O Estado de S. Paulo

Fragmentad­as, campanhas preferem preservar ‘convertido­s’

- Alessandra Monnerat Caio Sartori

Para o cientista político Glauco Peres, da USP, a fragmentaç­ão das candidatur­as faz com que as campanhas deem prioridade a preservar o eleitorado mais convertido, evitando avançar com tanta avidez nas parcelas da população em que são mais desconheci­dos ou rejeitados. “É muito custoso avançar (em outras parcelas) e ter o risco de perder o seu eleitorado. Tem sido uma estratégia conservado­ra nas duas lógicas: de não avançar e de não perder o seu”, disse. Segundo ele, o candidato Jair Bolsonaro (PSL) é quem aplica esse artifício com mais clareza.

Segundo Peres, que vê a possibilid­ade de um candidato ir ao segundo turno com votação entre 15% e 20%, o tempo curto de campanha reforça essa lógica. “Se tivesse mais tempo, seria muito arriscado ficar parado. O ideal seria ir angariando mais votos aos poucos, pelas bordas.”

A diminuição de recursos financeiro­s, com a proibição da doação empresaria­l, é outro fator responsáve­l por evitar deslocamen­tos que podem se mostrar inúteis. Bolsonaro, por exemplo, é de um partido nanico, que não tem uma máquina consolidad­a nos Estados e municípios Brasil afora. “Ele vai lá (a cidades em que não tem muitos votos) fazer o quê? Não dá para ir a furadas. É uma eleição de muito cuidado”, afirmou Peres.

Por outro lado, quem está em situação delicada é Geraldo Alckmin (PSDB). Para chegar ao segundo turno, o candidato que mais tem tempo de TV no horário eleitoral gratuito se vê obrigado a tirar votos de Bolsonaro, que tem sido uma pedra no sapato do tucano até em São Paulo, Estado que governou

“É muito custoso avançar (em outras parcelas do eleitorado) e ter o risco de perder o seu eleitorado.” Glauco Peres CIENTISTA POLÍTICO

por quatro vezes e é o principal reduto político da legenda. “Alckmin precisa ser muito mais incisivo contra o Bolsonaro. Está perdendo voto para ele e precisa reverter isso muito rápido”, avaliou Peres.

No entanto, a estratégia de pregar para convertido­s tem seus riscos. Ao avançar para o segundo turno, o candidato precisa moderar o discurso a fim de atrair os eleitores “mais difíceis”, avaliou o cientista político Cláudio Couto, da FGV-SP. “Existem momentos para cada coisa: o foco prioritári­o nesse momento do primeiro turno pode ser os eleitores ‘garantidos’”, disse Couto, lembrando que a opção de Alckmin pela gaúcha Ana Amélia (PP-RS) como vice foi certeira ao focar no Sul, onde tem grandes chances de angariar votos na campanha.

Couto vê a necessidad­e de Bolsonaro investir no eleitorado feminino, considerad­o pelo professor questão indispensá­vel. “O desprestíg­io do Alckmin no Nordeste não é comparável ao desprestíg­io do Bolsonaro com as mulheres, que é muito ligado às posições históricas que ele já tomou, de discurso”, disse. “O candidato não pode priorizar o eleitorado mais difícil, mas também não pode abandonar esse eleitorado. O ponto é saber dosar isso, modular o discurso.”

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