‘Alguma Coisa Assim’, um retrato de juventude
Filme aborda o desenvolvimento de dois personagens ao longo de dez anos, indo da São Paulo boêmia a Berlim, onde eles passam a viver
Alguma Coisa Assim, de Esmir Filho e Mariana Bastos, tem sido chamado de “Boyhood” brasileiro. De fato, guarda alguma semelhança com o filme de Richard Linklater que acompanha o garoto Mason ao longo de 12 anos. Aqui, trata-se da amizade entre dois jovens em três etapas de suas vidas, cobrindo 10 anos. É montado no aproveitamento de materiais anteriores, dois curtas com os mesmos personagens. A estes, os diretores ajuntaram outro, contemporâneo, fundindo os três.
Os personagens são Caio (André Antunes) e Mari (Caroline Abras). Eles começam por descobrir juntos a noite paulistana (e a si mesmos) e terminam por se reencontrar, anos depois, em Berlim. Lá, Mari trabalha numa empresa corretora de imóveis. Caio chega para desenvolver uma pesquisa universitária em biologia e passam a dividir o teto. Aliás, tetos, pois Mari, sem o conhecimento da chefe, habita as casas que estão sendo postas à venda ou para alugar. O filme tem ar descolado e vai muito além de ser um lego de curtas – a responsável pela articulação dos episódios é a montadora Caroline Leone, que por esse trabalho ganhou o Troféu Redentor no Festival do Rio.
Em tom naturalista, Alguma Coisa Assim traça um perfil rápido de uma determinada faixa da juventude, das baladas no Baixo Augusta aos desafios da vida adulta. Tem encanto, e sua espontaneidade aproxima personagens e espectadores. Sente-se mais o frescor da narrativa que tropeções inerentes a um projeto desenvolvido ao longo dos anos e com pegada de work in progress.
Essa narrativa ágil, sem condescendência com o melodrama apesar da gravidade de algumas situações abordadas, desperta emoção com seu despojamento. Retratos de juventude desse tipo são em geral comoventes. Jogam com a passagem do tempo, esse veneno ácido, implacável para todos. Mesmo com as cidades, pois a São Paulo boêmia e suas transformações não ficam de fora do retrato. A cidade, mais que moldura, é personagem.