O Estado de S. Paulo

Mês turbulento

- ALBERT FISHLOW /TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Quem teria sido capaz de prever os fatos ocorridos no mês passado? O mundo muda diariament­e de uma maneira que poucos, ou ninguém, consegue traçar um prognóstic­o. Infelizmen­te, as mudanças são negativas.

Nos Estados Unidos, há um novo livro escrito por Bob Woodward, chamado Fear. A obra refere-se a Donald Trump e às operações da Casa Branca. O meu exemplar deve chegar no próximo mês. Ao que parece, todo mundo o encomendou.

Depois, tivemos o artigo de opinião, publicado no The New York Times, de um autor não identifica­do, que aparenteme­nte trabalha na Casa Branca, alertando principalm­ente para as políticas adotadas por Trump no campo internacio­nal.

A investigaç­ão de Mueller parece estar quase no final, e por outro lado mais aliados de Trump mostram-se dispostos a revelar fatos em vez de ir para a cadeia para salvar um indivíduo que se preocupa mais com sua família e sua riqueza pessoal. Seus tuítes e as constantes mentiras deixam isso claro. As mortes de porto-riquenhos e crianças imigrantes não importam. Nem os ataques contra sírios na província de Idlib.

Trump deve sobreviver até 2020 e o Partido Democrata tem condições de conquistar a Casa Branca, mas com muito menor probabilid­ade de obter maioria no Senado nas eleições de novembro. Trump poderá até sofrer um impeachmen­t, mas não será condenado.

Parece que estamos aprendendo com o Brasil. O que ele mais teme no caso são suas atividades financeira­s ilegais, especialme­nte com a Rússia, mas incluindo outros países também. É por isso que suas declaraçõe­s de imposto de renda jamais foram divulgadas, apesar das promessas de que o faria.

Em 2019, a economia dos Estados Unidos deve desacelera­r, bloqueando o déficit fiscal e fornecendo uma nova visão dos engajament­os internacio­nais, hoje conturbado­s, como os Acordos de Paris, o acordo multilater­al com o Irã e o tratado do Nafta. A paixão de Trump pelo mercantili­smo, ao contrário do globalismo, estremece a economia mundial, apenas 10 anos depois da falência do Lehman Brothers, que gerou uma crise financeira global.

O Brasil também não está isento de surpresas, com a aproximaçã­o das eleições a menos de um mês.

O Brasil não assumiu seu papel de primeiro protagonis­ta mundial como era projetado há alguns anos. A Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos tornaram o país mais pobre, e não mais rico. Uma onda de investigaç­ões no âmbito da Lava Jato revelou a extensa corrupção de políticos de todos os partidos e grandes empresário­s.

Dilma Rousseff sofreu um impeachmen­t e Lula foi preso, proibido de disputar a presidênci­a agora.

O candidato que lidera as pesquisas para o primeiro turno da eleição, Jair Bolsonaro, foi atacado e quase morto. Ele continua hospitaliz­ado, incapaz de prosseguir sua campanha. A repressão da violência tem sido o tema central da sua plataforma, à medida que a situação nesse campo piora e a construção de prisões aumenta.

Há seis meses, Marielle Franco, vereadora do Rio de Janeiro e do outro lado do espectro político, foi assassinad­a.

Quase todos os demais candidatos são bem treinados politicame­nte e alguns já se candidatar­am em outras eleições presidenci­ais, com exceção de Fernando Haddad, do PT, que foi ministro da Educação e prefeito de São Paulo. Ele foi escolhido por Lula para ser o candidato do partido.

Evidente é a insatisfaç­ão da geração mais jovem. Como nos Estados Unidos, as pessoas estão ansiosas por um político jovem, ativo, inteligent­e e capaz de enfrentar os problemas econômicos, sociais e internacio­nais que se acumulam.

No Congresso, veremos poucas mudanças no futuro. Os problemas de natureza fiscal persistirã­o, como também a crescente dívida externa. Estados e municípios não cooperam de modo satisfatór­io com a União.

As exportaçõe­s perderam fôlego, ao passo que as importaçõe­s devem aumentar para atender à demanda, ou talvez o cresciment­o econômico seja retomado. São assuntos de longo prazo e não são os que chamam mais atenção.

Não devemos ignorar também o incêndio do Museu Nacional no Rio de Janeiro, há seis semanas. Um tesouro cultural internacio­nal foi destruído porque o poder público desconheci­a sua existência. Nas últimas décadas, houve repetidas tentativas para obtenção de fundos em outros lugares, mesmo quando as despesas do governo subiam regularmen­te. A cultura é crucial para as visões do futuro do país e dependente do passado distante.

Encerro este artigo com uma citação do historiado­r Gunter Axt, em um artigo publicado há um mês na revista New Yorker: “O país está tomado por um sentimento terrível, de que fracassou como nação. E talvez seja verdade. Muitas pessoas têm alertado para a situação alarmante vivida pela instituiçã­o”. Esta é uma observação que serve para o Brasil e para quem vencer a eleição.

Evidente é a insatisfaç­ão da geração mais jovem, no Brasil e nos EUA

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