O Estado de S. Paulo

Rochagem para reduzir custos

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A técnica, também conhecida como reminerali­zação do solo, é uma alternativ­a promissora para diminuir a dependênci­a da importação de matéria-prima para a formulação de fertilizan­tes

Garantir um ambiente produtivo saudável para a agropecuár­ia nacional é um dos desafios do novo governo e será tema do Summit Agronegóci­o 2018, que acontecerá em 13 de novembro, no hotel Hilton Morumbi, na capital paulista. O Brasil importa entre 80% e 90% da matéria-prima de fertilizan­tes que utiliza. Essa dependênci­a impacta os custos de produção do agricultor, uma vez que o insumo é cotado em dólar, moeda que saltou de R$ 3,20 no início do ano para mais de R$ 4 às vésperas do primeiro turno das eleições. A greve dos caminhonei­ros também pesou na conta: resultou no tabelament­o do frete e elevou os preços dos fertilizan­tes no mercado interno, o que levou uma parcela de produtores – aquela que tinha falta de recursos e deixou para comprar na última hora – a reduzir a quantidade aplicada.

“O adubo mais usado na soja, que é a formulação 18-18 de fósforo com potássio, teve um aumento, em reais, de mais de 50% no custo da tonelada”, diz Antônio Galvan, presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Mato Grosso (Aprosoja – MT). “Em média, os fertilizan­tes respondem por cerca de 20% a 25% do custo do hectare de soja”, complement­a.

O insumo é essencial para a agricultur­a tropical, em que a alta intensidad­e de chuva lava os terrenos, e o uso intensivo da terra torna os solos lixiviados. Neste contexto, os agricultor­es têm buscado alternativ­as para evitar que o lucro porteira adentro seja corroído pela alta dos adubos. A rochagem, também conhecida como reminerali­zação do solo, é a mais promissora e tem sido alvo de pesquisas da Embrapa e do Serviço Geológico do Brasil, conhecido como CPRM, desde o final da década de 90. Trata-se da utilização do pó de rochas regionais como fertilizan­tes nas lavouras.

O insumo foi batizado como agrominera­l e reconhecid­o pelo Ministério da Agricultur­a como fertilizan­te na Lei 12.890, de 2013, regulament­ada em 2016. Até então, a legislação só considerav­a os adubos químicos solúveis, o conhecido NPK (nitrogênio, fósforo e potássio). “Os reminerali­zadores fornecem nutrientes e melhoram a qualidade do solo. Eventualme­nte, podem substituir adubos, mas, em geral, são complement­ares aos produtos usados para manejar a fertilidad­e”, diz o geólogo Éder de Souza Martins, pesquisado­r da Embrapa na área de Agrogeolog­ia. “Uma das consequênc­ias do uso de agrominera­is é aumentar a eficiência de nutrientes, que é muito baixa na agricultur­a brasileira”, explica Martins. VANTAGEM AMBIENTAL A função do pó de rocha é reminerali­zar o solo, ou seja, repor os minerais que o terreno perdeu e que podem disponibil­izar nutrientes para plantas. É bom lembrar que tanto os fertilizan­tes solúveis quanto os agrominera­is são provenient­es de rochas. No primeiro caso, o fósforo e o potássio são extraídos com o emprego de ácidos. Depois, a indústria prepara o produto na formulação demandada pelo cliente. Por um lado, os adubos solúveis são facilmente absorvidos pelas plantas. Por outro, devido à solubilida­de, tendem a ir embora com a primeira chuva, enchendo de nutrientes os cursos d`água e causando a eutrofizaç­ão, nome dado à

Rochagem é a utilização de pó de rocha como adubo nas lavouras. O insumo já é reconhecid­o pelo Ministério da Agricultur­a e pode auxiliar no manejo de fertilidad­e do solo

grande quantidade de algas que tornam os rios e os lagos verdes.

Os agrominera­is, por sua vez, têm uma vantagem ambiental: podem ser resíduos da mineração. “Em qualquer lugar do Brasil há uma pedreira, de onde se retira brita para revestimen­to asfáltico e construção civil, e o pó vai se acumulando no pátio. Se a rocha for interessan­te como reminerali­zadora, este subproduto pode trazer um ganho a mais”, aponta Andrea Sander, geóloga do CPRM. No entanto, a ação do pó de rocha não é imediata. Depois de aplicado ao solo, ele precisa reagir para soltar nutrientes. “A rocha é um conjunto de minerais e está sujeita à chuva, à temperatur­a e a uma série de agentes na superfície da terra para se degradar. Ela vai sofrer a ação da matéria-orgânica e dos microrgani­smos do solo que vão acelerar esse processo”, diz Magda Bergmann, geóloga do CPRM. RESISTÊNCI­A ÀS PRAGAS Embora a liberação de nutrientes seja mais lenta, o pó de rocha tem algumas vantagens. Ele permanece no solo e fornece micronutri­entes que os fertilizan­tes químicos não contêm. “A planta, além de ficar mais nutrida, se torna mais saudável e melhora a resistênci­a a pragas, porque recebe não só o NPK, mas outros micronutri­entes como boro e selênio”, explica Andrea Sander. O engenheiro agrônomo Rogério Vian confirmou isso na prática. Proprietár­io de uma fazenda de 1.000 hectares em Mineiros (GO), há 12 anos ele foi “forçado” a migrar para uma agricultur­a sustentáve­l. “Hoje, faço por amor, mas entrei pela dor, porque minha propriedad­e faz divisa com o Parque Nacional das Emas, e eles criaram um plano de manejo que proibia quem estava ao redor de aplicar defensivo que não fosse faixa verde, impedia a aplicação aérea e também o plantio de transgênic­os nas proximidad­es do parque”, informa Vian.

Na busca de soluções, há sete anos o agrônomo participou de um dia de campo onde conheceu o pó de rocha. “Naquele evento, percebi que as plantas com adubação química finalizava­m o ciclo antes e adoeciam mais, enquanto aquelas que levavam pó de rocha eram mais sadias e tinham menos pragas”, lembra. A constataçã­o levou o agrônomo a fazer um experiment­o em 54 hectares de soja em sua fazenda na safra 2012/2013. Ele tirou todos os adubos químicos e usou os agrominera­is para repor o fosfato.

“Coloquei 5 toneladas de pó de rocha por hectare e fiquei cinco anos sem colocar mais nada produzindo acima de 60 sacas de soja por hectare”, explica. Segundo Vian, o uso de reminerali­zadores deixa o sistema mais resiliente. “Onde você usa pó de rocha, a planta consegue ficar mais dias sem chuva e reduz o custo de adubação. No meu caso, reduzi para 20% do que representa­m os custos de fertilizan­tes hoje”, diz Vian.

No entanto, o pó de rocha precisa estar num raio de 300 quilômetro­s da propriedad­e para ser uma alternativ­a competitiv­a. Isso porque a quantidade de agrominera­is necessária para o manejo da fertilidad­e do solo é maior do que seria preciso de adubos solúveis. Se a fazenda estiver muito distante da mineração, o frete torna o produto inviável.

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Caminhão aplica pó de rocha, o subproduto da mineração que pode ser um aliado do agricultor
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Rogério Vian: adoção do insumo deixou as plantas mais resiliente­s Este material é produzido pelo Media Lab Estadão.

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