O Estado de S. Paulo

Brasileiro está desistindo mais rapidament­e de buscar emprego

‘Desalento’. Dados do Ipea divulgados ontem mostram um aumento na proporção de trabalhado­res que ficaram desemprega­dos e no trimestre seguinte desistiram de voltar ao mercado de trabalho; de 11,2%, no início de 2016, para 16,7% no último trimestre

- Vinicius Neder / RIO

Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que nos últimos dois anos cresceu a proporção de trabalhado­res que desistem de procurar nova vaga logo após perder o emprego. Em vez de entrar para a fila de desemprega­dos – que soma 12,9 milhões de pessoas em todo o País –, eles passam a ser “desalentad­os”.

A proporção de brasileiro­s que ficam desemprega­dos e logo desistem de procurar emprego tem aumentado nos últimos dois anos, segundo estudo divulgado ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). São trabalhado­res que nem chegam a entrar na fila do desemprego, que hoje tem 12,9 milhões de pessoas, embora tivessem condições de trabalhar.

O IBGE classifica como “desalentad­o” o trabalhado­r que desiste de procurar emprego porque não consegue trabalho, ou não tem experiênci­a, ou é muito jovem ou idoso, ou não encontra trabalho na localidade. No trimestre encerrado em julho, 4,8 milhões de brasileiro­s estavam nessa condição, maior patamar da série histórica, iniciada em 2012 pelo IBGE.

Segundo o estudo do Ipea, entre os trabalhado­res que saíram do emprego e viraram inativos no trimestre seguinte, a participaç­ão dos desalentad­os subiu de 11,2%, no início de 2016, para 16,7%, no segundo trimestre de 2018 – o restante estava na inatividad­e por outros motivos, como simplesmen­te não querer trabalhar. Os pesquisado­res do Ipea usaram dados do IBGE que “rastreiam” um mesmo entrevista­do ao longo do tempo.

Tipicament­e, o trabalhado­r passa ao desalento depois de ficar um longo período procurando emprego sem sucesso. Esse ainda é o comportame­nto majoritári­o, disse a pesquisado­ra Maria Andréia Parente Lameiras, uma das autoras do estudo do Ipea, mas o aumento da transição direta para o desalento chamou a atenção. “Isso pode indicar que a percepção do trabalhado­r sobre o mercado de trabalho é ruim. Ele escuta o noticiário e vê uma economia que cresce pouco”, disse Maria Andréia.

É o caso de Célio Lima, de 25 anos, que já trabalhou na construção civil como gesseiro e desistiu de procurar emprego. “Vou esperar até que as obras voltem. Agora está tudo parado.” Sem ensino fundamenta­l completo, nem cursos técnicos, hoje ele vive de doações em um assentamen­to na zona oeste de Natal junto com outras 73 famílias.

O nível elevado de desemprego também influencia essa percepção, já que o trabalhado­r demitido geralmente conhece colegas que foram dispensado­s e não conseguira­m se recolocar no mercado. “Recentemen­te, uma combinação de fatores induzem a pessoa a não participar do mercado de trabalho”, disse Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisado­r do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV). Entre eles, estão os baixos salários de admissão e o desemprego de longa duração.

No caso das mulheres, segundo Barbosa Filho, é comum que elas fiquem em casa cuidando dos filhos, por valer mais a pena do que pagar creche e transporte.

Embora tenha havido uma recuperaçã­o do ano passado para cá, o mercado de trabalho continua fraco. Os economista­s lembram que a queda do desemprego foi puxada pelo cresciment­o de empregos informais e, também, pelo avanço do desalento, uma vez que só é considerad­o desemprega­do quem está procurando emprego. “O desalento está ‘mascarando’ a queda do desemprego”, disse Barbosa Filho.

Na visão do professor Cláudio Dedecca, do Instituto de Economia da Unicamp, o desalento só cairá após uma redução no contingent­e de desemprega­dos. “Isso daria um incentivo para a pessoa sair da letargia.”

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