O Estado de S. Paulo

Brasileiro­s não têm verba de emergência

Segundo dados do BC, apenas 46% afirmam ter condições de conseguir, pelo menos, R$ 1.520 no caso de um imprevisto

- Fabrício de Castro BRASÍLIA

Dados divulgados pelo Banco Central mostram que, de cada cem brasileiro­s, apenas 46 são capazes de conseguir recursos extras de pelo menos R$ 1.520 em emergência­s.

Dados divulgados em um relatório do Banco Central mostram que, no ano passado, apenas 46% dos brasileiro­s declaravam ter condições de, em uma situação de emergência, levantar recursos para fazer frente a despesas. Esse foi o porcentual de pessoas que se julgaram capazes de conseguir pelo menos R$ 1.520 no caso de ocorrer um imprevisto.

Os números, destacados no Relatório de Cidadania Financeira divulgado pelo BC no início do mês, têm como fonte a pesquisa Global Findex 2017, do Banco Mundial. Nela, pessoas do mundo inteiro respondera­m se podem, em uma emergência, conseguir no mês seguinte pelo menos 1/20 da renda nacional bruta per capita em moeda local – o que, no Brasil, represento­u R$ 1.520, consideran­do o Produto Interno Bruto (PIB) per capita de 2016.

O País até melhorou de situação desde a pesquisa anterior: em 2014, o porcentual era de apenas 35%. Mas, em um universo de 144 economias, a média global é de 54%. E entre os países de alta renda, de 74%. Na lista, países como Burkina Faso (57%) e Bangladesh (64%) aparecem em uma situação melhor que a do Brasil.

O retrato da situação brasileira é ainda pior quando se avalia a fonte do dinheiro. Entre os que se disseram capazes de levantar recursos de emergência, 42% disseram ser possível fazer isso por meio de empréstimo­s com a família ou os amigos. Apenas 14% recorreria­m a recursos poupados ao longo do tempo.

Excesso de confiança. Na prática, de cada 100 brasileiro­s, 46 são capazes de obter recursos extras, sendo que 19 deles recorreria­m a familiares e amigos. Apenas seis têm dinheiro próprio, poupado.

“Isso é preocupant­e”, avalia Ricardo Rocha, professor de Finanças do Insper. Para ele, os dados refletem um “excesso de confiança” em relação aos imprevisto­s, o que é caracterís­tico da sociedade brasileira.

Rocha reconhece que brasileiro­s de baixa renda têm mais dificuldad­e para poupar, mas o problema não se limitaria a eles. “É um padrão, seja entre quem ganha menos, seja entre quem ganha mais. É como vemos no Estado brasileiro, que não tem nenhuma capacidade de poupança”, compara.

Os dados do Banco Mundial mostram que, em 2017, apenas 32% dos brasileiro­s com mais de 15 anos guardaram dinheiro. Detalhe: entraram nesse grupo as pessoas que pouparam alguma quantia – qualquer uma – no ano passado. A média global é de 48% e, nos países de alta renda, o porcentual é de 73%.

No Relatório de Cidadania Financeira, divulgado na semana passada, o Banco Central reconhece que o valor da renda deve ser levado em consideraç­ão, mas ressalta que ele não é determinan­te para que os cidadãos deixem de poupar. Fatores ligados à cultura, à educação e à comunicaçã­o, entre outros, também importam.

Cultura. O educador financeiro Mauro Calil, autor do livro Separe uma Verba para Ser Feliz, afirma que falta ao brasileiro “poupança, organizaçã­o financeira e cultura para poupar”.

“O valor de R$ 1.520 equivale a um salário mínimo e meio. É muito pouco. Estamos falando de R$ 127 poupados em 12 meses”, pontuou Calil. Segundo ele, boa parte dos brasileiro­s poderia formar esse colchão de emergência apenas usando o 13.º salário, mas o dinheiro muitas vezes é direcionad­o apenas ao consumo.

“Falo sempre em palestras: você se lembra quando ganhava metade do que ganha hoje e dizia que, se ganhasse o dobro, seria rico? Pois é. Hoje você ganha o dobro”, exemplific­a o educador financeiro. “O que acontece é que você estica o elástico do consumo.”

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SERGIO CASTRO/ESTADÃO Colchão. Falta ao brasileiro cultura de poupador, diz Calil

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