O Estado de S. Paulo

CAVALEIROS SALTAM AS BARREIRAS DA IDADE

Atletas na faixa dos 60 anos mostram que o hipismo une a juventude da montaria com a experiênci­a do cavaleiro.

- Gonçalo Junior

O hipismo tem uma particular­idade em relação às outras modalidade­s: a idade não limita de maneira decisiva o desempenho dos competidor­es. Afinal, é o cavalo que precisa ser jovem, não o cavaleiro. Nesse contexto, o Brasil tem uma legião de atletas com perfil diferencia­do. Aos 50 e 60 anos, eles são competitiv­os, fazem uma preparação física específica para a idade e ainda levam vantagem no quesito experiênci­a. É a velha guarda do hipismo brasileiro.

Alguns exemplos dão sustância a essas afirmações. Cesinha Almeida é bastante conhecido no Clube Hípico de Santo Amaro, em São Paulo. Em um dos treinos, ele foi cumpriment­ado por três pessoas em 15 minutos. Sua façanha mais recente foi a conquista do Torneio de Verão, principal prova de abertura da temporada nacional. É um torneio tradiciona­l, com 30 anos, disputado com provas de salto para todos os níveis e categorias. O medalhista pan-americano se sagrou campeão competindo com rivais de ponta, como André Miranda, medalhista pan-americano e campeão brasileiro, e Fábio Sarti, bicampeão do torneio em 2017. Também superou os jovens talentos Thales Marino e Marcelo Gozzi, ambos de apenas 17 anos.

Aos 57, ele toma alguns cuidados com a alimentaçã­o e bate ponto na academia duas vezes por semana para fazer musculação. E só. “O cavaleiro não pode perder a forma, engordar, mas o esforço maior é do cavalo”, diz Cesinha, que se prepara para o Internacio­nal The Best Jump em Porto Alegre na altura de 1,55 m. Ele é o único tetracampe­ão do evento.

Vitor Teixeira fala espontanea­mente que completou 60 anos no dia 22 de janeiro. Ele dispensa a ginástica e os exercícios de alongament­o e conta que se mantém em forma apenas com as atividades diárias. Ele monta quatro cavalos por dia e dá aula para dez conjuntos de salto que participam de provas internacio­nais. Além disso, ainda compete como atleta e esteve no Winter Equestrian Festival (WEF) 2018, em Wellington, na Flórida, e pretende competir em Porto Alegre. “Dizem que o hipismo é como vinho: quanto mais velho, melhor”, brinca. “Quando você está mais experiente, você domina a parte emocional e pode render

mais”, diz Teixeira, que também é responsáve­l por todas as equipes de salto da Argentina.

Para Rodrigo Sarmento, competidor e também presidente da Federação Hípica de Minas Gerais, os saltos não exigem uma preparação física extrema do cavaleiro. Ele faz pilates (exercícios que visam a conexão completa entre corpo e mente), joga futebol, anda de bicicleta (uma hora por dia) e treina com seis a oito cavalos diariament­e.

Dois nomes estendem a ideia da longevidad­e ainda mais

adiante. Nelson Pessoa, ícone do hipismo mundial e pai do campeão olímpico Rodrigo Pessoa, monta e salta aos 82 anos. Aos 59, o britânico Nick Skelton conquistou o ouro no salto nos Jogos Olímpicos do Rio.

Para Katia Rubio, professora associada da Escola de Educação Física e Esporte da USP, os casos do hipismo são exemplos para outras áreas. “As questões principais são lidar com o envelhecim­ento e aproveitar a experiênci­a dessas pessoas para ajudar as novas gerações”, opina.

Embora Cesinha, Teixeira e Pessoa não tenham histórico de lesões recentes, os médicos afirmam que o risco é grande. Alexandre Fogaça Cristante, ortopedist­a do Instituto de Ortopedia e Traumatolo­gia do Hospital das Clínicas, explica que, no hipismo, existe um impacto repetitivo sobre a região lombar que pode predispor a lesões na coluna, como lombalgia por desgaste do disco, por artrose e hérnias de disco. Skelton passou por lesões mais sérias, conseguiu se recuperar e retornou.

Como em outros esportes, o treinament­o e preparo muscular são fundamenta­is. Para Orlando Righesso Neto, ortopedist­a, cirurgião da coluna e titular da Sociedade Brasileira de Coluna (SBC), os exercícios de fortalecim­ento do sistema core, musculatur­a estabiliza­dora da coluna, podem prevenir lesões mais drásticas nos cavaleiros.

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RAFAEL ARBEX/ESTADÃO
 ?? FOTOS: RAFAEL ARBEX/ESTADÃO ?? Em forma. Aos 57 anos, Cesinha Almeida, um dos grandes nomes da modalidade, vai à academia duas vezes por semana
FOTOS: RAFAEL ARBEX/ESTADÃO Em forma. Aos 57 anos, Cesinha Almeida, um dos grandes nomes da modalidade, vai à academia duas vezes por semana
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Dupla. Restless e Cesinha venceram o Torneio de Verão
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NA WEBVídeo. O treino de Cesinha Almeida e Restless na hípica

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