O Estado de S. Paulo

Ruralistas mudam MP e benesse de R$ 17 bi retorna

Farra fiscal. Parlamenta­res desfiguram Medida Provisória do governo que restringia o refinancia­mento de dívida de produtores rurais e previa impacto de R$ 1,6 bilhão aos cofres públicos; não há previsão no Orçamento para bancar as mudanças propostas

- Idiana Tomazelli/ BRASÍLIA

Em articulaçã­o rápida, a bancada ruralista no Congresso mudou medida provisória do governo e restabelec­eu renegociaç­ões de refinancia­mento de dívidas do setor que podem custar R$ 17 bilhões aos cofres públicos. A área econômica havia reduzido o alcance e o custo da MP para R$ 1,6 bilhão. O novo texto, porém, restituiu todos os pontos vetados pelo governo e ampliou os benefícios.

Enquanto as atenções estavam voltadas para a proposta de reajuste dos ministros do STF, a bancada ruralista fez uma manobra no Congresso para ressuscita­r um perdão de dívidas de R$ 17 bilhões que já havia sido negado pelo governo. Sem espaço fiscal no Orçamento para bancar um programa como esse, a equipe econômica já tinha reduzido o custo da renegociaç­ão de débitos dos produtores rurais para R$ 1,6 bilhão.

Isso foi feito em junho por meio da Medida Provisória 842, cujo relatório foi apresentad­o anteontem pelo senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) menos de três horas depois da instalação da comissão mista que vai analisar a proposta. O texto “relâmpago” não só restituiu todas as renegociaç­ões que o Congresso já havia tentado emplacar antes (e que acabaram vetadas pelo presidente Michel Temer) como também prevê a extensão de alguns benefícios a dívidas que deixem de ser pagas até 31 de dezembro de 2018.

Esse trecho foi considerad­o “absurdo” por fontes da área econômica por ser um “convite” à inadimplên­cia. Ou seja, o devedor poderá se programar para não pagar e depois renegociar­á o contrato.

Os descontos dessas renegociaç­ões, que podem chegar a 95%, precisam ser bancados pelo Tesouro Nacional, mas não há previsão no Orçamento para isso – o que levou o governo a vetar o texto que permitia o refinancia­mento irrestrito de dívidas por produtores de todo o País, e editou a MP 842, para restringir os beneficiad­os. O texto limitava a renegociaç­ão das dívidas somente aos pequenos agricultor­es do Pronaf (Programa Nacional de Agricultur­a Familiar) do Norte e Nordeste.

Segundo apurou a reportagem, a área econômica vai recomendar novamente o veto da medida, caso o Congresso insista em aprovar um programa

que não cabe no Orçamento.

Bezerra afirmou que o espírito do relatório é retomar o que foi aprovado no Congresso após amplo acordo entre as lideranças. Ele criticou o governo por editar uma MP desconside­rando os interesses do Legislativ­o,

que apoiou a medida duas vezes – na aprovação dela e, depois, na derrubada do veto. Mesmo assim, deixou a porta aberta para um acerto com o Ministério da Fazenda. “Vai se tentar um acordo até segunda ou terça. Se for possível, vamos construir esse entendimen­to.”

Interesses. O relator alertou, no entanto, que os parlamenta­res não ficarão na dependênci­a desse acordo para levar a medida adiante. “Se não tiver espaço para acerto, o Congresso vai exercer sua prerrogati­va e aprovar medida que considere razoável e que atenda aos produtores.”

Na primeira investida, como revelou o Estadão/Broadcast, o Ministério da Fazenda enviou comunicado aos bancos públicos proibindo a renegociaç­ão das dívidas, pois o Tesouro não tinha dinheiro para repassar às instituiçõ­es – ou seja, elas poderiam ficar no prejuízo se avançassem com os refinancia­mentos. Essa será a mesma estratégia caso o Congresso insista na aprovação de um programa de renegociaç­ão. Se cair o veto, o Tesouro não vai executar por falta de Orçamento.

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