Nos povoados de Quinchao
Três dias inteiros em Chiloé é o tempo mínimo para conseguir ter uma ideia do que oferecem sua natureza, cultura e história. Para ter uma pitada de cada um desses pontos de interesse, Franco me recomendou três passeios: um de meio dia por Castro, a capital do arquipélago (leia ao lado), e outros dois de dia inteiro, um de barco (leia na página 6) e outro pela estrada, passando pelas comunas de Dalcahue, ainda na Ilha Grande, de Achao, na Ilha de Quinchao, e de Curaco de Vélez.
Pois às 9h30 da quinta-feira, lá estava eu dentro da van, pronta para seguir viagem ao lado de Javier e do motorista Andrés. Dalcahue A comuna de Dalcahue – cujo significado é “lugar de canoa”, segundo Javier – está às margens de um braço de mar e é muito procurada por seu Mercado de
Artesanías (artesanatos). Aberto todos diariamente, o espaço reúne peças de madeira, souvenirs e trajes de lã de ovelha tingidos nas mais diversas cores, como belas blusas e o típico sapatinho que também é uma meia (alguns tem até couro na sola). Os valores começam em torno de 3 mil pesos chilenos (R$ 16).
Bem ao lado do mercado fica a Cocineria Dalcahue, um galpão de madeira onde há diversos “postos”, como eles dizem, de comida típica chilota. Tratam-se de pequenos espaços com cozinha simples um balcão para sentar e comer, um ao lado do outro. Javier me levou ao Puesto 8, Doña Lula, e pediu seis empanadas de carne, queijo e mariscos – duas de cada, para não ter briga (15 mil pesos chilenos; R$ 80).
Enquanto elas eram montadas e fritas, aproveitei para andar pelo local (aberto das 9h às 18h), observando mulheres e homens lavando mariscos, preparando massa, cozinhando batatas. Javier acertou em cheio e eu adorei a empanada de marisco, mas fiquei com vontade de voltar para experimentar as caçarolas, os assados, os pescados ....
Dalcahue também tem suas casas de madeira – que, na região portuária, estão sobre palafitas – e sua igreja de torre única, a Nossa Senhora das Dores, também Patrimônio da Unesco. O conjunto da fachada e da torre, branco, com delicados traços em cinza, está bem preservado e abusa de contornos geométricos retos e curvilíneos. Achao Para ir da Ilha Grande de Chiloé até Achao é preciso pegar uma balsa até Quinchao, outra grande ilha do arquipélago ( 5 mil pesos chilenos ida e volta; R$ 27). Não é preciso estar acompanhado de guias para fazer o trajeto, mas confirme antes se há viagens de ida e volta no mesmo dia caso queira ir por conta própria.
No caminho até o centrinho de Achao, capital de Quinchao, paramos num mirante que dá a dimensão do tamanho da ilha. Encontramos ali uma senhora vendendo frutas, que desandou a nos contar sobre o conflito que ela travara com a municipalidade. Segundo ela, aquele lugar onde estávamos, com vista privilegiada, pertencia à sua família, mas o governo teria desapropriado a área para fazer a estrada de asfalto e um ponto turístico, propondo um acordo que, segundo ela, nunca foi assinado.
Nos despedimos com dúvidas – a história seria verdadeira? – e seguimos rumo ao centro para conhecer a mais antiga das 16 igrejas chilotas que são Patrimônio da Humanidade: a Santa Maria de Achao, de 1740. Seu estilo pode ser definido como um tipo de barroco, mas sem qualquer ostentação em ouro.
Diferente das outras que havia visto até então, ela não é pintada – todos os lados e a torre têm um mesmo tom uniforme, o escurecido da madeira tejuelas de alerce, espécie encontrada na Cordilheira dos Andes. Por dentro, há mais cores: o teto é azul anil, os dois púlpitos são discretos, mas pintados, e o altar também é repleto de detalhes geométricos. Ao lado, há um pequeno museu com textos explicativos em espanhol e objetos que contam um pouco sobre a história das missões jesuíticas em Chiloé; sobre sua arquitetura particular; e sobre seus costumes nas artes, na religião e no ambiente doméstico.
Antes de ir embora, passamos Curaco de Vélez Apesar de haver igrejas em Curaco de Vélez – Curaco significa, na língua mapuche, algo como retirar “água das pedras”, e Vélez é o acréscimo espanhol –, nosso roteiro dedicou-se a observar pássaros e experimentar ostras.
Seu terreno pantanoso, assim como o da área do hotel, atrai centenas de aves locais e migratórias (procure pelo zarapito de bico reto) todos os anos. Ali, elas param para descansar e se alimentar, cantarolando alto e fino horas e horas. Uma passarela, obra recente, permite atravessar a área para observá-las – leve um binóculo na viagem, aliás.
Paramos para comer no Ostras Los Troncos, na orla braço de mar. O espaço é bem simpático, repleto de plantas e mesas coletivas, e onde seus moradores vendem ostras do tipo japonesa e, no verão, ceviche. Há sempre alguém por lá no horário comercial, basta chamar – uma ostra sai 500 pesos chilenos (R$ 2,70).