Gafes de chefes em público
Como os políticos, os principais executivos também vivem com medo de dizer a coisa errada
Omundo dos negócios envolve um grau considerável de incerteza, mas o maior problema para muitos dos altos executivos ocorre quando eles abrem a boca. Elon Musk, o chefe da Tesla, precisou pedir desculpas depois de chamar os analistas de Wall Street de “tapados” em uma teleconferência, em maio. Em julho, Mark Zuckerberg, do Facebook, foi forçado a esclarecer uma observação, feita em um podcast, que alguns ouvintes interpretaram como um sinal de simpatia pelas pessoas que negam o Holocausto. Em 12 de setembro, Jamie Dimon, do JP Morgan Chase, pediu desculpas depois de se comparar com o presidente Donald Trump. “Acho que poderia derrotar Trump (...). Sou tão durão quanto ele, mas sou mais inteligente. Ele poderia me socar o quanto quisesse”, vangloriou-se Dimon. Em seu pedido de desculpas, ele disse que o episódio “prova que eu não seria um bom político”.
Agir como um político, com a obrigação de se manter na linha o tempo todo, é algo cada vez mais exigido de quem assume o cargo de principal executivo de um grande negócio. Há 20 anos, os chefes tinham de ser protegidos em eventos públicos, como a reunião anual, mas, podiam expor suas ideias de maneira razoavelmente livre. A franqueza grosseira era uma vista como virtude. Agora eles precisam adotar estratégia de candidato à presidência, ficando sob contínuo olhar inquisidores e vivendo a constante possibilidade de uma gafe que gere uma crise.
Essa mudança surgiu por vários motivos. Uma é uma regra chamada “Reg fd”, aprovada pelos reguladores financeiros no ano 2000, que exige que as empresas divulguem informações para todos ao mesmo tempo. Embora sensata, a regra tem um custo. Executivos têm advogados paranoicos ao redor deles constantemente. Isso levou a um sistema de vigilância com conferências e apresentações de estratégias gravadas para mostrar que os segredos não estão vazando.
Gafes em série. Baixar a guarda pode ser perigoso. Lloyd Blankfein, chefe do Goldman Sachs, brincou em 2009 que seu banco estava “fazendo o trabalho de Deus”, causando uma crise para a reputação da empresa, embora ele tenha conseguido permanecer no cargo.
Em 2017, Travis Kalanick, então presidente do Uber, foi filmado todo animado ao som de música em um dos carros Uber, para em seguida discutir com o motorista (“Algumas pessoas não gostam de assumir responsabilidade pela própria merda”, disse Kalanick ao parceiro, que trabalhava sem vínculo empregatício). O incidente foi um dos vários episódios negativos que resultaram na saída do executivo, naquele mesmo ano.
Em 2010, Tony Hayward, o principal executivo da BP (British Petroleum), disse: “Quero minha vida de volta”, após o vazamento de petróleo da plataforma Deepwater Horizon. A observação improvisada ajudou a levar à sua demissão.
Diante dos perigos, alguns adotam uma política de transparência radical. John Cryan, que dirigiu o Deutsche Bank entre 2015 e abril de 2018, evitava os roteiros e gostava de fazer associações livres sobre quão terrível era o tomador de empréstimos alemão. No começo, foi novidade; depois se tornou deprimente. A tática oposta é evitar aparecer em público. Howard Hughes, aviador e magnata, foi um pioneiro. Depois de um interrogatório no Congresso, em 1947, tornou-se recluso, deixando as unhas crescerem e urinando em jarros.
O que fazer? Alguns chefes têm a autodisciplina de ferro para jamais escorregar em público – Tim Cook, da Apple, é um exemplo. Mas nem todo indivíduo é tão contido quanto Cook nem toda empresa tão bem-sucedida quanto a Apple. A alternativa é escolher uma das três estratégias. A primeira é projetar um personagem, como fazem as celebridades. Sheryl Sandberg, diretora de operações do Facebook, publicou dois livros que oferecem mistura de biografia íntima, autoajuda e negócios. Isso a isolou de parte do impacto dos escândalos do Facebook nos últimos dois anos.
A segunda abordagem é a de se associar a uma missão ética, cuja importância transcende as sutilezas diplomáticas. Indra Nooyi, ex-chefe da Pepsi, que recentemente saiu do cargo, critica constantemente o que chamava de mentalidade de curto prazo dos investidores. Como resultado, ela poderia ser incrivelmente crítica a eles sem causar reações negativas.
A abordagem final é incorporar gafes como parte de sua personalidade pública como um sinal de autenticidade. Jamie Dimon tem uma atuação brilhante aqui. Em 2015, ele se referiu a multas legais como “pisar em merda de cachorro”. Em 2017, ele lamentou as “besteiras” que estavam acontecendo no sistema político e também chamou o blockchain de “fraude”.
Mas a abordagem é mais calculada do que parece. Sua franqueza sugere que ele vai convocar qualquer operador cibernético tramando para explodir o sistema financeiro. No entanto, Dimon nunca escorrega quando fala sobre os ganhos do JP Morgan Chase. Ele é o que todo executivo secretamente gostaria de ser: um falador num mar de conformidade tímida. ✽
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