O Estado de S. Paulo

Imigrantes usam caravana para fugir de contraband­istas.

Refugiados da América Central que rumam para os EUA preferem viajar em grupo para evitar extorsões e ataques do crime organizado

- Kevin Sieff THE NEW YORK TIMES CIDADE DO MÉXICO / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO

Para muitos dos imigrantes que viajam para os EUA, através do México, a decisão de se juntar à caravana não foi só uma reação à violência ou à pobreza na América Central. Marchar em grupo foi a alternativ­a encontrada para caminhar por uma das rotas de contraband­o humano mais caras e mais perigosas do mundo.

Todos os anos, quando dezenas de milhares de pessoas da América Central vão para os EUA, viajam através de uma rede de contraband­istas ou coiotes, cujos preços aumentaram na última década, à medida que grupos criminosos se envolviam

cada vez mais no comércio e a segurança das fronteiras era reforçada. Segundo relatório do ano passado do Departamen­to de Segurança Interna dos EUA, uma viagem que custava US$ 2 mil, em 2008, saltou para US$ 9,2 mil, em 2017.

Então veio a caravana: uma viagem para a fronteira oferecida gratuitame­nte, prometendo segurança em números e atenção do público. “O custo de oportunida­de para os migrantes é o dinheiro e o que pode acontecer com o seu corpo”, disse Andrew Selee, presidente do grupo de estudos Migration Policy Institute, de Washington.

“Eu nunca teria como pagar um contraband­ista, mas assim posso conseguir chegar sem ter de pedir uma quantia enorme emprestada”, disse Esme Castañeda, de 30 anos, de Ocotepeque, Honduras, que viaja com o marido, Francisco, e com a filha de 5 anos, Elizabeth.

Em toda a região, muitas famílias poupam durante anos para pagar um contraband­ista ou fazem empréstimo­s, às vezes perdendo suas casas no processo. Esses pagamentos prometem, em teoria, uma série de abrigos seguros no México e três oportunida­des para cruzar a fronteira dos EUA.

“São pessoas dispostas a sair a qualquer momento quando houver a possibilid­ade de viajar com segurança”, disse Guadalupe Correa-Cabrera, especialis­ta em imigração e contraband­o humano da George Mason University. “Mas eles sabem que, se você realmente quiser cruzar, precisa pagar um contraband­ista.”

As caravanas atravessar­am o México por vários anos, mas normalment­e em números muito menores – e atraindo muito menos atenção – do que o grupo atual. Os organizado­res disseram que a viagem foi planejada em parte como um ato de protesto. Muitos imigrantes, porém, encaram isso como outra coisa: a maneira mais segura e menos dispendios­a de migrar para o norte.

Chegar à fronteira dos EUA sozinho nem sempre foi tão perigoso. Em 2008, quando o então presidente do México, Felipe Calderón, tentou derrotar os narcotrafi­cantes usando os militares, os cartéis se fragmentar­am e, no nordeste do México, grupos armados se envolveram no contraband­o humano. Isso e o endurecime­nto da vigilância causaram um aumento nos custos e riscos da travessia.

Essas mudanças reduziram o número de pessoas que poderiam atravessar a fronteira de forma segura. Antes da década de 90, muitos migrantes cruzavam a fronteira sem pagar contraband­istas, trabalhand­o sazonalmen­te nos EUA. Mesmo depois de pagar contraband­istas, os imigrantes são extorquido­s e agredidos. Em 2010, 72 viajantes foram mortos por pistoleiro­s em San Fernando, no norte do México. No ano passado, dez imigrantes que viajavam nos fundos de um trailer morreram em um estacionam­ento de San Antonio, quando a temperatur­a aumentou e eles ficaram presos.

Alguns dos migrantes na caravana tinham viajado anteriorme­nte com um contraband­ista, mas depois de serem deportados, decidiram que não valia a pena o gasto. Evin Mata viajou com um coiote alguns anos atrás. Mas, depois de ser deportado, ele se perguntou se um contraband­ista valeria o pagamento antecipado.

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RODRIGO ABD/AP México. Membros da caravana pegam carona em caminhão

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