O Estado de S. Paulo

Itamaraty ficará com diplomata de carreira

Para Bolsonaro, é ‘prematura’ retaliação do Egito a mudança de embaixada em Israel

- BRASÍLIA / FELIPE FRAZÃO, TÂNIA MONTEIRO, LU AIKO OTTA e CONSTANÇA RESENDE

O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), afirmou ontem que pretende escolher um diplomata de carreira como ministro das Relações Exteriores. “Será um diplomata. Poderia nomear um militar, mas quero quadro de carreira”, disse.

Sem assessoram­ento claro na área internacio­nal, Bolsonaro acenou à diplomacia do Itamaraty em meio a uma crise com países do mundo árabe provocada pelo anúncio de que pretende transferir a Embaixada do Brasil de Tel-Aviv para Jerusalém.

A troca é um sinal de que o Brasil reconhece a cidade santa, foco do conflito com a Palestina, como capital de Israel. O Estado da Palestina também reivindica a cidade como capital.

Bolsonaro disse ontem que a mudança seria feita em respeito a uma decisão do povo israelense. “O que eu estou falando é o seguinte: para nós não é um ponto de honra essa decisão. Agora, quem decide onde é a capital de Israel é o povo, é o Estado de Israel. Se eles mudaram de local...”, disse.

Ele classifico­u como prematura a suspensão, por parte do Egito, da visita do atual chanceler, Aloysio Nunes Ferreira, com empresário­s ao país, revelada pelo Estado. “Pelo que vi, é também questão de agenda. Agora, acho que seria prematuro um país anunciar uma retaliação em função de uma coisa que não foi decidida ainda.”

A transferên­cia da embaixada é apoiada por líderes evangélico­s que fizeram campanha para Bolsonaro. “Jerusalém, desde que David a fundou, sempre foi capital do Estado de Israel. Onde Jerusalém foi capital do mundo árabe? Eu não conheço na história. Ele (Bolsonaro) acha que é um Estado soberano, que tem o direito de colocar a capital onde quiser”, disse o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, um dos líderes mais próximos de Bolsonaro.

“Não houve pressão dos evangélico­s, mas nós somos 100% a favor disso, ou pelo menos 99,9%, se tiver algum esquerdopa­ta gospel aí”, disse Malafaia.

O pastor não acredita que a reação dos países árabes fará Bolsonaro mudar de ideia e diz que nenhum deles deixou de negociar com os Estados Unidos depois da mudança da embaixada americana para Jerusalém. “Quando Bolsonaro mudar a embaixada para Jerusalém, o Brasil vai ser abençoado como nunca. É a minha fé.”

Israel também está na lista das primeiras viagens internacio­nais anunciadas pelo presidente eleito, ao lado dos Estados Unidos e do Chile.

Viagem aos EUA. Enquanto Bolsonaro não inicia seu tour, um dos filhos dele, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP), líder do PSL na Câmara, agendou reuniões na próxima semana com representa­ntes da cúpula do governo americano, incluindo o vice-presidente, Mike Pence.

“Já que meu pai não pode viajar, a gente vai representa­ndo ele. O objetivo desses encontros é estreitar relações com o governo americano e dizer que o Brasil está acenando de maneira favorável para ter uma aproximaçã­o com os EUA”, explicou Eduardo.

Ele estará acompanhad­o do consultor Filipe Garcia Martins, formado em Relações Internacio­nais e que já criticou abertament­e nomes cotados para assumir a chancelari­a, como Maria Nazareth de Azevedo, Sergio Amaral, Roberto Abdenur e Rubens Barbosa. “Representa­riam mais do mesmo: a continuida­de de uma política externa terceiro-mundista e sem traços distintiva­mente brasileiro­s”, escreveu Martins.

Outros cotados são os diplomatas Ernesto Fraga (defensor de Trump), Paulo Bretas e Luís Fernando Serra, atualmente embaixador na Coreia do Sul.

China. Bolsonaro e sua equipe abriram outras frentes de embate diplomátic­o: com o Mercosul, que deverá ser esvaziado; com a comunidade europeia, por causa das críticas ao Acordo de Paris; e com a China, que trava uma guerra comercial com os Estados Unidos.

“A questão da China já está mais do que explicada, eu falei que não podemos continuar fazendo negócios com o mundo todo com viés ideológico. A gente não quer nem de direita nem de esquerda, negócio é negócio e pretendemo­s fazer com o mundo todo”, amenizou ontem o presidente eleito.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil