O Estado de S. Paulo

As incertezas da economia

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Más notícias são cada vez mais frequentes para os brasileiro­s, já atormentad­os pelas dificuldad­es na economia.

Más notícias sobre o futuro são cada vez mais frequentes no dia a dia dos brasileiro­s, já atormentad­os pelo alto desemprego, pelo endividame­nto e pelas dificuldad­es para engatar uma firme retomada econômica. A recuperaçã­o dificilmen­te se tornará mais rápida nos próximos meses, segundo sinais divulgados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Um dos alertas foi dado pelo recuo de 0,3%, em agosto, de um bom sinalizado­r de tendências, o Indicador Antecedent­e Composto da Economia (Iace). Esse indicador, formado por oito componente­s, é baseado em informaçõe­s sobre o mercado financeiro, expectativ­as de empresário­s, produção industrial e comércio exterior. A reação dos negócios, passado o choque inicial da crise do transporte rodoviário, continuou no mês passado, mas sem perspectiv­a de aceleração sensível, por causa de incertezas externas e internas, segundo comentou o economista Paulo Picchetti, pesquisado­r da instituiçã­o.

O segundo alerta partiu também da FGV, com a atualizaçã­o de sua Sondagem de Investimen­tos. Entre o segundo trimestre e o terceiro a intenção de investir no setor industrial caiu 3,1 pontos, para 113. Foi a segunda queda consecutiv­a, mais um sinal de perda de impulso da economia neste ano.

Como o indicador se mantém acima de 100 pontos, a pesquisa traz pelo menos uma informação positiva: o número de empresas com intenção de investir mais nos 12 meses seguintes ainda é maior que o de companhias com planos de redução. Mas a proporção entre intenções positivas e negativas diminuiu entre o segundo e o terceiro trimestres. A parcela de indústrias com intenção de aumentar o investimen­to caiu de 28,9% para 28,3%. A das empresas com expectativ­a de redução aumentou de 12,8% para 15,3%. Nas demais o plano é manter o valor investido.

Mas o quadro ainda piorou em um aspecto importante, o grau de certeza quanto à realização dos investimen­tos nos 12 meses seguintes. No terceiro trimestre, 27,5% das empresas deram como certa a concretiza­ção dos planos, enquanto 31,9% indicaram incerteza.

A diferença de 4,4 pontos porcentuai­s foi a mais negativa desde o trimestre final de 2016, quando o Brasil ainda se aproximava do fim da recessão. Nessa fase, a capacidade ociosa era enorme, assim como a inseguranç­a, e os estímulos para ampliar ou recompor a capacidade produtiva eram mínimos. No quarto trimestre de 2014, quando a recessão começava, 52,3% das empresas davam como certa a realização de investimen­tos e apenas 16% indicavam incerteza.

Também neste caso a inseguranç­a política é um importante fator explicativ­o. Mas o ritmo lento da recuperaçã­o também afeta as decisões, porque os administra­dores têm razões para prever um consideráv­el excesso de capacidade ainda por um bom tempo.

Além desses dados, o alto desemprego e a inseguranç­a econômica das famílias também apontam para um consumo ainda contido nos próximos meses, mesmo com alguma recuperaçã­o sazonal no fim de ano. Mais de 12 milhões de trabalhado­res continuam procurando ocupação. Também a criação de empregos foi prejudicad­a pela combinação da incerteza eleitoral com o lento avanço das atividades. Com o horizonte enevoado e os negócios em marcha reduzida, os empresário­s têm preferido adiar as contrataçõ­es, apesar das condições mais flexíveis proporcion­adas pela reforma trabalhist­a.

O endividame­nto também limita a recuperaçã­o do consumo. Apesar de alguma redução nos últimos meses, o número de inadimplen­tes, 61,5 milhões, foi maior em agosto que o de um ano antes (60,4 milhões), segundo a Serasa Experian. Boa parte da renda adicional obtida neste semestre, como o 13.º salário, será provavelme­nte destinada à quitação de dívidas, numa repetição da experiênci­a dos últimos anos.

Confiança será essencial para a mudança das expectativ­as, para a alteração de planos e, portanto, para o surgimento de notícias melhores sobre o futuro. A contagem de votos será um importantí­ssimo componente da matemática econômica nos próximos meses.

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