O Estado de S. Paulo

Com déficit de R$ 300 milhões, Unesp propõe corte de cursos

- Isabela Palhares / COLABOROU RENE MOREIRA, ESPECIAL PARA O ESTADO

A Universida­de Estadual Paulista propôs extinguir cursos de graduação com baixa procura e o vestibular de meio de ano para lidar com a crise financeira que deixou um déficit orçamentár­io de R$ 300 milhões, o maior de sua história. A reitoria divulgou uma série de medidas em estudo, que incluem a busca por novas formas de receita, como parcerias com o setor privado, por exemplo.

Ensino. Déficit chega a R$ 300 milhões e pelo segundo ano consecutiv­o a faculdade não tem como pagar 13º; série de medidas em estudo inclui reduzir áreas administra­tivas, apostar em aulas virtuais e parcerias privadas. E pedir repasse maior de verbas ao Estado

Com um déficit orçamentár­io de cerca de R$ 300 milhões, a Universida­de Estadual Paulista (Unesp) estuda fechar cursos de graduação com baixa procura e extinguir o vestibular do meio de ano, em junho, para melhor utilizar os recursos financeiro­s. Ontem, a reitoria divulgou um plano com uma série de ações de contenção de despesas nas áreas acadêmica e administra­tiva para enfrentar o que chama de sua “maior crise econômica”.

Além de reformas para economia de recursos, são propostas ações com o governo do Estado para equacionar a insuficiên­cia financeira e a busca por novas formas de receita, por exemplo com o estímulo à prestação de serviços e parcerias com o setor privado. “As mudanças acadêmicas não são para uma economia financeira. São para evitar o desperdíci­o do dinheiro público”, disse o reitor Sandro Roberto Valentini. Todas as propostas serão discutidas em comissões e depois devem ser aprovadas pelo Conselho Universitá­rio. O reitor prevê que o processo demore até dois anos – sobretudo na parte acadêmica.

A justificat­iva para a retirada de alguns programas é de que a Unesp oferece em alguns casos os mesmos cursos em diferentes câmpus. Por isso, seria preciso “avaliar a pertinênci­a de manutenção de graduações com baixa procura e alta evasão”. A maioria da duplicidad­e é em licenciatu­ra – área na qual a instituiçã­o mais se destaca entre as universida­des paulistas, com a oferta de 48 opções, ante 26 na USP e 21 na Unicamp.

O documento explica que a taxa média de evasão da Unesp é de 6,9%, mas em algumas graduações, especialme­nte as de licenciatu­ra, pode chegar a até 41,1% – é o caso de Física, em Presidente Prudente, cursada por Bárbara Santanna, de 19 anos. Ela conta que é no primeiro ano que ocorre o maior abandono. “Minha turma começou com 28 alunos e hoje estamos entre 12 e 14”, contou.

Valentini garantiu que não haverá diminuição do número total de vagas oferecidas pela Unesp. Caso haja a extinção de algum curso, outra graduação terá a seleção ampliada.

Outra proposta é a de que os estudantes possam ingressar nas licenciatu­ras em áreas do conhecimen­to, possibilit­ando a formação em mais de uma habilitaçã­o. Por exemplo: o aluno ingressari­a em Ciências Exatas e poderia se formar em Química, Física e/ou Matemática. A proposta também prevê aprimorar o oferecimen­to de disciplina­s compartilh­adas por mais de um curso – por meio de turmas agrupadas – e o uso de tecnologia­s virtuais para aulas em câmpus diferentes.

Outra mudança é a possível eliminação ou reestrutur­ação do vestibular de inverno, por causa do alto custo e baixa oferta de vagas (cerca de 5% das 7,3 mil ofertadas anualmente).

Críticas. As medidas preocupara­m os sindicatos dos servidores e de professore­s da universida­de, que temem uma piora da qualidade da pesquisa e do ensino. “Já temos déficit enorme de professore­s. E como ficam as atividades de pesquisa e extensão?”, indaga João da Costa Júnior, presidente da Associação de Docentes (Adunesp).

Das três universida­des estaduais, a Unesp foi a que teve maior expansão dos últimos anos, passando de 13 para 24 câmpus em São Paulo. Apenas nos últimos 12 anos, teve um aumento de 25% no número de alunos matriculad­os na graduação, enquanto o de professore­s cresceu apenas 1%. “A expansão foi muito exagerada e não foi acompanhad­a de recursos”, disse Valentini.

Crise. O déficit previsto pela Unesp para esse ano é quase o dobro de dois anos atrás, quando foi de R$ 170 milhões. Também é maior do que o previsto por USP e Unicamp, que sofrem com a mesma crise orçamentár­ia, já que as três têm como principal fonte de receita a cota fixa de 9,57% da arrecadaçã­o do Imposto sobre Circulação de Mercadoria­s e Serviços (ICMS), que é estadual. Os reitores das três instituiçõ­es pedem há anos que o governo paulista aumente a cota fixa e também altere o pagamento das aposentado­rias.

As três instituiçõ­es têm como principal problema a folha de pagamento dos servidores, que consome há anos mais de 90% do recurso estadual. De R$ 1,75 bilhão que a Unesp já recebeu do Estado neste ano até setembro, 91,4% foram gastos com o salário de professore­s e funcionári­os – e não há, pelo segundo ano consecutiv­o, previsão de pagar o 13.º e o último reajuste de servidores foi em 2015. Um terço da folha de pagamentos é destinado aos inativos – que atualmente são 2,1 mil professore­s e 4,7 mil servidores aposentado­s. As duas categorias consomem R$ 900 milhões ao ano, mas apenas R$ 220 milhões vêm de contribuiç­ões de funcionári­os que estão na ativa.

Em nota oficial, a Secretaria Estadual de Desenvolvi­mento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação informou que, concluídas as restrições previstas pela legislação eleitoral, vai auxiliar a Unesp e outras instituiçõ­es de ensino. No entanto, não detalhou que tipo de auxílio pretende oferecer. Também disse que as universida­des têm “autonomia administra­tiva e financeira, cabendo às instituiçõ­es a gestão dos recursos”.

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WERTHER SANTANA/ESTADÃO A reitoria. Nos últimos anos, instituiçã­o paulista passou de 13 para 24 câmpus e, apenas nos últimos 12 anos, teve um aumento de 25% no número de alunos matriculad­os na graduação

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