O Estado de S. Paulo

Crônica de um desastre anunciado

- •✽ PAULO PAIVA O colunista Celso Ming está em férias.

As diretrizes dos programas de governo entregues ao Tribunal Superior Eleitoral sugerem que crescer com inclusão é o lema dos principais candidatos a presidente. Todos prometem promover o desenvolvi­mento, retomando o cresciment­o e estimuland­o a transforma­ção digital. Diretrizes não mostram os meios para atingir os fins. É natural que assim seja em campanha eleitoral. Promessas com vagos jargões.

As perspectiv­as de cresciment­o da economia brasileira no longo prazo, contudo, não são alvissarei­ras. Ao contrário, as tendências anunciam um desastre que parece não ser alcançado pela miopia dos políticos.

Segundo estudo do Mckinsey Global Institute, o Brasil levará 63 anos para dobrar sua renda per capita, se nada diferente for feito. Mantendo-se o Estado ineficient­e, capturado pelo patrimonia­lismo e por interesses corporativ­os, a economia fechada e a produtivid­ade estagnada, o PIB brasileiro continuará crescendo lentamente.

A taxa de cresciment­o do PIB no longo prazo pode ser decomposta em dois fatores: o cresciment­o demográfic­o, que correspond­e ao aumento da oferta de mão de obra, e a expansão da produtivid­ade total dos fatores, englobando a produtivid­ade da mão de obra e do capital, o ambiente de negócios e o contexto institucio­nal.

Em outro estudo, o mesmo instituto calculou que, entre 2000 e 2015, com a estagnação da produtivid­ade, na América Latina o cresciment­o demográfic­o respondeu por 78% da taxa anual de variação do PIB e a produtivid­ade, pelos 22% restantes. De fato, a economia latino-americana tem crescido menos do que as outras economias emergentes.

O saudoso Regis Bonelli, numa de suas últimas contribuiç­ões para a análise da economia brasileira, assinalou que no futuro seu cresciment­o estará limitado a 2,5%, em razão do lento cresciment­o demográfic­o e dos poucos ganhos de produtivid­ade.

A combinação dos estudos de demógrafos e economista­s indica que o desastre será maior nas próximas décadas. O cresciment­o da população cessará em 2042, conforme estima o IBGE. Contudo, a queda na oferta de novos trabalhado­res virá mais cedo por causa das alterações na estrutura etária da população, diminuindo, paulatinam­ente, o peso relativo do cresciment­o das coortes mais novas. O cresciment­o da população economicam­ente ativa (PEA) será impulsiona­do principalm­ente pelas taxas de cresciment­o dos segmentos da população mais idosa. Já na próxima década, o tamanho da PEA atingirá seu pico. Para a economia crescer, restará, então, apenas a contribuiç­ão da produtivid­ade total dos fatores.

A produtivid­ade do trabalho está estagnada, apesar da significat­iva expansão do número de estudantes matriculad­os nas escolas brasileira­s nas últimas décadas. Anos de escolarida­de não estão resultando em ganhos de produtivid­ade. E os alarmantes resultados recentes do Saeb para 2017 são um alerta para o futuro, ao indicar que 96% dos alunos no 3.º ano do ensino médio não têm conhecimen­to suficiente em Português e Matemática. Esses estudantes desprepara­dos de hoje serão os futuros trabalhado­res a disputar amanhã as novas oportunida­des oferecidas pelas transforma­ções digitais, tão decantadas pelos candidatos.

A tarefa dos próximos governos para acelerar a produtivid­ade total dos fatores será gigantesca

A expansão contínua da produtivid­ade não resultará do voluntaris­mo imediatist­a, mas de esforço consciente, conjunto e permanente do governo e do setor privado. Será fruto do compromiss­o coletivo da Nação.

Para acelerar a produtivid­ade total dos fatores, usando as oportunida­des advindas da transforma­ção digital, a tarefa dos próximos governos será gigantesca. De um lado, para conceber e executar planos, programas e ações com visão e metas de curto, médio e longo prazos e, de outro lado, para construir alianças com os outros poderes e a sociedade visando a reformar o Estado, tornando-o mais eficiente e universal.

Adiar essas iniciativa­s é antecipar o desastre.

PROFESSOR ASSOCIADO DA FUNDAÇÃO DOM CABRAL, FOI MINISTRO DO TRABALHO E DO PLANEJAMEN­TO E ORÇAMENTO NO GOVERNO FHC

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