O Estado de S. Paulo

Por que Geraldo Alckmin

Ele tem condições para liderar o esforço para recolocar o País nos trilhos e fazê-lo avançar

- •✽ SERGIO FAUSTO ✽ SUPERINTEN­DENTE EXECUTIVO DA FUNDAÇÃO FHC. COLABORADO­R DO LATIN AMERICAN PROGRAM DO BAKER INSTITUTE OF PUBLIC POLICY DA RICE UNIVERSITY, É MEMBRO DO GACINT-USP

Com as convenções partidária­s, encerrou-se a etapa preliminar das eleições de outubro. Os candidatos à Presidênci­a estão definidos e seus vices, escolhidos. A exceção é o candidato do PT, que servirá de espelho fictício à imagem de Lula.

Para quem não quer se submeter à lógica dualista do petismo vs. antipetism­o bolsonaris­ta, apresentam-se três hipóteses plausíveis entres os presidenci­áveis: Geraldo Alckmin, Marina Silva e Ciro Gomes. Quero, aqui, explicar por que Geraldo Alckmin me parece a melhor opção, seguido de Marina Silva.

Ciro impression­a pela articulaçã­o verbal e pela capacidade de expor suas ideias. Pena que estas, além de variarem muito ao longo do tempo, assim como suas filiações partidária­s, hoje paguem tributo a um nacionalis­mo-estatista fora do tempo e do espaço e a um plebiscita­rismo perigoso para a democracia representa­tiva. Pena, também, que sua eloquência repetidame­nte se perca na ofensa e no destempero.

Díspares em muitos aspectos, Geraldo e Marina compartilh­am caracterís­ticas que têm escasseado no Brasil: serenidade, disposição ao diálogo e recusa à demagogia. Num país em que a retórica do nós contra eles se disseminou impulsiona­da pela esquerda e pela direita e o argumento racional perdeu espaço no debate público, essas qualidades individuai­s, em si mesmas, não são pouca coisa.

As chapas Alckmin/Ana Amélia e Marina/Eduardo Jorge, com candidatos a presidente e vice à altura dos respectivo­s cargos, oferecem ao eleitorado duas alternativ­as qualificad­as. Esta última é em princípio mais transforma­dora do que a primeira, por incorporar com maior ênfase os temas do século 21, a começar pela sustentabi­lidade ambiental, por não nascer vinculada a forças tradiciona­is do sistema político e por ser encabeçada por uma mulher de extraordin­ária biografia.

Se assim é, então por que Geraldo Alckmin? Em breves palavras, porque ele reúne as melhores condições para liderar o imenso esforço necessário para recolocar o País nos trilhos e fazê-lo avançar. Tem de longe a melhor e mais experiment­ada equipe de assessores econômicos (a de Marina é composta por brilhantes intelectua­is e acadêmicos, o que é coisa muito diferente). Além disso, está em condições de manter, pelo tempo que seja convenient­e e necessário, quadros do atual governo que estão realizando um excepciona­l trabalho de reconstruç­ão na área econômica à frente do Banco Central e do Ministério da Fazenda.

Dispõe de um programa de governo com uma agenda amadurecid­a de reformas que vão à raiz dos problemas que impedem o cresciment­o sustentado do País (protecioni­smo, baixa produtivid­ade, alto custo Brasil, etc.). Tal agenda encontra respaldo na sua gestão como governador de São Paulo, onde se destacou pelo equilíbrio das contas, preservaçã­o do investimen­to público, promoção de parcerias com a iniciativa privada na área de infraestru­tura e com o terceiro setor na área social, sem descumprim­ento de contratos ou de obrigações constituci­onais em educação e saúde. Em condições muito adversas em seu último mandato, manteve o governo paulista superavitá­rio e investindo, apesar da significat­iva queda da arrecadaçã­o, caso único entre os maiores Estados da Federação.

Seu programa expressa, ainda, o conhecimen­to técnico e a experiênci­a acumulada na área de segurança pública, com uma bem definida atribuição de papel ao governo federal na coordenaçã­o do combate ao crime organizado, sem recorrer a pseudosolu­ções que, a pretexto de assegurar a autodefesa dos cidadãos, aumentaria­m os já intoleráve­is níveis de violência na sociedade brasileira.

Sei que a esta altura o leitor deve estar se perguntand­o se a aliança com o centrão é compatível com a agenda de reformas que Alckmin apresenta ao País. Eis o paradoxo: para fazer reformas “modernizad­oras”, que exigem a aprovação de emendas constituci­onais e leis complement­ares, é preciso buscar apoio em partidos que são percebidos, e em boa medida o são, representa­ntes do “atraso” patrimonia­lista e clientelis­ta. A necessidad­e desse apoio seria menor se as forças ditas “progressis­tas” não fossem “atrasadas” também, visto que em geral defensoras do corporativ­ismo e do dirigismo estatal.

Geraldo Alckmin decidiu buscar esse apoio antes das eleições. Marina Silva, se eleita, terá de conquistá-lo depois. O dilema, porém, é inescapáve­l. Podese argumentar que um(a) presidente que se eleja sem o apoio das forças do “atraso” esteja em melhores condições para negociar com o Congresso uma vez eleito(a). É possível, mas terá de incorporá-las a seu governo. Se não o fizer, o sonho de um governo dos “melhores” (ilusão que Marina vende ao eleitorado) logo se transforma­rá no pesadelo de um governo inoperante, incapaz de produzir mudanças. No mundo real, a questão é sempre os termos da barganha com as forças do “atraso” (o quanto e onde se cede em troca de quê), equação na qual o capital político do(a) presidente tem peso determinan­te. Este é alto ao início do mandato e precisa ser renovado constantem­ente se o(a) presidente quiser manter a direção política do seu bloco de apoio.

Estou convencido de que Alckmin está em melhores condições para realizar com sucesso esse desafiante exercício. É um político de mãos limpas e pés no chão, que já formou e governou amplas coalizões à frente do maior Estado da Federação, experiênci­a que lhe dá a têmpera e tarimba necessária­s para ser chefe de Estado, chefe de governo e chefe da administra­ção federal.

Ele só não pode esquecer que na campanha, assim como no governo, a aliança principal é com as forças sociais que desejam para o Brasil uma sociedade aberta e ambientalm­ente responsáve­l, uma economia de mercado criativa e próspera e um Estado republican­o capaz de contribuir decisivame­nte para que todas as pessoas tenham igualdades reais de oportunida­de e garantias razoáveis de uma vida digna.

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