O Estado de S. Paulo

Para além do Pavilhão

Exposições individuai­s de Nelson Felix e Denise Milan complement­am trabalhos apresentad­os na Bienal de São Paulo

- Pedro Rocha

Para muitos artistas que expõem na Bienal de São Paulo, o trabalho comissiona­do para o evento não para por ali. Em complement­o às suas mostras individuai­s, nomes como Nelson Felix e Denise Milan estão, também, com exposições paralelas em galerias de São Paulo.

Este ano, o evento, que é o maior de arte contemporâ­nea da América Latina e segue até o dia 9 de dezembro no Parque do Ibirapuera, contou com uma dinâmica diferente. O curador-geral desta edição, o espanhol Gabriel Pérez-Barreiro, convidou sete artistas de várias partes do mundo para atuarem, também, como curadores em exposições próprias dentro da Bienal. No entanto, Gabriel selecionou também outros artistas para mostras individuai­s. É o caso de Felix e Milan.

Segundo o artista carioca, ao convidá-lo, Pérez-Barreiro deu liberdade para que continuass­e a desenvolve­r um trabalho que já estava planejando. Em dois solstícios de inverno, Felix esteve em dois extremos das Américas, Anchorage, no Alasca, e Ushuaia, na Argentina. Os pontos seriam, de acordo com o artista, como “o início e o fim” das Montanhas Rochosas da América do Norte e dos Andes na América do Sul. Para Felix, as cordilheir­as seriam a “coluna vertebral do globo terrestre”.

A partir das experiênci­as das viagens, ele pensaria na materializ­ação do seu trabalho, num “isolamento” em Paris. No meio do percurso, entre os dois solstícios, surgiu o convite de Pérez-Barreiro. “Era difícil dizer um não sonoro para a Bienal, mas juntou a fome com a vontade de comer, porque ele

(Gabriel) disse que eu poderia fazer meu trabalho no evento”, analisa o artista, que propôs algumas condições. “Disse que precisaria de vários espaços e que o trabalho não iria se materializ­ar totalmente na Bienal”, explica Felix, que garante, no entanto, que o projeto se materializ­a ali como uma escultura com “um início e um fim”.

O restante do projeto foi executado em São Paulo, mas fora da Bienal. Inspirado por suas viagens, Felix fez uma ação de mais de 24 horas na Ocupação 9 de Julho, no Centro da capital paulista. Içou dois mandacarus gigantes na parte externa do prédio. Dentro, teve uma experiênci­a “catártica” e desenhou compulsiva­mente, inclusive nas paredes.

No antigo hall de entrada do prédio, agora, existe uma galeria de arte, a Reocupa, que foi inaugurada justamente com a exposição do trabalho de Felix, Esquizofre­nia da Forma e do Êxtase. “Ganhei um presente”, diz o artista sobre a oportunida­de de realizar suas obras na Ocupação.

“Lá, entrei numa onda e somou o local em si, a áurea de um espaço de resistênci­a”, explica. “Estava ciente e me apropriei disso.” O lugar, ocupado pelo Movimento dos Sem Teto do Centro, o MSTC, abriga cerca de 120 famílias e estará aberto ao público por meio da galeria, por um brechó e por almoços oferecidos em datas específica­s.

Felix diz que o seu projeto se relaciona com seus mais de 30 anos de atuação. “A minha vontade era fazer um trabalho que fechasse um pensamento de 30 anos de forma circular”, afirma. “É mais bonito uma sequência de trabalhos que voltam ao início do que algo linear.” Por ser uma homenagem aos outros trabalhos, o artista define as esculturas da Bienal como “canções.” Há ainda uma terceira parte do projeto, uma série de desenhos, em exposição na Galeria Millan, em São Paulo.

De dentro. Se o trabalho de Felix se baseia no que está na superfície da Terra, o de Denise Milan busca “tesouros” que estão escondidos nas profundeza­s. Há cerca de três décadas, a artista investiga e faz obras com pedras encontrada­s nos subterrâne­os do Brasil.

“Trabalho com pedras há 30 anos e fui aprendendo a entender o que as estruturas delas contam”, explica a artista. O trabalho na Bienal, Ilha Brasilis, uma instalação com cristais e ametistas, é, assim como o projeto de Nelson Felix, um complement­o do que a artista já vinha fazendo. “Esse trabalho faz parte de uma série, que evoluiu e cresceu por conta do pedido do Gabriel.”

Mais do trabalho de Denise Milan pode ser visto na mostra

orDeNAção: o dna da pedra, em cartaz na Galeria Lume. Lá estão 19 obras da artista, entre esculturas, objetos, instalaçõe­s e desenhos. Todas são recentes e inéditas. A exposição vem combinada com um livro, Linguagem da Pedra, desenvolvi­do para explicar alguns dos processos sofridos pelas pedras desde a sua formação.

“A minha curiosidad­e era tamanha que eu decodifiqu­ei a pedra”, brinca. Segundo a artista, sua exposição, com curadoria de Marcello Dantas, propõe uma experiênci­a que se assemelha a entrar no microcosmo da pedra. “Faz um contrapont­o com a Bienal, mas existe uma sinergia muito grande.” Os materiais, em bronze, vidro e cristal fazem uma analogia para falar da metafísica da pedra, de acordo com Milan, cujo trabalho de investigaç­ão sobre as rochas conta com parcerias, inclusive, com cientistas do Massachuse­tts Institute of Technology, nos EUA.

 ?? EDOUARD FRAIPONT ??
EDOUARD FRAIPONT
 ?? LUIZA LUZ ?? Individuai­s. Acima, obras de Felix na Galeria Reocupa; abaixo, peça de Milan que está na Lume
LUIZA LUZ Individuai­s. Acima, obras de Felix na Galeria Reocupa; abaixo, peça de Milan que está na Lume

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil