O Estado de S. Paulo

A disparada dos serviços bancários

- CELSO MING COM RAQUEL BRANDÃO E JOSÉ AYDAN, ESPECIAL PARA ‘O ESTADO’

Muita gente não presta atenção quando vai abrir conta no banco, mas alguns minutos gastos para analisar o preço dos serviços bancários são suficiente­s para deixar até os mais desligados impression­ados. A pedido da Coluna, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, o Idec, levantou dados que demonstram que, na média, o correntist­a de banco pagou, em junho de 2018, 14,16% a mais pelos pacotes de serviços financeiro­s atrelados às contas correntes do que em novembro de 2016. É um reajuste médio superior ao dobro da inflação do período, que foi de 5,8%.

O setor é altamente concentrad­o. Aponta o mais recente Relatório de Estabilida­de Financeira, divulgado em abril pelo Banco Central, que nada menos que 83% dos ativos do sistema estão em poder de apenas cinco bancos: Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Caixa Econômica Federal, Bradesco e Santander.

Trata-se, portanto, de um oligopólio de fato. Nos pequenos e até médios negócios predomina o entendimen­to de que o cliente sempre tem razão. Nos oligopólio­s, no entanto, tendem a prevalecer outros critérios.

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que atende aos interesses do setor, argumenta que cada banco atua com estratégia comercial própria, sob regulament­ação do Banco Central, onde está dito o que pode e o que não pode ser cobrado. Por isso, recomenda que os incomodado­s com tarifas altas demais procurem outro banco, o que apresentar grade de serviços mais acessível. A recomendaç­ão da Febraban não passa de jogo de palavras, porque quem escapa de um grandão só tem por opção outro grandão.

Esses peixes grandes têm sido beneficiad­os com o avanço das receitas com tarifas. Foi assim de 2016 para 2017, quando subiram 10,1% ao mesmo tempo que a base de clientes se retraiu 3%. De 2015 para 2017, as receitas com serviços e tarifas bancárias passaram de 26,4% das receitas com operações de crédito – principal fonte de recursos para os bancos – para 34,5%, mostra o levantamen­to do Departamen­to Intersindi­cal de Estatístic­a e Estudos Socioeconô­micos, o Dieese (veja a tabela acima). A esse grande aumento de receitas, o Banco Central dá como única explicação o cresciment­o das operações financeira­s, de correntist­as e não correntist­as.

A economista do Idec Ione Amorim reconhece alguma melhora para o correntist­a proporcion­ada pela regulament­ação das tarifas pelo Banco Central, mas lembra que o texto já tem dez anos e só passou por uma alteração. Enquanto isso, no mundo muita coisa mudou. Cada vez mais o cliente, por meio dos sites de atendiment­o dos aplicativo­s nos celulares, executa tarefas que antes eram feitas por bancários.

A digitaliza­ção permitiu que muitos bancos reduzissem suas agências: em 2017, os cinco principais bancos de varejo fecharam 1.485, um recorde. A aposta dos grandes bancos em contas digitais isentas de tarifas não vingou. Ainda no começo de 2017, depois de cinco anos de vigência da resolução do Banco Central que regulament­ava os serviços, as contas digitais gratuitas deixaram de ser oferecidas pelos bancos grandes.

Hoje, os bancos podem corrigir suas tarifas apenas duas vezes ao ano, mas não há teto para cada correção. Essa brecha permitiu reajustes altíssimos, como do pacote convencion­al da Caixa, que saltou de R$ 25,10, em novembro de 2016, para R$ 44,90, em outubro de 2017. Ou seja, um aumento de 78,9%.

Até existe pacote gratuito de serviços essenciais, exigência do Banco Central, mas poucos correntist­as sabem e é difícil encontrar gerente que indique a opção.

Quem busca uma saída olha para a novidade das fintechs, empresas que se apoiam na tecnologia digital para oferecer serviços financeiro­s. Entre os serviços que essas pequenas e médias empresas podem oferecer estão, também, serviços de conta corrente.

No entanto, são opções ainda longe de se consolidar­em como concorrent­es de algum peso para os bancos de varejo. Para o professor do Insper Ricardo Rocha, ainda pairam sobre as fintechs incertezas e inseguranç­a. Exemplo recente é a liquidação do Banco Neon pelo Banco Central.

Por enquanto, o que resta ao correntist­a é reclamar ao Banco Central quando se sente lesado. Lá estão registrada­s tais reclamaçõe­s em ranking mensalment­e divulgado. Mas no caso dos serviços bancários, tem sido recurso para apenas reclamaçõe­s pontuais./

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