendente de colonos suíços e alemães, uma vítima da violência na região e um imigrante haitiano.
Reconciliação. A líder mapuche, Francisca Linconao, acusada de participação no assassinato de um casal de agricultores de origem europeia, em 2013, tentou sem sucesso entregar ontem uma carta a Francisco, mas o papamóvel não parou quando passou pela militante, na saída da missa. Hoje, o papa visita Iquique, no norte do Chile, antes de seguir para o Peru.