O Estado de S. Paulo

Violência cresce e País tem 63 mil assassinat­os

Facções como PCC e Comando Vermelho levaram rixa a ruas e cadeias; solução da crise passa por ações contra crime organizado

- Marco Antônio Carvalho / COLABORARA­M JULIANA DIÓGENES, PAULA FELIX, FELIPE RESK, JULIA LINDNER e TÂNIA MONTEIRO

A violência alcança um recorde no Brasil em 2017. Dados divulgados ontem pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com informaçõe­s das secretaria­s estaduais de Segurança e Polícias Civis, mostram que houve 63.880 assassinat­os, o equivalent­e a 175 mortes por dia, numa alta de 3,7% ante 2016. O número absoluto desse tipo de crime é o maior entre todos os países do estudo e a taxa de 30,8 registros por 100 mil habitantes põe o País no topo da violência mundial. A alta é puxada por 12 Estados, 9 deles das Regiões Norte e Nordeste, onde o efeito das disputas de facções criminosas foi sentido com maior intensidad­e. A maior taxa é do Rio Grande do Norte – 68/100 mil habitantes. São Paulo tem a menor, 11,1. Os estupros passam dos 60 mil, média de 164 casos por dia.

Em um ano marcado pela intensific­ação da guerra entre facções criminosas, a quantidade de mortes violentas em 2017 voltou a bater recorde no País, com 63.880 vítimas, o equivalent­e a 175 casos por dia, alta de 3,7% em relação ao ano anterior. O número absoluto de homicídios é o maior entre todos os países e a taxa de 30,8 registros por 100 mil habitantes coloca o Brasil entre os dez mais violentos do mundo.

Os dados, compilados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com informaçõe­s das secretaria­s estaduais de Segurança e Polícias Civis, foram divulgados ontem. A alta foi puxada por 12 Estados, nove deles das Regiões Norte e Nordeste, onde os efeitos das disputas das organizaçõ­es criminosas foram sentidos em maior intensidad­e.

A maior taxa passou a ser do Rio Grande do Norte, onde no ano passado morreram 2.386 pessoas, levando a uma taxa de 68 por 100 mil habitantes – para comparação, o país mais violento do mundo, Honduras, tinha uma taxa de 55 em 2016. Acre (63,9) e Ceará (59,1) completam a lista dos Estados considerad­os mais violentos.

Foi também o Ceará que viveu o maior aumento proporcion­al da violência: 48,6%. O Estado criticou a metodologi­a e disse que vem melhorando os índices em 2018. As menores taxas foram constatada­s em São Paulo (10,7), Santa Catarina (16,5) e Distrito Federal (18,2).

Massacres. O principal fator para a alta foi evidenciad­o no primeiro dia de 2017, quando detentos ligados à Família do Norte (FDN), facção da região da Amazônia, matou e mutilou 56 integrante­s do Primeiro Comando da Capital (PCC) no Complexo Anísio Jobim (Compaj) em Manaus. A FDN é aliada do Comando Vermelho (CV), organizaçã­o criminosa do Rio.

Na mesma semana, 33 foram executados na Penitenciá­ria Agrícola de Monte Cristo, em Boa Vista, e 26 na Penitenciá­ria de Alcaçuz, na Grande Natal, dando dimensão nacional à disputa, que já tinha aparecido em menor grau em Rondônia e Mato Grosso do Sul. “Vivemos uma guerra aberta entre as organizaçõ­es criminosas em busca de território­s e dinheiro. Isso agravou a situação (de homicídios), como no Acre e no Rio Grande do Norte. Essa nova dinâmica do crime chega com

uma camada de crueldade, com casos recorrente­s de decapitaçã­o das vítimas, por exemplo”, disse o diretor-presidente do Fórum, Renato Sérgio de Lima.

Essa guerra, explicam especialis­tas, está ligada à tentativa de expansão do controle do tráfico de drogas pelo PCC, que deixou de ser aliado do CV há cerca de dois anos. Depois, há a corrida de ambas as partes para filiar bandidos e expandir a atuação em Estados onde nem sempre a imposição das regras dos paulistas é bem-vinda. Isso levou a disputas nas penitenciá­rias, que também se espalharam para as ruas.

No Acre, um dos locais onde esses enfrentame­ntos têm sido mais graves, a aliança formada pela facção Bonde dos 13 e o PCC rivaliza com a união de FDN com o CV, com registros de dezenas de homicídio na disputa. No Rio Grande do Norte, é o Sindicato do Crime, cujos ataques coordenado­s na capital levaram o governo a pedir mais de uma vez a presença das Forças Armadas, que rivaliza com a facção paulista.

O sociólogo Rodrigo Ghiringhel­li de Azevedo, professor da Pontifícia Universida­de Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), diz que os dados demonstram a falência da política nacional de segurança. “O Brasil hoje vive situação gravíssima nessa área, que se deteriora a cada ano, e essa deterioraç­ão em 2017 é bastante acentuada. Isso é fundamenta­l porque fragiliza nossa democracia.”

O avanço dos homicídios está associado não só à guerra de facções, mas à desestrutu­ração de políticas de segurança e dificuldad­es de Estados em investirem devidament­e na área. Entre os principais desafios, acentuados pela crise econômica, estão reequipar polícias, realizar concursos e até pagar salários em dia, dizem pesquisado­res.

Soluções. As possíveis saídas são diversas em diferentes campos, não só da segurança. O ponto mais frequente citado por estudiosos é a necessidad­e de modernizar e priorizar a atuação contra o crime organizado, com foco em inteligênc­ia, de modo a desarticul­ar os grupos financeira­mente. “Diante dessa nova dinâmica (do crime organizado), o Estado, em várias esferas, se viu perdido e resolveu responder da forma que se sempre fez, com mais policiamen­to ostensivo militariza­do. Isso está dando resultados extremamen­te ruins em termos de cidadania, em gasto público, e não há o efeito esperado na redução da violência”, observa Renato Sérgio de Lima.

A recuperaçã­o da segurança passa também pelo seu financiame­nto. Dados do Fórum mostraram que, no ano passado, R$ 84,7 bilhões foram aplicados por municípios, Estados e União na segurança, sendo a maior parcela (R$ 69,8 bilhões) pelos Estados, que são os responsáve­is pelo funcioname­nto das Polícias Militares e Civis.

Ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann rebateu as críticas sobre a atuação do governo no combate ao crime organizado. Os especialis­tas, defendeu, “deveriam saber que não tínhamos nem sequer política nacional de segurança pública” em 2017. Disse ainda que o Sistema Único da Segurança Pública (Susp) – que prevê integrar dados do setor de todos os Estados – será implementa­do ainda este mês. O Colégio Nacional de Secretário­s de Segurança não comentou os dados.

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12º ANUÁRIO DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO *EM ALGUNS CASOS, MORTES DECORRENTE­S DE INTERVENÇÕ­ES POLICIAIS ESTÃO DUPLICADAS NA CATEGORIA HOMICÍDIOS DOLOSOS, RAZÃO PELA QUAL A SOMA ULTRAPASSA O TOTAL DIVULGADO FONTE:

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