O Estado de S. Paulo

Um enigma no final de ‘House of Cards’

Série que iniciou o fenômeno Netflix chega à sua derradeira temporada

- Mariane Morisawa ESPECIAL PARA O ESTADO LOS ANGELES

Foi como uma premonição quando Claire Underwood (Robin Wright), transforma­da de surpresa em presidente por manobras de seu marido Francis (Kevin Spacey), virou para a câmera dizendo “minha vez” no final do quinto ano de House of Cards, a série que iniciou o fenômeno Netflix e que chega à sua sexta e derradeira temporada nesta sexta-feira (2). Porque não só os oito episódios finais mostram Claire navegando o tanque de tubarões de Washington por sua conta, mas agora ela está realmente sozinha. Frank, que tinha abdicado do governo para exercer seu poder na iniciativa privada, morreu. Tudo, claro, porque o ator principal, Kevin Spacey, foi demitido de House of Cards depois de uma investigaç­ão sobre assédio sexual que interrompe­u a produção da última temporada. “Já seria uma jornada separada dele, porque Frank basicament­e a enganou para ser a presidente sem ser eleita”, disse Wright em entrevista ao Estado em Los Angeles. “Os dois iam ser rivais. Claire jamais aceitaria fazer o que ele quisesse. Ia fazer à sua maneira. Então não mudou a trajetória. E você sente a presença de Francis, ela não desaparece­u.”

Os “showrunner­s” Melissa Gibson e Frank Pugliese acharam que deixar a sombra de Francis perseguind­o Claire era a melhor maneira de contornar a ausência do de Spacey na tela, ao contrário de muitas outras séries que simplesmen­te ignoram o personagem quando seu ator saiu ou foi saído. “Seria desonesto”, disse Pugliese. “Como a temporada anterior terminou com ela dizendo ‘Minha vez’, era inaceitáve­l não explorar a vez dela.” Para Melissa, Claire já tinha se dado conta que seu relacionam­ento com Francis jamais seria igualitári­o. “E quando as circunstân­cias mudaram, foi uma oportunida­de para ela se confrontar consigo mesma e suas escolhas para chegar onde chegou, e vê-la lutar para seguir adiante. Mas ainda há pessoas à sua volta tentando controlá-la e controlar sua narrativa. E ela resiste a isso.”

Por mais poder que Claire sempre tenha tido, ela enfrenta dificuldad­es nos seus primeiros meses de governo. “Vamos ver como ela vai lidar com essas adversidad­es, com quem vai estabelece­r parcerias, em quem ela pode confiar”, disse Wright. Entre elas, ser constantem­ente ligada ao falecido e ser menospreza­da

por ser mulher. “Nós sabemos que, se gritarmos ou causarmos discussões no trabalho, somos divas ou vacas”, afirmou Wright. “Se os homens fazem isso, eles só estavam num dia ruim.”

Duas dessas pessoas que vão causar problemas a Claire são novos personagen­s, Annette Shepherd (Diane Lane) e seu irmão Bill Shepherd (Greg Kinnear), empresário­s poderosos que usam dinheiro e influência para controlar o governo – como os irmãos Koch, ou Betsy DeVos e Erik Prince ou Robert Mercer e sua filha Rebekah, na vida real. “Queríamos mostrar o poder por trás do poder”, disse Melissa Gibson. “Sabemos desde o Citizens United (organizaçã­o que conseguiu derrubar uma lei federal americana proibindo empresas e sindicatos de ter gastos em eleições federais) que o dinheiro exerce uma influência enorme no nosso sistema político e queríamos examinar isso.”

Como Annette e Claire são amigas dos tempos de universida­de, o público vai descobrir um pouco mais do passado da nova presidente, inclusive de sua infância, em flashbacks. “Claire sempre foi misteriosa. Parecia uma oportunida­de de ver quem ela é em vários estágios de sua vida e também voltar a vê-la como uma criatura sem amarras. Ela quer retornar a isso”, disse Gibson. Frank Pugliese acrescenta: “Para ser autônoma, poderosa e estar em completo controle de sua vida, ela precisa fazer uma investigaç­ão de si mesma”. Robin Wright também tem a chance de se dirigir à câmera, e, portanto, ao público. “Ela fala com o espectador de maneira diferente que Francis”, disse a atriz. “É uma relação íntima, honesta, direta, transparen­te. Porque Francis sempre estava fazendo campanha para o público, mesmo quando estava falando a verdade.”

Robin Wright concordou que Claire sempre fica bem, mas descreveu o final de House of Cards como “lindamente macabro” e “shakespear­iano”. Um fim apropriado para uma série com personagen­s sempre comparados aos de Macbeth

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(DAVID GIESBRECHT/NETFLIX Final shakesperi­ano. Robin Wrigh como a personagem Claire Underwood, em cena do último episódio

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