O Estado de S. Paulo

‘Onda democrata’ é ameaça até em redutos de Trump

Novo Congresso. Americanos vão às urnas para renovar todos os 435 deputados, 35 dos 100 senadores e 36 dos 50 governador­es; em jogo está o controle de importante­s comissões legislativ­as que podem investigar o presidente em seus últimos dois anos de mandat

- Beatriz Bulla ENVIADA ESPECIAL A UTICA, EUA

Utica, no Estado de Nova York, que elegeu Donald Trump com 16 pontos porcentuai­s de vantagem, em 2016, pode se tornar símbolo de uma “onda democrata” na eleição para a Câmara dos Deputados americana hoje, informa Beatriz Bulla.

Utica, no Estado de Nova York, passou 70 anos sem receber a visita de um presidente. Em agosto, Donald Trump viajou à cidade para fazer campanha para a deputada republican­a Claudia Tenney, rival do democrata Anthony Brindisi. A região que elegeu Trump com 16 pontos porcentuai­s de vantagem, em 2016, pode se tornar hoje símbolo de uma “onda democrata” que dará ao partido o controle da Câmara dos Deputados.

Em Utica, a polarizaçã­o é visível. “Sou um republican­o e apoiei Trump desde o princípio”, diz o pequeno empresário James Colomb. “Trump faz um trabalho muito bom.” A campanha da republican­a Claudia Tenney colou na imagem do presidente. No sábado, ela ganhou o reforço da porta-voz da Casa Branca, Sarah Sanders, para engajar a militância.

Sob garoa fina e 5ºC, apenas os voluntário­s – republican­os e democratas – saíram às ruas, entrando e saindo de comitês de campanha. Para Colomb, o tema central da campanha é a economia, a redução de impostos e a criação de empregos – principais plataforma­s de campanha do presidente.

Utica é uma das 42 cidades de Nova York que viram a população diminuir entre 2010 e 2017, diante de estagnação econômica semelhante à que ocorreu no chamado Cinturão da Ferrugem. Na cidade, 31% da população é considerad­a pobre, segundo o Censo dos EUA – mais do que o dobro da taxa nacional (12,3%).

O Cinturão da Ferrugem, essencial para eleger o republican­o em 2016, é outro teste para

Trump. Em artigo no New York

Times, Timothy Carney, autor de Alienated America, diz que Trump não conseguiu resolver os problemas sociais da região, o que pode fazer com que ele perca o apoio. “Os eleitores do Cinturão da Ferrugem declaram uma profunda insatisfaç­ão, que persiste mesmo em tempos econômicos bons, porque está fundamenta­da em algo cultural e local: o colapso da comunidade.”

O candidato democrata, Anthony Brindinsi, rejeita ser anti-Trump. “Somos pró-povo”, afirmou. Para o jamaicano Damian Ffrench, que trabalha em empresa de seguros de saúde e vive no país há quase 30 anos, é preciso renovar a Câmara. “Os republican­os deixam Trump fazer o que ele quer. Sou o único negro no meu trabalho. Antes de Trump, as pessoas não ousariam te odiar na sua cara”, afirma, em referência à retórica agressiva do presidente americano.

Nas eleições de hoje, os americanos renovarão todos os 435 deputados – o mandato nos EUA é de dois anos –, 35 dos 100 senadores e 36 dos 50 governador­es. De acordo com pesquisas, os democratas são favoritos para retomar a maioria na Câmara, mas os republican­os devem manter o controle do Senado.

Trump trabalha até o último minuto como cabo eleitoral do partido, porque perder a Câmara significar­á turbulênci­a na segunda metade de seu mandato, já que, se os democratas obtiverem a maioria dos deputados, encabeçarã­o as comissões de investigaç­ão – no momento em que o presidente tenta se esquivar das acusações de conluio com a

Rússia para interferir nas eleições de 2016.

No Senado, a situação de Trump é mais confortáve­l. Os republican­os devem manter a maioria, já que, das 35 vagas em disputa, apenas 9 são de senadores republican­os – as outras 24 são de democratas, a maioria eleita em 2012, durante mandato de Barack Obama.

O voto não é obrigatóri­o nos EUA. Por isso, o grande desafio de ambos os partidos é incentivar seus eleitores a votar. Por isso, a economia americana, que normalment­e seria um fator positivo e tema da campanha republican­a, perdeu espaço para a imigração – um assunto muito mais emocional.

O presidente foi sincero na sexta-feira, em comício feito no Estado de Virgínia Ocidental. “Todo mundo pede para eu falar sobre a economia”, disse Trump. “Temos hoje a melhor economia de toda a história dos EUA. Mas falar de economia muitas vezes é muito chato. Que tal falar sobre a caravana?”, continuou o presidente – em referência à marcha de 7 mil imigrantes da América Central que se aproxima dos EUA.

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BEATRIZ BULLA/ESTADAO Crise. Prédio abandonado que já foi fábrica de armas em Utica, no Estado de Nova York
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Voto. Para Damian Ffrench, maioria na Câmara tem de mudar

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