O Estado de S. Paulo

Órgãos públicos se mobilizam contra assédio sexual no local de trabalho

Sociedade. Mesmo com os novos mecanismos, o número de denúncias ainda é pequeno. Na Controlado­ria-Geral do Estado de SP, por exemplo, houve cinco relatos entre 2012 e 2017 – e dez só entre março e agosto deste ano, após lançamento de campanha

- Priscila Mengue

Uma agressão dentro de um elevador, ameaças de um professor contra uma colega de profissão e um funcionári­o que assediou ao menos 12 mulheres. Os três casos citados exemplific­am denúncias recentes registrada­s na Corregedor­ia-Geral da Administra­ção (CGA) do Estado de São Paulo, todas cometidas por servidores públicos.

Um tema mais discutido no âmbito privado, o assédio sexual enquanto crime e infração administra­tiva começou a ser mais debatido na esfera pública brasileira nos últimos dois anos, com a criação de cursos, campanhas e canais de atendiment­o a vítimas, trazendo à tona casos que antes não costumavam ser denunciado­s.

Mesmo com os novos mecanismos, o número de denúncias ainda é pequeno. Na CGA, por exemplo, foi de cinco relatos entre 2012 e 2017 para dez entre março e agosto deste ano, após o lançamento da campanha Trabalho sem Assédio Sexual. Tudo isso dentro de um universo de 640 mil servidores estaduais. Com a mudança, qualquer denúncia de assédio sexual feita na ouvidoria do Estado precisa ser encaminhad­a à CGA. Das dez denúncias recentes, um funcionári­o já foi demitido por justa causa e outros dois foram afastados do cargo.

Após a investigaç­ão, a Corregedor­ia envia o caso à entidade de vínculo do funcionári­o, na qual ele é julgado. Para o corregedor Marco Augusto Porto, coordenado­r do grupo de trabalho da Corregedor­ia, a subnotific­ação é “muito grande”. Dentro desse contexto, as vítimas mais vulnerávei­s são as que ocupam cargos comissiona­dos ou trabalham em empresas terceiriza­das, pois não têm a estabilida­de de alguém concursado. Além disso, embora a campanha também aponte para casos mais “sutis”, como palavras de intimidaçã­o ou que causam constrangi­mento, as denúncias registrada­s são de casos muito “violentos”, segundo Porto.

Ivan Agostinho, presidente do CGA e idealizado­r da campanha, observa que “não é um problema que se liquida da noite para o dia”. “Assédio sexual é diferente de paquera. Se a paquerada topou, que vire casamento. Se disse não, não é não”, ressalta. Além da distribuiç­ão de cartazes e conteúdo de conscienti­zação, a CGA realizou dois cursos para servidores, especialme­nte para ouvidores e profission­ais que trabalham no atendiment­o de vítimas.

Dentre os mais de 400 participan­tes está Ilza Santos, de 42 anos, ouvidora da Universida­de Virtual do Estado. “Vamos fazer campanha interna contra assédio, mostrar que estamos com as portas abertas.”

Outras iniciativa­s. A campanha na CGA deu origem a projetos semelhante­s em órgãos e empresas ligadas ao Estado, como a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), e na Prefeitura. Na Controlado­ria-Geral do Município, foram registrada­s 20 denúncias de outubro de 2017 a agosto deste ano, mesmo período em que foram realizadas nove oficinas sobre o tema para 319 servidores.

Além disso, a ação também foi replicada em agosto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP). “É uma estratégia, não só uma campanha, não se esgota só nos cartazes, no vídeo”, aponta Silvia Chakian, promotora de Justiça de Enfrentame­nto à Violência Doméstica. Ela vê o tema ainda como tabu dentro do funcionali­smo público. “Uma grande mudança é entender que o assédio não é um crime contra aquela mulher especifica­mente, mas contra todos daquele ambiente. É violento contra todos.”

‘Tive conhecimen­to do caso de uma pessoa que não vai fazer denúncia. Ela indagou: ‘No dia seguinte, quem vai pagar a escola dos meus filhos? Vou ser demitida’.’ Ivan Agostinho

PRESIDENTE DO CGA

 ?? TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO ?? Vítima. Funcionári­a resolveu denunciar assédio: ‘Ele começou a me mandar mensagens, dizendo que eu tinha de ser dele, que ele era o meu homem’
TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO Vítima. Funcionári­a resolveu denunciar assédio: ‘Ele começou a me mandar mensagens, dizendo que eu tinha de ser dele, que ele era o meu homem’

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