Governo avalia uso de senhas na fronteira.
Sistema visaria a ‘aprimorar atendimento humanitário’ de venezuelanos. Temer chegou a falar em limitar entradas, o que foi negado depois
A ampliação do número de soldados para fiscalizar a linha de fronteira com a Venezuela e com a Guiana, além do patrulhamento em estradas federais, será o efeito prático imediato da decretação da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) pelo presidente Michel Temer em Roraima. O decreto foi publicado ontem no Diário Oficial da União e autoriza o uso das Forças Armadas até o dia 12 de setembro. Esses militares – a maioria já espalhada pelos oito pelotões de fronteira – também vão ajudar na catalogação e registro de entrada de venezuelanos.
Pela manhã, em entrevista a uma rádio, Temer disse que o governo federal poderia instituir um sistema de senhas para limitar a entrada de venezuelanos. “Outra providência que talvez venha a ser tomada, e ontem (anteontem) foi objeto de conversações, é que entram de 600 a 700 (venezuelanos) por dia e isso está criando problemas até para vacinação, organização. Eles pensam em colocar senhas de maneira que entrem 100, 150, 200 por dia”, disse.
A declaração, contrária ao discurso do Palácio do Planalto até agora, foi recebida com surpresa pelo próprio governo e levou a Secretaria de Comunicação do Planalto a divulgar nota para “esclarecer” que a “possibilidade de distribuição de senhas” visa a “aprimorar um processo de atendimento humanitário em Roraima, o que não pode ser confundido com fechamento à entrada de venezuelanos”.
À noite, ao ser questionado, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou que é possível formar duas filas para diferenciar quem entra no Brasil para ficar aqui e quem entra com o intuito de logo sair. “Não limita a entrada, só terão que esperar mas não limita a entrada.”
Em reunião anteontem para tratar da GLO, houve discussão sobre um maior controle da fronteira, ordenando a entrada das pessoas, cadastrando-as em diferentes blocos, por meio de entrega de senhas. A proposta de controle era um dos itens pedidos pelo presidente do MDB, senador Romero Jucá (RR), que deixou a liderança do governo no Senado por divergências
ligadas ao caso. A avaliação de interlocutores do presidente é de que a presença das Forças Armadas e o discurso, ainda que atrapalhado de Temer, pode ajudá-lo. O governo local também defende o fechamento da fronteira.
Com a GLO, os militares poderão
atuar contra crimes comuns ou perturbação da ordem pública, por causa do poder de polícia que o decreto concede. A operação será feita com os 3,2 mil homens da Brigada de Infantaria de Selva, com sede em Boa Vista, e tem previsão para durar 15 dias. O governo já trabalha
com uma possível prorrogação do prazo por causa do clima político acirrado no Estado.
Ontem, o Ministério da Defesa emitiu a diretriz para a deflagração da GLO. Um centro de operações será montado com equipes de Forças Armadas, Polícia Federal, Policia Rodoviária Federal e Força Nacional, que já tem 157 homens no Estado. O engajamento da segurança estadual só ocorrerá se houver pedido da governadora Suely Campos (PP), que resiste.
A GLO não prevê patrulhamento das ruas de Roraima, se limitando a faixas de fronteira, incluindo Boa Vista e rodovias federais. O Exército pode atuar, no entanto, em casos como o do protesto que aconteceu no fim de semana retrasado, que levou à destruição de um abrigo imigrante. No governo, há o sentimento de que qualquer atrito pode causar enfrentamento.
População. A migração venezuelana já é notada até nos dados demográficos. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou ontem o cálculo das estimativas da população nos municípios. A nova projeção incorporou os imigrantes venezuelanos no Estado de Roraima, dos quais 99% estavam concentrados nos municípios de Boa Vista e Pacaraima. Atualmente, há mais de 30 mil imigrantes venezuelanos vivendo em Roraima – e 10 mil deles chegaram ao País apenas no primeiro semestre. Até o fim do ano, serão quase 40 mil refugiados.