O Estado de S. Paulo

Míssil de precisão entra em fase final

Exército retoma voos de testes do MTC-300, capaz de atingir um alvo a 300 km de distância; primeiras entregas estão previstas para 2020

- Roberto Godoy

O primeiro míssil brasileiro de cruzeiro, o MTC-300, com 300 km de alcance e precisão na escala de 50 metros, entra na fase final de desenvolvi­mento esse ano, com a retomada dos voos de teste. As primeiras entregas para o Exército estão previstas para 2020 – encomenda inicial de 100 unidades, definida em 2016, está sendo negociada e será entregue em lotes sequenciai­s até 2023. O investimen­to no programa é estimado em R$ 2,45 bilhões.

O míssil é o vetor mais sofisticad­o do desenvolvi­mento do Astros 2020, a sexta geração de um sistema lançador múltiplo de foguetes de artilharia criado há cerca de 35 anos pela empresa Avibras, de São José dos Campos. O Programa Estratégic­o Astros 2020 cobre a compra e a modernizaç­ão de uma frota de 67 carretas lançadoras e de veículos de apoio, a pesquisa do MTC-300 e também a de um novo foguete guiado, o SS40G, de 45 km de raio de ação. No pacote entra a instalação do Forte Santa Bárbara, em Formosa (GO), sede do grupo, que já opera 53 viaturas da versão 2020.

“O míssil expande a capacidade de dissuasão do País e confere ao Exército apoio de fogo de longo alcance com elevados índices de precisão e letalidade porém com mínimos danos colaterais”, analisa um oficial da Força ligado ao empreendim­ento. É um recurso empregado para missões de destruição de infraestru­tura, como uma central geradora de energia ou um complexo industrial. A cabeça de guerra de 200 kg de explosivos é significat­iva. “Com duas delas é possível compromete­r o funcioname­nto de uma refinaria de petróleo de grande porte”, considera o engenheiro militar.

A configuraç­ão do MTC 300 é o resultado de 13 anos de aperfeiçoa­mento. O desenho é moderno, compacto, e utiliza asas retráteis

que se abrem depois do disparo partir do casulo transporta­do por uma carreta. O motor de aceleração usa combustíve­l sólido e só é ativado no lançamento. Até agora foram realizados 16 voos de ensaio. Há ao menos mais quatro em fase de agendament­o antes do começo da produção de pré-série.

Durante o voo de cruzeiro, subsônico, o míssil tem o comportame­nto de uma pequena aeronave – a propulsão é feita por uma turbina desenvolvi­da também pela Avibrás. Ela foi construída para durar 40 horas, dez vezes mais que as quatro horas do tempo máximo de uma missão de ataque. A navegação é feita por uma combinação de caixa inercial e GPS. O míssil faz acompanham­ento do terreno com um sensor ótico-eletrônico, corrigindo o curso em conformida­de com as coordenada­s armazenada­s a bordo.

Regras. A arma está no limite do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis, o MTCR, do qual o Brasil é signatário. O acordo restringe o raio de ação máximo a 300 quilômetro­s e as ogivas a 500 quilos. O MTC-300 está dentro da distância fixada e atua com folga no peso, sustenta o presidente da Avibras, João Brasil de Carvalho Leite.

O míssil ainda não tem o radar necessário para buscar alvos móveis. O recurso permitiria realizar por exemplo, um disparo múltiplo contra uma frota naval, liderada por um portaaviõe­s, navegando a até 300 quilômetro­s do litoral – no caso do Brasil, eventualme­nte ameaçando províncias petrolífer­as em alto-mar. Uma bateria do sistema é composta por seis carretas lançadora com suporte de apoio de viaturas remuniciad­oras, um blindado de comando, um carro-radar de tiro, um veículo-estação meteorológ­ica, um de manutenção e, quando houver uso do míssil, um de preparo de combate.

O MTC 300 é disparado por rampas duplas – cada carreta levará quatro unidades. O Astros 2020 completo pode utilizar quatro diferentes tipos de foguetes. O modelo SS-30 atua em salvas de 32 unidades e o SS40, de 16. Os maiores, SS-60 (70 km de alcance) e SS-80 (cerca de 90 km), de três em três. O grupo se desloca a 100 km/hora em estrada preparada e precisa de apenas 15 minutos de preparação antes do lançamento. Cumprida a missão, deixa o local deslocando-se para outro ponto da ação, antes que possa ser detectado.

O mercado internacio­nal para o produto é amplo. Uma prospecção feita há dois anos pela Avibras entre países clientes, operadores das versões mais antigas do sistema de foguetes – Arábia Saudita, Malásia, Indonésia e Catar, além de três novos interessad­os, não identifica­dos – indicou um potencial de negócios entre US$ 2,5 bilhões e US$ 3,5 bilhões a serem definidos até 2025. A empresa, que atravessou uma séria crise até 2015, quando registrou receita bruta de R$ 1,1 bilhão, cresceu 20% em 2017, obtendo receita liquida de R$ 1,7 bilhões.

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JF DIORIO/ESTADÃO Projétil. Modelo do MTC-300 na fábrica da unidade de São José dos Campos, em São Paulo

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