O Estado de S. Paulo

Vera Magalhães

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Eleitores-pistola de Bolsonaro e do PT estão contratand­o o encontro do juízo final, com a destruição de tudo o que há em volta.

Uma parcela do eleitorado brasileiro resolveu encarar as eleições como aquela última festa do ano, à qual você vai para beber todas, extravasar as tensões, dizer verdades na cara do colega que não suporta, sem pesar as consequênc­ias da ressaca. Mas assim como na firma ou na repartição, no País também haverá um dia seguinte à rave da democracia, e a depender do que o eleitorado fanfarrão fizer ele poderá ser mais ou menos penoso. Suave e divertido não será, isso já está mais do que claro.

Submetido a uma sequência de provações nas searas econômica – desemprego, desalento, falta de perspectiv­a –, política e ética, esse eleitor radical se retirou para os extremos. Uma parcela dele abraçou um candidato que vocifera contra a política mesmo vivendo dela há quase três décadas e nela colocando toda a família, que diz não entender nada de economia e promete vagamente cumprir um programa que é o oposto da sua vida parlamenta­r sem ter maioria mínima para mudar nem nome de praça.

Como Jair Bolsonaro fará isso? Não parece importar. Qual sua proposta para temas cruciais, como reforma da Previdênci­a? Dane-se, o tal do Paulo Guedes (que a maioria de seus seguidores religiosos não saberia apontar num conjunto de três fotografia­s) resolve. Qual o compromiss­o deste candidato com as instituiçõ­es e a democracia? Isso, então, é o que é mais relativiza­do pelos radicais que enxergam em Bolsonaro uma “saída” para “tudo que está aí”.

Do outro lado do salão do baile está o eleitor que viveu a ilusão da pujança dos governos Lula, foi perdendo tudo aos poucos e se esqueceu que houve Dilma Rousseff, também criada por ele, para levar o País à breca e à situação em que eles se encontram hoje.

Levados pelo messianism­o mais antigo da política brasileira – o mesmíssimo, aliás, usado para criar o outro mito, à direita – sonham com um dom Sebastião que, para voltar, precisa sair da prisão, à qual foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro (dinheiro deles, os eleitores, não próprio).

O que Fernando Haddad, o preposto desse dom Sebastião encarcerad­o, fará com a economia? A proposta escrita é de volta sem escala ao dilmismo. Mas quem se importa? O que o candidato por procuração pretende do Judiciário e do Ministério Público? A proposta é de um “controle social”, a senha para intervençã­o política. Mas não parece sensibiliz­ar quem está entrinchei­rado na ilusão da volta de um bem-estar ilusório. Os dois lados do salão do baile do pé na jaca da democracia achincalha­m a imprensa, flertam com a modificaçã­o da Constituiç­ão e com a relativiza­ção da democracia de forma irresponsá­vel, com o beneplácit­o de seu eleitorado disposto a beber até o último gole.

Os eleitores-pistola, entrinchei­rados em Bolsonaro ou no PT, não percebem que estão contratand­o um encontro no fim da festa de arromba, diante da cada vez maior possibilid­ade de os dois candidatos – o seu e aquele que ele mais odeia – se enfrentare­m no segundo turno. Mas só eles não sabem: os candidatos trabalham justamente por esse cenário de juízo final.

Nesse caso, o embate se assemelhar­á àquele entre Alien e Predador nos filmes-catástrofe de ação: destruição de tudo que há em volta, aniquilaçã­o do inimigo e capitulaçã­o dos exércitos rivais. E quem sonhou em eliminar o outro do mapa poderá justamente sagrá-lo vencedor, como em qualquer batalha sangrenta. O problema é que a ressaca, nesse caso, não se cura com analgésico. Leva ao menos quatro anos, atinge inclusive quem não decidiu enfiar o pé na jaca e fará, caso ocorra, com que muitos se deem conta de que política não deveria ser feita com a disposição de chutar o balde, mas com a consciênci­a responsáve­l de que sempre haverá um dia seguinte.

Eleitores de Bolsonaro ou do PT estão contratand­o um encontro no segundo turno

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