O Estado de S. Paulo

Terras raras e outras raridades

- CELSO MING E-MAIL: CELSO.MING@ESTADAO.COM

Agora não há mais, como antigament­e, corridas ao ouro, à prata e às esmeraldas. Hoje são por outras preciosida­des e já não se fazem por meio de aventureir­os ou por garimpeiro­s sedentos por pepitas reluzentes.

Um texto publicado no site do Fórum Econômico Mundial em agosto lista novas riquezas que estão despertand­o a cobiça das empresas de mineração: terras raras (conjunto de 17 elementos químicos com caracterís­ticas similares e funções variadas) e outros metais cujos nomes se aprendem nas aulas de química, como gálio, índio, cobalto e tungstênio. Essa lista poderia ser completada com nióbio (aquele do antigo bordão do Enéas), vanádio, lítio e quartzo.

Esses materiais e ligas especiais estão em alta por causa dos produtos da hora, como novos tipos de bateria, smartphone­s, chips, semicondut­ores e painéis solares. Para a produção de apenas um smartphone podem concorrer mais de 40 elementos químicos. Há lítio e cobalto na bateria, gálio na tela de led, elementos de terras raras nos microfones e saídas de som.

E a expectativ­a de uso desses materiais aumenta exponencia­lmente à medida que o mercado aposta em novas tecnologia­s. Hoje, quem utiliza celulares, tablets e computador­es pode estar consumindo cerca de 200 gramas de cobalto. Para cada carro elétrico são necessário­s pouco mais do que 10 kg de cobalto. As estimativa­s da Agência Internacio­nal de Energia são de que pelo menos 220 milhões de veículos elétricos serão produzidos até 2030.

A procura por esses materiais pode ser atestada por quem acompanha a dança das cotações. Um quilo de cobalto em 2015 era negociado por 15 libras esterlinas, agora vale coisa de 70 libras. A cotação do gálio, associado à produção do alumínio, dobrou em pouco mais de dois anos e hoje oscila em torno das 315 libras esterlinas por quilo.

A atividade mineral no País equivale a 16,7% do PIB industrial e a 30% do saldo da balança comercial do Brasil em 2017. A força da nova demanda deve puxar para cima esses números. O Brasil fornece mais de 90% do nióbio consumido no mundo. Por ser resistente à corrosão e a altíssimas temperatur­as, compõe ligas de aços especiais. Estudos da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), empresa do governo vinculada ao Ministério de Minas e Energia, calculam que as reservas brasileira­s de lítio, que hoje não passam de 0,33% das existentes no mundo, podem chegar a 8% já em 2019. E a nova demanda por cobalto levou a Vale a desistir da venda de certos ativos. O presidente da companhia, Fábio Schvartsma­n, anunciou investimen­tos de US$ 8 bilhões a serem realizados em 2019 e 2020 em minas no Pará e no exterior. A Horizonte Minerals, por sua vez, passou a revisar estudos da década passada com o objetivo de desenvolve­r as minas de níquel Araguaia e Vermelho.

Embora tenha grande potencial, o Brasil enfrenta dificuldad­es para produzir outros materiais com demanda crescente. Ex-presidente do Instituto de Pesquisas Tecnológic­as (IPT), o professor da Escola Politécnic­a da USP Fernando Landgraf se especializ­ou no estudo das terras raras. O Brasil detém a segunda maior reserva desse tipo, mas enfrenta a forte concorrênc­ia da China, responsáve­l por cerca de 95% da produção global. “É difícil vencer essa barreira e encontrar investimen­tos para a produção nacional em escala competitiv­a.”

As reservas de quartzo do Brasil, por sua vez, são as maiores do mundo. Cerca de 300 mil toneladas são exportadas anualmente. No entanto, produtos de maior valor agregado como o silício eletrônico, produzido com esse mesmo quartzo e usado na produção de painéis fotovoltai­cos e em semicondut­ores de energia, são feitos lá fora e importados pelo Brasil. “Poderíamos até conseguir capital para desenvolve­r a cadeia produtiva por aqui, mas esbarramos na complexida­de das leis brasileira­s e na pesada carga tributária”, observa o ex-superinten­dente de energias renováveis de Itaipu Cícero Bley Jr. Em consequênc­ia da alta carga tributária incidente sobre o preço da energia elétrica, por exemplo, ficam prejudicad­as não só a produção de alumínio, como, também, de lítio.

A listagem dos obstáculos à produção desses materiais no Brasil não caberia neste espaço. Mas o fato prepondera­nte é o de que a demanda mundial vai disparar. Deixar que tal riqueza siga enterrada é desprezar mais uma enorme oportunida­de histórica.

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