O Estado de S. Paulo

Erros e acertos

- ZEINA LATIF E-MAIL: ZEINA.LATIF@TERRA.COM.BR ZEINA LATIF ESCREVE ÀS QUINTAS-FEIRAS ECONOMISTA-CHEFE DA XP INVESTIMEN­TOS

Omercado financeiro ignorou o rebaixamen­to da nota de crédito do Brasil pela S&P na semana passada, mesmo não sendo esperado. Havia a avaliação de que as agências não se moveriam em ano de eleição. A bolsa segue em alta e o dólar, bem-comportado.

O cenário internacio­nal benigno, com apetite dos investidor­es por países emergentes, certamente contribui para isso.

Fatores internos, porém, também influencia­ram os investidor­es. Diferente do ocorrido na perda do grau de investimen­to em setembro de 2015 e, em menor grau, no posterior rebaixamen­to em fevereiro de 2016, desta vez não houve um descolamen­to dos preços de ativos do Brasil em relação aos de países parecidos. Nem antes, nem depois do rebaixamen­to.

Quem está certo, o mercado financeiro ou a S&P? Cada um tem seus erros e acertos.

A agência justificou o rebaixamen­to que colocou o Brasil no grupo de Bangladesh, Macedônia e Vietnã pela não aprovação da reforma da Previdênci­a e pela incerteza política.

A análise fria dos indicadore­s que costumam definir as notas dos países – déficit e dívida pública, cresciment­o do PIB, PIB per capita – deixa o Brasil bem mal na foto. O que evita o desastre são os indicadore­s externos sólidos (como as reservas internacio­nais) e a taxa de inflação baixa, segundo a agência.

Levando-se em consideraç­ão os riscos fiscais crescentes na ausência de reformas, o quadro é ainda mais sério. A agência acerta, portanto, ao apontar essa que é a maior fragilidad­e econômica do País. Os mercados, porém, muitas vezes, minimizam o grave problema fiscal.

A agência também acerta ao apontar a responsabi­lidade coletiva por essa situação, enquanto reconhece o comprometi­mento e esforço do governo para reduzir o déficit orçamentár­io. Sobram críticas à falta de apoio político às reformas pelos demais poderes, citando inclusive a liminar do ministro do STF para suspender o adiamento do reajuste do funcionali­smo e o aumento da contribuiç­ão da Previdênci­a.

A S&P avalia que os desdobrame­ntos políticos recentes são prenúncio dos elevados riscos pós-eleição, havendo preocupaçã­o com outsiders e políticos sem experiênci­a, que poderiam atrapalhar o avanço das reformas. Aqui houve alguma precipitaç­ão. Os riscos políticos tendem a ser menores após as eleições em comparação com a atual conjuntura. Um presidente recém eleito poderá sofrer menor pressão do que um que sucedeu um impeachmen­t, sofreu duas denúncias do Ministério Público e está em final de mandato. O presente não parece um bom guia para o futuro. E mesmo que alguém inexperien­te ganhe a eleição, o que importa é a capacidade de montar times técnicos e de articulado­res políticos competente­s, e de dialogar. Além disso, dar tanto peso à figura do presidente é não reconhecer algum amadurecim­ento do Brasil nesses dois últimos anos.

A agência critica a discussão sobre a flexibiliz­ação da regra de ouro, que talvez seja inevitável. Se bem conduzida, com adoção de contrapart­idas, não implicará um aumento do risco fiscal. Além disso, há a regra do teto. O governo falhou nessa comunicaçã­o.

O timing do rebaixamen­to não deixa de ser curioso. O quadro econômico, ainda que modesto, surpreende­u positivame­nte em 2017. Há boas chances de o mesmo se repetir em 2018, inclusive pelas reformas conduzidas, como a trabalhist­a e a criação da TLP, que contribuem para aumentar o potencial de cresciment­o do País. O PIB poderá crescer mais de 3% este ano. O 2,2% estimado pela S&P parece conservado­r.

A agência também acredita que a recuperaçã­o da economia poderá reduzir o ímpeto para reformas fiscais. Difícil concordar. O dinheiro acabou e as regras constituci­onais disciplina­ndo o orçamento tornam as reformas inevitávei­s.

O cenário político incerto não significa que os desdobrame­ntos serão necessaria­mente ruins. O mercado parece atribuir uma probabilid­ade relevante de um cenário benigno, o que não é considerad­o pela S&P. Seu cenário é que o próximo presidente enfrentará dificuldad­es demais. Está cedo para esse prognóstic­o.

O timing do rebaixamen­to não deixa de ser curioso. O quadro econômico surpreende­u

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