O Estado de S. Paulo

Caso mostra que dados pessoais de brasileiro­s estão ‘expostos’

Ausência de autoridade capaz de vigiar potenciais violações e de marco legal deixa cidadãos desprotegi­dos

- /B.C. e C.T.

Além de expor o mecanismo de compartilh­amento de dados pessoais entre diversos serviços na web, o escândalo do Facebook e da Cambridge Analytica joga luz sobre a falta de proteção a privacidad­e online no Brasil. Para especialis­tas ouvidos pelo Estado, o País carece de leis e órgãos capazes de vigiar violações cometidas por empresas, como é o caso do uso ilícito de informaçõe­s pela Cambridge Analytica.

“Há no Brasil uma colcha de retalhos de leis sobre dados pessoais, mas que não nos dão instrument­os para lidar com o assunto”, diz Francisco Brito Cruz, diretor do centro de pesquisa em direito e tecnologia InternetLa­b. O pesquisado­r se refere à existência de artigos na Constituiç­ão Federal, no Marco Civil da Internet e no Código de Defesa do Consumidor que protegem os dados pessoais dos brasileiro­s, mas que não cobrem a complexida­de de um caso desse tipo.

É um cenário bem diferente do vivido no Reino Unido, por exemplo, que tem uma legislação definida sobre o assunto e uma autoridade central responsáve­l por investigar violações de dados. Nos Estados Unidos, a autoridade regulatóri­a do comércio (FTC) pode averiguar crimes desse tipo. Esses órgãos têm conhecimen­to técnico para identifica­r se há relação entre a coleta de dados por um aplicativo e o uso indevido das informaçõe­s.

Hoje, a criação de uma autoridade nacional de proteção de dados pessoais está prevista no projeto da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (PL 5276/2016). Concebido em 2011 após uma série de consultas e audiências públicas, com ampla participaç­ão, o texto está na Câmara dos Deputados desde 2016, quando foi enviado pela então presidente Dilma Rousseff, em um de seus últimos atos na Presidênci­a.

Atualmente, o projeto é discutido em uma comissão especial, que já teve seu prazo prorrogado inúmeras vezes e hoje aguarda a apresentaç­ão do texto substituti­vo, que deve ser proposto pelo relator Orlando Silva (PCdoB-SP).

“Está mais do que na hora de termos essa legislação”, diz Demi Getschko, diretor presidente do Núcleo de Informação e Coordenaçã­o do Ponto BR (NIC.br). “Mas é preciso separar

o que são dados necessário­s à identifica­ção das pessoas dos dados sensíveis, como suas preferênci­as.”

Cruz, do Internet Lab, reconhece que o projeto ainda têm artigos que não são consenso, mas reforça a urgência de sua aprovação. “Precisamos, como democracia, fazer um pacto para entender o problema. O uso de sistemas de análise de grandes

bancos de dados (Big Data) é uma realidade, mas não temos uma lei para endereçar esse assunto e seus riscos”, diz. Ele mesmo, porém, vê com pessimismo o horizonte para o PL 5276 ser discutido – como prevê a criação de um órgão, com uso de orçamento federal, o tema precisaria de amplo apoio, algo difícil de acontecer em um período pré-eleitoral.

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SERGIO CASTRO/ESTADÃO-1/05/2015 Espera. Orlando Silva deve apresentar substituti­vo para PL

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