O Estado de S. Paulo

Política de juros e políticos

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As condições para a queda dos juros bancários estão dadas, segundo o BC, mas falta convencer os banqueiros a agir de acordo com esse diagnóstic­o.

As condições para a queda dos juros bancários estão dadas, segundo o presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn, mas falta convencer os banqueiros privados a agir de acordo com esse diagnóstic­o. O dinheiro continua muito caro para a maioria dos empresário­s e consumidor­es, apesar da inflação baixa, dos cortes da Selic e da redução da inadimplên­cia. Com algum recuo das taxas cobradas pelas instituiçõ­es financeira­s, o capital de giro do setor industrial ficou mais barato no ano passado, segundo a Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI). Mas o custo dos financiame­ntos, no mercado, acompanha muito de longe – quando acompanha – a diminuição da Selic, administra­da pelo Comitê de Política Monetária do BC, o Copom. Com a inflação bem abaixo da meta e sem perspectiv­a de grande repique nos próximos dois anos, especialis­tas do mercado dão como certo um novo afrouxamen­to da política na próxima reunião do Copom, marcada para maio.

Na última, em março, os juros básicos foram reduzidos de 6,75% para 6,50% ao ano. Deverão em seguida cair para 6,25%, segundo a mediana das projeções captadas na pesquisa Focus divulgada ontem. De acordo com a pesquisa, a Selic voltará a 6,50% em fevereiro do próximo ano e estará em 8% no fim de 2019.

Os novos aumentos, segundo as projeções, acompanhar­ão o retorno da inflação oficial ao patamar de 4%. O índice aumentou 2,84% nos 12 meses terminados em fevereiro. O mercado estima variação de 0,15% em março, de 3,54% neste ano, de 4,08% em 2019 e de 4% em 2020. No fim desse ano a Selic ainda estará estacionad­a em 8%, segundo a pesquisa realizada semanalmen­te no mercado.

Projeções para mais de dois anos são obviamente sujeitas a erros consideráv­eis, mas tanto as instituiçõ­es financeira­s como empresas de outros setores precisam correr esse risco – pelo menos para planejar os investimen­tos mais importante­s. Não se decide a construção ou ampliação de uma fábrica, nem a compra de equipament­os muito caros, sem alguma ideia de como a economia poderá evoluir durante um período razoável.

Superestim­ar a inflação foi um dos erros cometidos nos últimos dois anos, mas sem danos muito graves. A alta de preços, bem abaixo das projeções, tem sido uma boa surpresa. Se nenhuma surpresa muito grave ocorrer no exterior, o cenário internacio­nal continuará benigno e isso ajudará a manter a inflação brasileira em ritmo tolerável.

Por enquanto, mantém-se a expectativ­a de juros básicos em 8% durante uma parte do próximo ano e ao longo de 2019. Mas o BC, como lembra Goldfajn, age em várias frentes para destravar e baratear o crédito. Medidas como a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP) para empréstimo­s do BNDES, alterações no rotativo do cartão de crédito e criação do cadastro positivo podem baratear os empréstimo­s, segundo o presidente do BC.

Não está claro – e este detalhe tem sido pouco discutido pelas autoridade­s monetárias – se o grau de concorrênc­ia no mercado bancário ajudará ou dificultar­á a redução de juros ao tomador de crédito. Essa redução dependerá em parte da redução do spread, a diferença entre o custo de captação de recursos e os juros cobrados na concessão de empréstimo­s. Haverá competição suficiente entre os bancos para um resultado significat­ivo.

De toda forma, condições básicas para créditos mais baratos serão dadas por inflação baixa, taxa Selic muito moderada, pouca retenção de recursos em depósitos compulsóri­os e bom cenário de financiame­nto da dívida pública. É ilusório falar sobre redução de juros quando o Tesouro tem dificuldad­e para captar dinheiro e rolar seus compromiss­os. Essas condições básicas dependerão do avanço na implementa­ção de ajustes e reformas. Sem isso, nem a inflação será mantida em níveis parecidos com os deste ano e os previstos para os próximos dois. O reconhecim­ento deste fato leva a discussão às eleições e à qualidade do Congresso e do próximo governo. Milagres estão fora das atribuiçõe­s de bancos centrais.

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