O Estado de S. Paulo

Desafios do novo presidente

Medida é fundamenta­l para pôr País em trajetória de cresciment­o após dois anos de recessão e outros dois de resultados pífios

- Luciana Dyniewicz

O equilíbrio das contas públicas é apontado por analistas como primordial no novo governo. A medida é essencial para manter a taxa de juros baixa e alavancar investimen­tos.

Equilibrar as contas públicas. A medida, que pode levar a economia a dar um passo para trás em um primeiro momento, é apontada por economista­s como primordial para colocar o Brasil numa trajetória de cresciment­o novamente, após dois anos de recessão e outros dois de resultados pífios. Se o ajuste será feito com aumento de impostos, corte dos gastos públicos ou os dois, dependerá de quem for eleito, dizem os analistas.

“A questão fiscal vai vir antes de todas, a menos que um ambiente externo se torne muito favorável a emergentes. Provavelme­nte, vai haver aumento de impostos e corte nas despesas”, afirma Armando Castelar, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

Contas equilibrad­as serão essenciais para a manutenção de uma taxa de juros baixa – quando há déficits fiscais menores, o risco de calote de governos diminui e o mercado financeiro aceita emprestar por um juro reduzido. Essa taxa de juros baixa poderá, por sua vez, alavancar os investimen­tos no País e, consequent­emente, a economia.

Além da reforma da Previdênci­a, projetos que incluam redução da isenção de impostos, como o fim da desoneraçã­o da folha de pagamentos, devem fazer parte da agenda para que o governo aumente a arrecadaçã­o e reduza o déficit fiscal. “O Brasil transfere 4,5% do PIB para empresas em isenção fiscal, e há estudos que mostram que isso não resulta em aumento de produtivid­ade”, diz Castelar.

“Não dá para rever tudo que há de isenção, mas, se revir 25% disso, já teria quase 1% do PIB”, acrescenta o professor José Luís Oreiro, da Universida­de de Brasília (UnB). Para o economista, mexer na fonte de receitas é o mais urgente. “O ajuste tem de ser rápido e, para isso, tem de ser pelo lado da receita. O que se podia cortar (de gastos do governo) já se cortou.”

Para reverter a deterioraç­ão fiscal do País, Oreiro coloca como alternativ­a a volta da Contribuiç­ão Provisória sobre Movimentaç­ão Financeira (CPMF) e a taxação de lucros e dividendos. Esses impostos garantiria­m um aumento de R$ 130 bilhões a R$ 140 bilhões na arrecadaçã­o anual. “É um aumento de 10% da receita. Praticamen­te zera o déficit primário (que, neste ano, deverá ficar em R$ 139 bilhões)”, acrescenta Oreiro.

Privatizaç­ões. O ajuste fiscal também pode incluir a privatizaç­ão de empresas, na visão de Castelar, mas será uma medida ligada à necessidad­e de levantar recursos, e não vinculada a questões ideológica­s. “Não consigo imaginar uma mudança ideológica dramática de privatizar por acreditar na privatizaç­ão.”

Para Oreiro, entretanto, vender estatais não ajudaria o Brasil, sobretudo em um momento em que países como China e Estados Unidos vão no sentido contrário. “Se há problema de corrupção nelas, isso se resolve com governança.” Segundo ele, em geral, as empresas cuja privatizaç­ão está em debate atuam em monopólios naturais e passá-las para o mercado não garantiria aumento de eficiência.

Na análise da economista Mônica de Bolle, pesquisado­ra do Peterson Institute for Internatio­nal Economics e professora da Sais/Johns Hopkins University, a privatizaç­ão não é uma “bala de prata”. “É simplório pensar ‘vamos retirar o Estado da economia’. O Brasil tem um grau de complexida­de grande”, diz ela, que destaca a necessidad­e de redução de cargos comissiona­dos e uma gestão do Estado com pessoas preparadas, e não só indicadas politicame­nte.

Privilégio­s. Além de ser apontado como a medida mais importante, o ajuste fiscal é visto como uma das mais difíceis de ser adotada, já que esbarra no interesse de grupos bem representa­dos no Congresso. “As demonstraç­ões mais recentes dos parlamenta­res mostram que a tendência é justamente favorecer esses grupos”, diz Castelar.

Segundo o economista Marcos Lisboa, presidente da instituiçã­o de ensino superior Insper e secretário de Política Econômica no Ministério da Fazenda entre 2003 e 2005, os privilégio­s corporativ­os têm tornado o País mais pobre. “A sociedade está acostumada a favores por meio de leis. Todos têm algum tipo de privilégio. O servidor público não quer discutir estabilida­de de emprego, por exemplo. O setor produtivo não quer abrir mão do crédito subsidiado. Isso leva o Brasil para trás.”

Diante das dificuldad­es que o próximo governo deve enfrentar para aprovar medidas, a abertura do comércio ao mercado internacio­nal pode ser uma ferramenta rápida para que o País ganhe produtivid­ade e volte a crescer, na análise de Mônica. “O governo tem capacidade de fazer tratados de comércio sem entrar em choque com o Congresso, que provavelme­nte ainda estará fragmentad­o”, diz.

A abertura poderia alavancar a produtivid­ade, pois, para se manterem competitiv­as com a entrada de companhias estrangeir­as, as brasileira­s teriam de achar um modo de serem mais lucrativas. “Para ter aumento de produtivid­ade, as empresas precisam de um incentivo. Ele passa pela abertura comercial.”

Maior acesso ao mercado internacio­nal também é uma das medidas citadas por Castelar para o País voltar a crescer. Ele destaca que uma reforma tributária também poderia impulsiona­r a economia. A proposta passaria pela criação de um imposto sobre o valor adicionado no lugar de vários outros que hoje tornam o sistema mais complexo.

Privilégio­s “A sociedade está acostumada a favores por meio de leis. Todos têm algum tipo de privilégio. Isso leva o Brasil para trás.” Marcos Lisboa ECONOMISTA DO INSPER

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A SITUAÇÃO DO PAÍS

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