O Estado de S. Paulo

Filme chileno ganha o Oscar da latinidade

‘Uma Mulher Fantástica’ saiu com sete prêmios Platino, inclusive o de melhor atriz para a trans Daniela Vega

- Rodrigo Fonseca/ MÉXICO

Apoiado num pleito político e moral contra as mais variadas formas de intolerânc­ia, com ênfase na transfobia, Uma Mulher Fantástica rendeu ao Chile os holofotes do “Oscar da Latinidade”, apelido dado ao troféu Platino, láurea criada há cinco anos como estímulo à integração continenta­l entre as Américas e seus antigos colonizado­res, os povos ibéricos. A premiação ocorreu no domingo, no complexo hoteleiro XCaret, em Playa Del Carmen, do lado de Cancún, no México. A produção chilena pilotada pelo cineasta Sebastián Lelio (de Gloria) saiu de lá com sete estatuetas: melhor filme, diretor, atriz (a trans Daniela Vega), roteiro, montagem, júri popular e melhor interpreta­ção feminina pelo voto do público. Desde sua primeira exibição internacio­nal, no Festival de Berlim de 2017, esse drama LGBT chegou a lugares onde muitos de seus hermanos hispânicos jamais foram: totaliza até agora 24 prêmios internacio­nais, entre eles o Oscar de Hollywood (de melhor filme estrangeir­o), e contabiliz­a uma bilheteria estimada em US$ 4 milhões – uma fortuna para um título não americano.

“Venho de uma geração que recomeçou o cinema chileno, destruído pelo jugo da ditadura. Antes dela, nos anos 1960, vivemos um momento de euforia criativa, com mestres na ativa. Mas nos sobrou só a memória deles, o que nos deixou com fome criar”, disse Lelio ao Estadão, comemorand­o também as críticas elogiosas que recebeu no fim de semana nos EUA, ao lançar por lá uma produção em língua inglesa: Disobedien­ce, sobre um caso de amor entre duas mulheres (Rachel Weisz e Rachel McAdams) numa comunidade judaica ortodoxa. “Foi um começo bonito lá e uma continuida­de feliz aqui”.

Teve mais uma surpresa para os chilenos na entrega do prêmio de melhor ator: Alfredo Castro (em cartaz no Brasil

com Severina) foi laureado por seu desempenho em Los Perros, num papel que evoca traumas deixados por Pinochet. O anúncio do nome de Castro (figura de prestígio no audiovisua­l hispano-americano) foi celebrado com ovações na festa do Platino. O mestre de cerimônias do evento foi o ator e diretor mexicano Eugenio Derbez, que há cinco anos fez 15 milhões de conterrâne­os seus pagarem ingresso para rir com Não Aceitamos Devoluções (2013), em refilmagem agora no Brasil com Leandro Hassum. Coube a ele anunciar a homenagem de honra à atriz Adriana Barraza (também do México) e convocar as atrações musicais da cerimônia, que rendeu três troféus à coprodução Argentina-Brasil-Espanha, Zama, de Lucrecia Martel. Este épico intimista sobre a corrupção nas colônias espanholas venceu nas categorias som, fotografia (dada ao português Rui Poças) e direção de arte, confiado à pernambuca­na Renata Pinheiro, que deu um grito de “Lula livre!” ao fechar seu discurso de agradecime­nto. O tom político só aqueceu a celebração de estéticas latinas.

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