Toffoli chama ditadura de 1964 de ‘movimento’
Em evento, presidente do STF diz que em 1964 não aconteceu ‘nem golpe nem revolução’ e que resultado das urnas tem de ser respeitado
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, afirmou ontem que prefere definir a tomada de poder pelos militares em 1964 como um “movimento”. “Não foi um golpe nem uma revolução. Me refiro a movimento de 1964.”
As declarações foram dadas durante debate sobre os 30 anos da Constituição Federal realizado na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), onde o ministro se formou, em 1990.
Ele ressaltou que o governo militar teve amplo apoio popular para chegar ao poder, mas virou alvo de crítica de todos os espectros da sociedade. “Foi apropriado tanto para a esquerda quanto para a direita criticar a ditadura. A crítica gerou um desgaste da legitimidade do governo.”
Eleições. Em uma crítica aos partidos, Dias Toffoli disse que, a pouco menos de uma semana das eleições, não viu “nenhum programa ou projeto nacional” e que as siglas estão “órfãs de posicionamento político”.
Ele citou estudo de 1996 que conclui que o sistema partidário era, à época, subdesenvolvido, fragmentado e pouco ideológico. “Não há dúvida de que a conclusão continua válida, tímida até, em relação ao que sucedeu desde então. Aumentou o número de partidos, aumentou a fragmentação e há uma ausência de ideologias claras.”
O ministro também afirmou que os resultados das eleições devem ser respeitados, independentemente dos eleitos. “A função do STF é deixar a soberania popular falar”, disse. A declaração de Dias Toffoli foi dada dias depois de o candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, ter dito que não vai aceitar um resultado diferente da sua vitória. Depois, o presidenciável afirmou que, em caso de derrota, “não terá nada para fazer”.
“Interlocutor a gente não escolhe, a gente aceita. O olhar do Judiciário é que devemos respeitar a pluralidade e o estado democrático de direito. É a soberania da população”, reforçou.
O ministro ainda relembrou as eleições de 2014, quando o então candidato ao Planalto pelo PSDB, senador Aécio Neves, derrotado pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT), contestou o resultado e pediu auditoria das urnas eletrônicas. “Ele se desculpou, falando que devia explicações ao partido e aos eleitores sobre a derrota em Minas Gerais.”
Toffoli também defendeu a Constituição de 1988, tema do evento. “Foi um pacto que deu estabilidade institucional e política ao Brasil e deu voz àqueles que por décadas, ou até séculos, foram excluídos da participação dos direitos reais de igualdade, não somente perante a lei, mas na própria lei”, disse.
Atuação do STF. Também presente no evento da USP, Gilmar Mendes, ministro do STF, defendeu a atuação da Corte para evitar que o País se transformasse em uma ditadura.
“Se o Supremo Tribunal Federal não tivesse atuado, mitigado, nós teríamos nos transformado em um tipo de ditadura. Veríamos prisões temporárias se transformando em definitivas, por exemplo. Há uma espécie de superego em toda a sociedade.”
Questionado sobre as acusações de ativismo político por parte do STF, Gilmar defendeu que o autoritarismo e o totalitarismo estão presentes nas instituições. “Nós vemos políticos brigando no Supremo para dizer que não estão sob a relatoria do (ministro Edson) Fachin, porque isso significa estar na Lava Jato.” Para Gilmar, o andamento dos inquéritos da Lava Jato quase causaram um “colapso de todo o estamento político, afetado justa e injustamente pelas operações policiais”.
Constituição. Ainda no evento, Gilmar Mendes rebateu as propostas de governo de alguns candidatos à Presidência que defendem a formação de uma Assembleia Constituinte. “A nossa Constituição é complexa, nos prepara inúmeras armadilhas na sua aplicação. Mas nos trouxe até aqui, com 30 anos de normalidade. Oxalá que, em vez de falarmos de constituintes, nós possamos discutir seus próximos 30 anos.”