O Estado de S. Paulo

Marchionne deixa uma grande lacuna na Fiat

Morte de executivo, ontem, deixa a pergunta: está o substituto Mike Manley à altura do desafio?

- TRADUÇÃO DE CLÁUDIA BOZZO /

Adúvida sobre quem substituir­ia Sergio Marchionne estava no ar havia mais de um ano, desde que o principal executivo da Fiat Chrysler Automobile­s (FCA) anunciou que deixaria o cargo em 2019. Mas a forma como chegou a resposta foi chocante e triste. A morte de Marchionne, aos 66 anos, foi confirmada ontem, resultado de complicaçõ­es após uma cirurgia. O estado crítico de saúde do executivo havia levado a Fiat a anunciar, no último sábado, Mike Manley, chefe da Jeep e da Ram, como o novo líder do grupo.

Manley teve pouco tempo para se preparar. Ontem, ele abriu a apresentaç­ão dos resultados do segundo trimestre da FCA com uma homenagem ao antecessor, um “homem especial e único”. Embora tivesse de explicar a queda na receita e lucros e uma redução nas previsões para 2018, Manley pôde confirmar que a empresa estava finalmente livre de dívidas, uma das principais metas de Marchionne. O ex-CEO conseguiu se livrar de uma pilha de US$ 13 bilhões em débitos.

Marchionne é considerad­o uma das maiores estrelas de todos os tempos na indústria automobilí­stica, tendo resgatado a Fiat da quase falência em 2004 e repetido o truque na Chrysler, em 2009. Trabalhand­o duro até para os padrões de altos executivos, ele alegou que seu traje habitual, um suéter preto, o poupava de perder tempo escolhendo um terno. Ele podia ser brusco, mas também era erudito e franco em uma época em que os chefes se tornaram cada vez mais cautelosos.

A formação de contador o ajudou a ter uma visão clara sobre as deficiênci­as da empresa. Por isso, ele propôs megafusões para dividir custos. Outros executivos de indústrias automobilí­sticas compartilh­avam de seu diagnóstic­o, mas preferiram alianças vagas, que geram economias, mas não na escala de uma fusão. Marchionne foi um dos poucos que conseguira­m êxito ao unir gigantes. E estava sempre à procura de oportunida­des – alguns analistas sugeriram que ele estaria elaborando uma última grande transação antes de morrer.

Qualquer negócio desse tipo será agora com Manley. A FCA sempre prometeu que o sucessor de Marchionne viria de dentro. Manley, britânico e ex-vendedor de carros, subiu na empresa chegando a liderar a divisão Jeep. Esteve fortemente envolvido no mais recente plano de cinco anos, que fala em grandes saltos em vendas e lucrativid­ade.

Manley não terá tarefa tão difícil quanto a de Marchionne. Além de cortar gastos e unir Fiat e Chrysler, o executivo morto ontem desmembrou empresas como a CNH, o braço industrial da Fiat, e a Ferrari, fabricante de carros esportivos. E preparava o negócio de peças da empresa, para uma vida própria. Além disso, investiu em SUVs populares e lucrativos nos EUA antes da Ford e da General Motors. E redirecion­ou fábricas na Itália para marcas premium como Alfa Romeo e Maserati.

Isso não significa que o trabalho de Manley será fácil. O plano de cinco anos prevê a venda de mais caminhonet­es Jeep e Ram, que já geram dois terços das receitas. Manley também terá de lidar com a ameaça de uma guerra comercial, a emergência dos carros elétricos, veículos autônomos e dos serviços de mobilidade. Fará isso sem ajuda de Alfredo Altavilla, executivo rival na disputa pelo cargo de Marchionne, que deixou a FCA na segunda-feira.

A escolha de Manley foi decisão de John Elkann, presidente da Exor, holding a família Agnelli, controlado­ra do grupo. Agora, terão de enfrentar os novos desafios de mercado enquanto a concorrênc­ia para a Fiat – hoje a sétima montadora do mundo – não para de crescer. O feito de Marchionne é que ele construiu um grupo que, por enquanto, é forte para se manter sozinho, caso seja necessário.

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LAURA MCDERMOTT / THE NEW YORK TIMES – 21/7/2018 Gestão. Marchionne se livrou de US$ 13 bi em dívidas

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