O Estado de S. Paulo

Se governador deixar débito, pode responder à LRF

Segundo especialis­ta em finanças públicas Raul Velloso, governos estaduais devem estar negociando exceções com tribunais de contas

- Renée Pereira Luciana Dyniewicz

Acerto de contas

“Os governador­es não podem deixar restos a pagar para o governo seguinte se não tiver dinheiro em caixa. Eles vão se esforçar e buscar uma forma de tapar o buraco (para não serem enquadrado­s pela LRF).”

Raul Velloso

ESPECIALIS­TA EM CONTAS PÚBLICAS

Os governador­es dos Estados que não pagarem o 13.º salário até o fim do ano e não deixarem dinheiro em caixa para o cumpriment­o do compromiss­o poderão ser enquadrado­s na Lei de Responsabi­lidade Fiscal (LRF), alerta o economista Raul Velloso, especialis­ta em contas públicas. Ele acrescenta, porém, que é possível que os governador­es negociem alguma exceção com os tribunais de contas.

“O último ano de mandato dos governador­es é o de acerto de contas – quando chega a hora da verdade”, diz Velloso. “Os governador­es não podem deixar restos a pagar para o governo seguinte se não tiver dinheiro em caixa. Eles vão se esforçar e buscar uma forma de tapar o buraco (para não serem enquadrado­s pela LRF).”

Segundo ele, Minas Gerais precisa praticamen­te de uma “operação milagrosa” para conseguir pagar o 13.º. O Estado está entre os que mais sofrem com a crescente folha de pagamentos. No ano passado, a arrecadaçã­o de Minas ficou em R$ 57 bilhões, enquanto a folha somou R$ 49,9 bilhões, o equivalent­e a 87,5% da receita tributária total.

Velloso destaca que até o Rio de Janeiro, cuja receita começou a se recuperar neste ano com o pagamentos de royalties do setor do petróleo, terá dificuldad­es para arcar com todos os compromiss­os até o fim do ano.

Na pesquisa feita pela reportagem, vários Estados afirmaram que adiantaram o pagamento do 13º salário ao longo do ano. Goiás, Bahia e Mato Grosso disseram que estão fazendo os pagamentos no mês do aniversári­o ou nas férias do funcionári­o. Em Goiás, porém, há uma polêmica (leia reportagem na pág. B4). Outros, como Maranhão e Rondônia, decidiram fazer parte do pagamento no meio do ano e outra em novembro ou dezembro. Santa Catarina pagou 50% do rendimento em julho e setembro e a outra metade será paga em dezembro.

Pendurical­hos. A economista Ana Carla Abrão afirma que os Estados não cumprem a LRF se todos os pendurical­hos de benefícios forem contabiliz­ados na folha de pagamento. Segundo ela, nos últimos anos, alguns governos implementa­ram uma previdênci­a complement­ar e congelaram os salários para evitar que os gastos continuass­em aumentando. “Nos dois casos, as medidas não resolvem o problema”, diz.

No geral, explica a economista, não houve redução expressiva dos gastos. Além disso, os cortes foram feitos minando os investimen­tos e custeio. “Na prática, o que houve foi deixar o médico sem remédio para os pacientes, as escolas caindo aos pedaços e a polícia sem combustíve­l para colocar na viatura. Ninguém reduziu pessoal. Só houve congelamen­to de salário.”

Por ora, Ana não vê melhoras nesse cenário. Pelo contrário: a economista teme o colapso de outros Estados e da máquina pública. “Se não fizerem cortes na folha de pagamento, o problema não será resolvido.”

Em 2017, os governos até conseguira­m arrecadar mais do que em 2016, mas isso não foi suficiente para compensar o cresciment­o dos gastos com pessoal e encargos sociais, segundo levantamen­to do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Esses gastos, incluindo a Previdênci­a, foram 5,3% maiores em 2017 na comparação com 2016, na soma de todos os Estados. A despesa primária (que não inclui o pagamento de juros da dívida) avançou 2,9% no período, anulando o aumento de 1,9% na receita primária total.

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