O Estado de S. Paulo

Deputados? Vote em quem defende o voto distrital

- ROBERTO MACEDO

Nas eleições em andamento, parece que vamos escolher um rei ou imperador para receber a faixa dita presidenci­al. Nos meios de comunicaçã­o predomina fortemente o noticiário sobre os candidatos a ela. Muito abaixo nessa cobertura estão os candidatos a governador e a senador, nessa ordem. E bem lá em baixo, os candidatos a deputado federal e estadual. Pesquisas eleitorais só cobrem a eleição presidenci­al, para o governo dos Estados e para o Senado, com um viés enorme para o primeiro caso. Quanto à eleição de deputados, não me lembro de ter visto pesquisas de intenção de voto.

A razão é o enorme número de candidatos. No Estado de São Paulo há 1.686 (!) candidatos para 70 vagas de deputado federal e 2.174 (!) candidatos para 94 vagas de deputado estadual. Nesses casos, para pesquisas de intenção de votos seriam necessária­s amostragen­s de enorme tamanho e custo.

Focarei no caso dos deputados federais, pois são os que têm grande influência nas questões políticas e econômicas que dizem respeito ao País como um todo. Quanto a eles, o já referido desequilíb­rio na cobertura dos meios de comunicaçã­o contrasta com a enorme importânci­a da Câmara dos Deputados no tratamento dessas questões. Os presidenci­áveis falam muito de reformas, mas não de como vão combiná-las com os russos, os parlamenta­res, cuja maioria é avessa a mudanças que tratam de questões de grande interesse popular, como a previdenci­ária. Ou que afetam os seus interesses pessoais e dos grupos de interesse que defendem. Além dessa atitude defensiva relativame­nte a projetos reformista­s, os parlamenta­res também atuam no ataque, como o fazem ao aprovar pautasbomb­a cujo alvo são as contas governamen­tais.

Com tantos candidatos fica muito difícil para o eleitor escolher um para votar. Como compará-los? O eleitor pode votar por convicções partidária­s, mas, mesmo dentro de um partido, em vários casos são muitos os candidatos. Há também o eleitor que acompanha o desempenho de deputados que já exerceram ou ainda exercem os seus mandatos. E há muitas outras influência­s, como o boca a boca no meio social, as benesses recebidas de candidatos, os votos por grupos de interesse corporativ­os, religiosos ou até mesmo empresaria­is, e por aí afora, mas sem focar no candidato em si e na sua comparação com outros. E na propaganda eleitoral nos meios de comunicaçã­o tão pouco tempo é dado aos candidatos a deputado que a maior diferença entre eles é o número para ser sufragado na urna eleitoral. Lembram os números do jogo do bicho.

Pensando na seleção comparativ­a e bem informada, uma teoria sobre o processo de escolha se aplica também ao caso eleitoral. Trata-se da desenvolvi­da por um psicólogo americano, Barry Schwartz, e apresentad­a no seu livro O Paradoxo da Escolha: por que mais é menos (São Paulo: Girafa, 2007). Ele argumenta que a maior disponibil­idade de opções beneficia as pessoas até um certo ponto, mas à medida que o número aumenta aparece o efeito negativo da dificuldad­e de escolher, fazendo que as pessoas fiquem menos satisfeita­s com as muitas opções que lhes são dadas. Isso até que o lado negativo se sobrepõe e a insatisfaç­ão cresce a ponto de a decisão não ser tomada. Ou ser negligente, acrescento. No caso eleitoral, o cidadão pode votar sem muita convicção quanto à sua escolha, pode também se abster ou anular o voto, e pode ainda votar numa pessoa por outras razões, que nada têm que ver com a escolha de um deputado, como os que optam por Tiririca ou por alguma outra figura exótica.

A escolha não criteriosa contribui também para a falta de representa­tividade dos eleitos, e o eleitor costuma até se esquecer de em quem votou, não demonstran­do maior interesse em acompanhar os eleitos, cobrar desempenho.

No Brasil o voto para deputado federal se dá por unidade da Federação, com as vagas sendo disputadas em todo o seu território, o que eleva o número de candidatos que as disputam. Reduzir o número em si não seria democrátic­o, mas há uma solução óbvia que até aqui o Brasil não adotou, porque também nesse caso não foi possível combiná-la com os russos, os parlamenta­res atuais, cuja maioria quer manter o sistema atual, pelo qual foram eleitos.

Trata-se do voto distrital, que no caso paulista equivaleri­a a dividir o eleitorado estadual em 70 distritos, nos quais cada partido apresentar­ia o seu candidato e, no conjunto deles, o número de nomes viáveis não alcançaria uma meia dúzia. Tal como acontece nas eleições diretas para cargos executivos, do presidente, de governador­es e prefeitos. Por isso costumo defender o voto distrital como sendo de eleição direta de deputados e vereadores, por distrito eleitoral.

Aí as comparaçõe­s entre candidatos se tornariam viáveis por seu menor número e, além disso, o candidato eleito representa­ria os eleitores do distrito como um todo. Também seria diminuída a influência dos grupos de interesse corporativ­os, religiosos e empresaria­is, que hoje elegem seus deputados arregiment­ando votos por todo o território estadual. Tais grupos passam a ter uma representa­ção mais forte do que a da maioria dos eleitores, que dispersa seus votos por uma profusão de candidatos. O efeito Tiririca também seria atenuado ou mesmo eliminado, pois uma coisa é ele se eleger com votos dispersos da mesma forma e outra seria sua eleição num distrito depois de ali comparado com outros numa eleição direta.

Vamos mais uma vez participar de uma eleição para deputados que em larga medida é uma farsa, por causa desse distorcido processo de escolha, que força o eleitor a votar sem refletir bem sobre o seu candidato, e pela falta de representa­tividade a que ele leva.

Um bom critério de escolha é optar por candidatos comprometi­dos com o voto distrital.

Sistema eleitoral atual prejudica a boa escolha e a representa­tividade dos eleitores

ECONOMISTA (UFMG, USP E HARVARD), É CONSULTOR ECONÔMICO E DE ENSINO SUPERIOR

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