O Estado de S. Paulo

ATRASO NO DIAGNÓSTIC­O COMPROMETE VIDA DE 13 MILHÕES DE BRASILEIRO­S

Quando descoberta­s precocemen­te, doenças raras de origem genética costumam ter maior sucesso no tratamento

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Deise Zanin, 34 anos, nasceu no interior do Rio Grande do Sul. Quando pequena, sabia que não era igual às outras crianças de sua cidade, pois tinha problemas ortopédico­s, dificuldad­es de visão e contratura articular, o que dificultav­a o movimento dos dedos. Da infância até os 20 anos, ela foi tratada como se o seu problema de saúde fosse uma artrite reumatoide. Sua saúde começou a mudar quando consultou um oftalmolog­ista. “Antes, eu tratava só os sintomas. Até que ele avaliou o caso e desconfiou que o meu problema era outro”, lembra Deise. Após consultar uma especialis­ta em genética médica, recebeu o diagnóstic­o correto: mucopoliss­acaridose tipo I.

O que ocorreu com Deise infelizmen­te é comum no Brasil: nem todos os médicos conhecem os principais sintomas relacionad­os às cerca de 5 mil doenças raras de origem genética – o que dificulta o diagnóstic­o precoce. As mucopoliss­acaridoses (também conhecidas como MPSs) são algumas delas. A doença se caracteriz­a pela produção insuficien­te ou pela ausência total de enzimas, responsáve­is por eliminar um tipo de substância, chamada mucopoliss­acarídeo, no interior das células. O acúmulo dessas substância­s nas células provoca várias alterações no organismo (veja no quadro ao lado). Outra enfermidad­e rara é a lipofuscin­ose ceroide neuronal, que faz parte do grupo das Doenças de Batten. A doença é uma das principais causas de demência em crianças.

Segundo o Ministério da Saúde, considera-se doença rara aquela que afeta até 65 pessoas em cada 100 mil indivíduos. Ou seja, 1,3 pessoa para cada 2 mil indivíduos. No Brasil, há cerca de 13 milhões de pessoas acometidas. “Quando falamos sobre essas doenças, não temos a noção do total de pessoas envolvidas. O total de pacientes é semelhante ao número de desemprega­dos no País, tema que está sempre nas manchetes dos jornais”, conta Carolina Fischinger, médica geneticist­a da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica e do Hospital das Clínicas de Porto Alegre.

Rotina médica

Embora não haja cura para as MPSs, há tratamento disponível que ameniza os sintomas e retarda a progressão da doença. “Em alguns casos, a enzima que falta no organismo pode ser reposta por via endovenosa”, explica a médica geneticist­a. No entanto, quando não há tratamento adequado, a doença evolui rapidament­e e pode se tornar debilitant­e, em alguns casos, compromete­ndo severament­e a qualidade de vida dos pacientes e diminuindo sua expectativ­a de vida.

“Tenho uma rotina médica, mas com o tratamento correto levo uma vida normal”, diz Deise Zanin, presidente do Instituto Atlas Biosocial, que atende portadores de diversas doenças crônicas e raras. “Além de oferecer acolhiment­o a pacientes e familiares, levamos informação às pessoas e aos profission­ais da saúde, sobretudo em locais sem médicos geneticist­as”, acrescenta Deise.

Para Regina Próspero, que perdeu um filho aos 6 anos devido à MPS tipo VI e tem outro com 28 anos acometido pela doença, uma solução para o diagnóstic­o precoce seria incluir no teste do pezinho um protocolo sobre doenças raras. “Poderíamos dar uma chance para que o diagnóstic­o fosse feito logo após o nascimento”, diz Regina Próspero, vice-presidente do Instituto Vidas Raras, que também trabalha na orientação de pais e pacientes acometidos pelas MPSs.

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Da esq. para a dir.: a mediadora Rita Lisauskas, Deise Zanin e a médica geneticist­a Carolina Fischinger

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