Falta de regras prejudica devolução de concessão
Concessionárias de um aeroporto e uma rodovia já pediram a dissolução de contrato prevista na legislação, mas governo demora em permitir nova licitação
Uma divisão dentro do governo impede que as concessionárias de infraestrutura se beneficiem de medidas de socorro que o próprio Executivo criou para elas. Foram editadas duas medidas provisórias (MPs), a 752 e a 800, com o objetivo de preservar os empreendimentos. Mas nenhuma foi colocada em prática.
Com isso, enquanto o governo se afunda em discussões sem fim, várias concessões caminham para cancelar os contratos atuais e fazer uma nova licitação, processo chamado tecnicamente de caducidade.
A Aeroportos Brasil Viracopos (ABV) entrou na quinta-feira passada com uma ação no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para pedir ao governo que estabeleça as regras para a chamada relicitação, pela qual a concessionária devolve o negócio e fica numa espécie de “operação padrão” até que seja escolhido outro concessionário.
Esse mecanismo foi criado pela MP 752, já aprovada e convertida na Lei 13.448. Porém, um ano e quatro meses depois da edição, ele continua sem poder ser aplicado, por falta de normas. Mais precisamente, de um decreto do presidente Temer.
A Via 040, que administra o trecho da BR-040 entre Brasília e Juiz de Fora (MG) também pediu para devolver a concessão.
Dois fatores explicam a demora em regular a relicitação. O primeiro é uma divisão a respeito do mecanismo. Uma ala não vê razão para ajudar grupos que, no leilão, ofereceram tarifas irrealisticamente baixas. O argumento é reforçado pelos que defendem que contratos assinados no governo Dilma sejam cumpridos. É a linha, por exemplo, da área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU).
A ala contrária diz que, bem ou mal, as concessionárias investiram e oferecem serviços bem avaliados. Retomando os negócios, o governo não conseguiria manter o padrão dos serviços. O argumento conquistou simpatizantes no governo.
A ideia da relicitação que Viracopos e Via 040 defendem é manter as concessionárias à frente dos serviços, ainda que sem fazer os investimentos previstos, até repassar o negócio.
E foi justamente nesse ponto que a regulamentação empacou. A última versão do decreto com procedimentos para a relicitação prevê que a concessionária continuará a ser multada pela falta dos investimentos.
Nos bastidores, esse “nó” é atribuído à Casa Civil. Consultado, o órgão informou que não houve consenso na área jurídica. Por isso, a minuta do decreto retornou ao Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).
Cautela.
A hesitação em pôr a relicitação em prática tem outra explicação: a política. O consórcio que arrematou Viracopos tinha a UTC, alvo da Lava Jato, em sua composição. A Via 040 é da Invepar, que tem participação de outro alvo, a OAS. Ainda que sejam negócios apartados dos esquemas investigados, o ambiente deixa os funcionários públicos cautelosos.
Procurada, a Via 040 comentou que a relicitação é uma saída diante da “desconfiguração de premissas” da concessão. Para que o processo ande, diz, é “fundamental a imediata regulamentação”. A empresa afirma manter suas obrigações em dia.