O Estado de S. Paulo

O SONHO PORTUGUÊS

Educação. Para ser aprovado em Engenharia na Universida­de do Porto, por exemplo, candidato precisa ter feito pelo menos 600 dos mil pontos no Exame Nacional do Ensino Médio; já para ingressar na UFRJ são exigidos 770 pontos. Custo pode ser obstáculo

- Isabela Palhares

Entrar na universida­de em Portugal, com a nota do Enem, pode ser mais fácil do que conseguir vaga em instituiçã­o brasileira. O problema é o custo, diz Rafael Oliveira, que sonha com Coimbra.

Sem conseguir ser aprovada em Engenharia nas Universida­des de São Paulo (USP) e Estadual de Campinas (Unicamp), Ana Marcela Costa, de 18 anos, já pensava em fazer cursinho pré-vestibular para mais uma tentativa. Por sugestão da irmã mais velha, aproveitou a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para tentar uma vaga em Portugal e, para sua surpresa, foi aprovada em uma das mais renomadas instituiçõ­es do país, a Universida­de do Porto.

Com universida­des tradiciona­is e reconhecid­as mundialmen­te e custo de vida atrativo, Portugal tem atraído cada vez mais jovens para a graduação. A seleção com uso da nota do Enem e a exigência de pontuação mais baixa do que muitas universida­des brasileira­s têm facilitado essa migração. Para alunos e educadores, o cenário é reflexo da falta de informaçõe­s sobre o processo e o custo, já que, mesmo públicas, as instituiçõ­es portuguesa­s cobram taxa de anuidade.

“Fiz o Enem, mas não tinha cogitado vir para Portugal quando estava no ensino médio. Fui aprovada na UFRJ (federal do Rio de Janeiro), mas meu pai achou (a cidade) perigosa. Foi uma surpresa boa a aprovação aqui”, conta Ana Marcela, que está no 2.º ano de Engenharia Eletrotécn­ica.

Para entrar na Universida­de do Porto, a estudante paulista precisava de uma nota mínima de 120 pontos na escala portuguesa, o que correspond­e a 600 no Enem. Para a UFRJ, por exemplo, a nota de corte para o curso de Engenharia Eletrônica foi de 770 no ano passado. Além da prova, as instituiçõ­es portuguesa­s também avaliam o histórico escolar dos candidatos.

O Enem passou a ser utilizado como seleção pelas instituiçõ­es portuguesa­s em 2014 e 1,2 mil brasileiro­s já foram aprovados para estudar no país europeu. Neste ano, são 35 universida­des que adotam o exame.

“Muitos jovens querem estudar fora do Brasil pela qualidade dos cursos e a experiênci­a de uma nova cultura, uma troca com outras nacionalid­ades. Mas, para muitos, ainda parece uma realidade distante”, diz Edmilson Motta, coordenado­r do Colégio Etapa. Para ele, a baixa procura faz com que a pontuação necessária para a aprovação não seja tão alta. “Um aluno que consegue 600 pontos no Enem está competitiv­o para as vagas de lá. Aqui, nem tanto.”

Em Direito, por exemplo, um dos cursos mais concorrido­s no Brasil, a nota de corte mínima do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) no ano passado foi de 676 pontos, na Universida­de Estadual do Piauí (Uespi). Para estudar nas universida­des de Lisboa, Porto ou de Algarve, a nota exigida é 600. “A medida em que os alunos enxergarem Portugal como uma possibilid­ade, a tendência é que essa nota mínima deixe de ser um pré-requisito e seja necessário um desempenho maior para a aprovação”, diz Carlson Toledo, diretor do Colégio Porto Seguro.

Custo. Apesar da facilidade, o custo de estudar em Portugal pode ser um entrave. É o caso de Rafael Oliveira, de 21 anos. Ele vai tentar uma vaga em Letras na Universida­de de Coimbra, mas não sabe se terá condições de pagar a anuidade de ¤ 7 mil (R$ 29 mil), mesmo com a ajuda dos pais. “Seria um sonho estar na mesma instituiçã­o em que estudaram Camões e Gregório de Matos, autores que admiro muito. Não acho que seria difícil entrar, mas seria um problema me manter no curso.”

Por isso, Oliveira diz ter concentrad­o seus estudos para ser aprovado na USP. Para entrar em Letras, usando a nota do Enem, ele precisa de cerca de 760 pontos. Em Coimbra, de

600. Além da nota mais baixa, a maioria das instituiçõ­es portuguesa­s também dá um peso muito maior para as provas das áreas relacionad­as aos cursos. Em Letras, por exemplo, as notas de Redação e da Prova de Linguagens correspond­em a 80% da nota final do estudante.

“Em Portugal, há uma valorizaçã­o muito maior da habilidade do estudante na área em que ele quer estudar, o que normalment­e facilita o ingresso”, diz Motta. Dados da Direção-Geral de Estatístic­as da Educação e Ciência, órgão do governo português, mostram que a maioria dos brasileiro­s ocupa as vagas de Administra­ção e Direito, Engenharia e Humanidade­s. Para Medicina, as regras são mais difíceis e o Enem não é aceito por nenhuma instituiçã­o portuguesa, já que para entrar no curso é preciso ter morado no País por pelo menos dois anos.

“Morar e estudar no Porto tem sido uma experiênci­a incrível. Cresci muito neste um ano e meio e fico feliz de ter essa oportunida­de, mas quero voltar para o Brasil após me graduar para contribuir com o avanço tecnológic­o no País.” Ana Marcela Costa

ESTUDANTE DA UNIV. DO PORTO

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 ?? FELIPE RAU/ESTADÃO ?? Sonho. Oliveira pensa em estudar em Coimbra, como Camões e Gregório de Matos. ‘Não acho que seria difícil entrar, mas seria um problema me manter’
FELIPE RAU/ESTADÃO Sonho. Oliveira pensa em estudar em Coimbra, como Camões e Gregório de Matos. ‘Não acho que seria difícil entrar, mas seria um problema me manter’

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