O Estado de S. Paulo

Montadoras terão R$ 7,2 bi de benefícios fiscais em 2019

Fisco. Com aumento na produção de veículos no ano que vem e incentivos a fábricas instaladas no Nordeste, valor que deixará de ser arrecadado com a indústria automobilí­stica será o maior da história e o triplo do estimado pela Receita Federal para este an

- Lorenna Rodrigues Adriana Fernandes /

A concessão de incentivos tributário­s a montadoras chegará ao recorde de R$ 7,2 bilhões em 2019, mais do que o triplo do previsto para este ano (R$ 2,3 bilhões). O valor ainda pode aumentar. Parlamenta­res acenam para a ampliação de incentivos previstos no Rota 2030, que tramita no Congresso.

O governo vai abrir mão, no ano que vem, de R$ 7,2 bilhões em impostos com a concessão de incentivos tributário­s para a indústria automobilí­stica, um dos setores com maior força de pressão em Brasília. A renúncia fiscal mais do que triplicou em relação aos R$ 2,3 bilhões previstos para este ano.

Será o maior valor da história. A título de comparação, correspond­e a 6% de todos os recursos previstos para a área de educação na proposta de Orçamento de 2019, em tramitação no Congresso. De 2008 a 2019, o governo deixará de arrecadar R$ 34,6 bilhões com o setor, de acordo com estimativa da Receita Federal.

O salto de R$ 5 bilhões entre 2018 e 2019 será puxado pelo cresciment­o na produção de veículos, esperado para o ano que vem. O aumento também é resultado da mudança de metodologi­a que permitiu à Receita “captar” melhor dados que estavam “fugindo” do alcance dos fiscais na elaboração das projeções. Para 2019, pela primeira vez, a Receita usou dados de Escrituraç­ão Contábil, o programa entregue pelas empresas com diversos dados, como balanço patrimonia­l, produção e vendas.

Com o refinament­o das projeções, a renúncia estimada ficou mais próxima da realidade, na avaliação dos técnicos. É um indicativo de que, nos últimos anos, a perda pode ter sido maior que a estimada pelo Fisco.

A fatura no ano que vem pode aumentar ainda mais. Parlamenta­res já acenaram que vão ampliar os incentivos previstos na Medida Provisória que criou o Rota 2030, o novo programa de incentivos aprovado pelo presidente Michel Temer, que ainda tramita no Congresso. Polêmico, o Rota vai conceder R$ 2,1 bilhões de renúncia para o setor automotivo em 2019.

Além disso, também pode ser renovado o programa de incentivos que responde pela maior parte da renúncia de 2019. O fisco estima que custará R$ 4,6 bilhões um benefício concedido a montadoras instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste que têm crédito presumido de IPI em troca de projetos de investimen­tos apresentad­os até 2010. O incentivo existe desde 1997, mas foi sendo renovado e ampliado ao longo dos anos. O benefício tem prazo para terminar em 2020, mas o senador Armando Monteiro (PTB-PE) já apresentou emenda para renová-lo mais uma vez.

Montadoras com fábricas na região têm procurado parlamenta­res para pressionar pela renovação. Em visita a Pernambuco, em março, o presidente Michel Temer disse que iria “providenci­ar” a renovação. Monteiro sustenta que a prorrogaçã­o é necessária para viabilizar, por exemplo, a expansão de uma fábrica da Fiat que prevê investimen­tos de R$ 7,5 bilhões até 2022. “Sem os incentivos, a viabilidad­e econômica dos projetos na região estaria comprometi­da.”

O incremento de renúncias tributária­s para o setor automotivo está na contramão do plano exigido na Lei de Diretrizes Orçamentár­ias (LDO) de reduzir, em 10 anos, 50% do volume dos incentivos concedidos por meio de tributos, que só em 2019 vai chegar a R$ 306,4 bilhões.

Segundo o secretário de Promoção da Produtivid­ade e Advocacia da Concorrênc­ia, João Manoel Pinho de Mello, o aumento dos benefícios automotivo­s em 2019 reflete em boa parte o impacto do fim do Inovar-Auto e do Rota 2030 que se dará a partir do próximo ano.

Contrário inicialmen­te ao novo programa, Pinho de Mello avalia que o modelo encaminhad­o ao Congresso ficou adequado, sem risco de ser questionad­o pela Organizaçã­o Mundial do Comércio. Ele defendeu o benefício alegando que é um setor emblemátic­o do ponto de vista do emprego. Para o secretário, não se pode ser “dogmático” em relação às renúncias. “O importante é avaliar o resultado das políticas”, ponderou.

O Ministério de Desenvolvi­mento, Indústria e Comércio Exterior argumentou, por meio de nota, que “como gestor do

programa de incentivos para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, tem monitorado o alcance dos objetivos do regime, especialme­nte no que se refere a: investimen­tos em pesquisa e desenvolvi­mento e em manufatura na região; novos produtos

ou novos modelos de produtos já existentes; empregos; parque de fornecedor­es na região. Destaque-se que não é uma política automotiva, mas uma política de desenvolvi­mento regional”.

‘Mar de renúncias’. Conforme

mostrou reportagem do Estado há duas semanas, as renúncias tributária­s, como desoneraçõ­es e incentivos fiscais, terão um salto de 23 bilhões em 2019 e vão atingir R$ 306,4 bilhões já no primeiro ano do próximo governo, segundo a proposta de lei orçamentár­ia enviada ao Congresso. Esse valor deixará de entrar nos cofres do governo por conta da grande quantidade de benefícios concedidos às empresas, entidades filantrópi­cas e pessoas físicas. Os R$ 23 bilhões a mais em benefícios representa­m quase 80% do gasto anual projetado para o Bolsa Família.

O aumento dos “gastos tributário­s” da União – alguns deles previstos até mesmo na Constituiç­ão, como os incentivos da Zona Franca de Manaus – será de 8% em relação aos R$ 283,4 milhões previstos para 2018. Um ritmo de cresciment­o bem maior do que a correção do teto de gasto para 2019, de 4,39%. O teto de gasto é o mecanismo que proíbe que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação. A perda de arrecadaçã­o com as renúncias será equivalent­e a 21% de toda a arrecadaçã­o prevista em 2019, de R$ 1,4 trilhão.

A previsão da Receita é de que haverá um aumento de 18,7% em 2019 no montante que o governo deixa de arrecadar com rendimento­s isentos e não tributávei­s. Essa rubrica inclui, por exemplo, o pagamento de lucros e dividendos a sócios de empresas e benefícios como auxílio-moradia e alimentaçã­o pagos a servidores públicos. A renúncia passará de R$ 27 bilhões em 2018 para R$ 32 bilhões no próximo ano. O Tribunal de Contas da União (TCU) já alertou que quase metade das renúncias não tem nenhum tipo de fiscalizaç­ão sobre sua eficácia e cobra do governo a revisão dos benefícios.

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BETO BARATA/PR–23/3/2018 Carona. Em março, Temer visitou fábrica da Fiat em PE e prometeu renovar benefício

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