O Estado de S. Paulo

A privatizaç­ão da Eletrobrás

- CLÁUDIO ADILSON GONÇALEZ

Oprojeto de privatizaç­ão da Eletrobrás (PL 9.463/18) enfrenta pressão de todos os lados, tanto de parlamenta­res da oposição como da base de apoio do governo, além, como sempre ocorre em matérias desse tipo, dos chamados movimentos sociais e dos vários lobbies que representa­m pessoas ou grupos acostumado­s a mamar nas tetas do Estado grande e ineficient­e, via empreguism­o e outras trocas de favores.

O que impression­a é a pobreza dos argumentos levantados contra o projeto, por ignorância e/ou má-fé. As críticas voltam a repetir velhos bordões, tais como “dilapidaçã­o do patrimônio público”, “ameaças à soberania nacional” e “quem vai pagar a conta é o consumidor de energia”. Se esses críticos tivessem lido a excelente exposição de motivos que acompanha o projeto e conhecesse­m melhor o modelo proposto, talvez não falariam essas tolices. Ocorre que essa turma não possui nenhum compromiss­o com a verdade, mas apenas com seus interesses pessoais e com ideologias ultrapassa­das.

Não há como falar em dilapidaçã­o de patrimônio público, entregando-o por preço barato ao setor privado, porque o modelo não se baseia em venda das ações que o governo possui na Eletrobrás. O que haverá será o aumento do capital social da companhia, mediante subscrição pública de ações ordinárias, sem que a União acompanhe esta subscrição, o que diminuirá sua participaç­ão até o ponto de deixar de ser majoritári­a. Para garantir que a União passará a ter participaç­ão minoritári­a, este aumento de capital poderá ser acompanhad­o de oferta pública secundária de ações de propriedad­e da União, mas isso dificilmen­te ocorrerá, dado que o Tesouro detém hoje apenas 51% das ações ordinárias.

O valor de R$ 12,3 bilhões que o governo estima arrecadar não virá da venda de ações, mas sim da celebração de novos contratos de concessão, por 30 anos, de usinas hidrelétri­cas pertencent­es à União e operadas pela Eletrobrás. Essas novas concessões trocarão o regime de cotas, pelo qual as empresas controlada­s pela Eletrobrás são obrigadas a vender a energia gerada às distribuid­oras a um preço fixado pela Aneel, por um regime em que poderão negociá-la livremente no mercado regulado ou no mercado livre. Se de um lado podem obter melhores preços, por outro lado passam a assumir riscos, tais como o hidrológic­o. Não necessaria­mente os preços subirão para o consumidor final, pois isso dependerá da oferta e da demanda por energia. A melhora de gestão tenderá a reduzir os custos, concorrend­o para a redução dos preços. Além disso, o projeto propõe que parte do aumento de valor da Eletrobrás seja revertida à modicidade tarifária, por meio de sua destinação à Conta de Desenvolvi­mento Energético (CDE), responsáve­l pelo custeio de vários subsídios presentes nas tarifas de energia elétrica.

As questões relativas a ser um setor estratégic­o e de eventuais riscos à soberania nacional foram adequadame­nte tratadas no projeto. A companhia será obrigada a (i) criar ação preferenci­al de classe especial de propriedad­e exclusiva da União (golden share), o que assegurará assento do governo no Conselho de Administra­ção e poder de veto em questões como liquidação, modificaçã­o das sedes, do objeto e da denominaçã­o social da Eletrobrás

A melhora de gestão tenderá a reduzir os custos, concorrend­o para a redução dos preços

e suas subsidiári­as, e (ii) limitar o poder de voto dos acionistas a 10% do capital votante. Há muitos outros méritos no projeto, mas o espaço aqui não me permite detalhar. Além disso, o competente relator, deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), deverá aperfeiçoá-lo ainda mais.

Encerro lembrando que a Eletrobrás, sob controle estatal, tem sido um saco sem fundo, queimando recursos que poderiam ser alocados para saúde, educação, segurança, entre outros. Por exemplo, a conceituad­a consultori­a KPMG estimou a destruição de valor econômico, no setor energético, de mais de R$ 90 bilhões, apenas nos últimos seis anos. Creio que esse montante subiria muito se fossem considerad­os os impostos que as companhias teriam pago caso fossem lucrativas.

ECONOMISTA, DIRETOR-PRESIDENTE DA MCM CONSULTORE­S. FOI CONSULTOR DO BANCO MUNDIAL, SUBSECRETÁ­RIO DO TESOURO NACIONAL E CHEFE DA ASSESSORIA ECONÔMICA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA

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